Para especialistas, devemos correr para vacinar as crianças contra covid
Depois de largar atrás na vacinação para adultos, o Brasil repete agora a mesma demora e largará atrás na imunização de crianças contra a covid-19. Diante de um cenário novo com a variante ômicron, especialistas alertam que o início da imunização deve começar o mais rápido possível para garantir um retorno às aulas seguro.
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou hoje o pedido de uso da vacina da Pfizer em crianças de 5 a 11 anos —o imunizante também é o único autorizado até hoje para uso em adolescentes de 12 a 17 anos.
Apesar da aprovação, a vacinação não pode começar de imediato, já que o imunizante tem compostos diferente para crianças, como a dose 67% menor (cai de 0,3 ml para 0,1 ml) e uso de apenas 20% do mRNA, em comparação com a dose para adolescentes e adultos. Com a aprovação, cabe agora ao Ministério da Saúde decidir se incorpora ou não a vacina nessa faixa etária ao PNI (Programa Nacional de Imunização).
O Instituto Butantan também chegou a dar entrada com pedido de uso emergencial da CoronaVac em crianças a partir de três anos, em agosto, mas a diretoria da Anvisa rejeitou por unanimidade alegando falta de dados sobre eficácia e segurança.
Um novo pedido foi feito pelo instituto esta semana para usar a CoronaVac em pessoas de 3 a 17 anos, e a Anvisa agora tem até 30 dias para analisar e responder. O governo de São Paulo diz que tem 12 milhões de doses reservadas para uso imediato, em caso de aprovação.
Pressa é necessária
Não bastasse a ômicron, a volta às aulas entre o final de janeiro e início de fevereiro de 2022 é um motivo crucial para darmos início à vacinação. Diferente desses dois anos de pandemia, as atividades presenciais devem se tornar regra, e o modelo híbrido que muitas escolas adotaram deve ser deixado de lado.
"A gente entendeu, desde o início, que primeiro você devia vacinar quem tem mais risco de morrer. Ali tinha de fazer uma escolha, mas agora temos vacinas suficientes, não tem motivo para não começar a vacinar as crianças", diz Isabella Ballalai, pediatra e vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
Ela afirma que, apesar de as crianças serem o grupo com menor risco de quadros graves e taxa de letalidade, elas não são imunes à doença em suas formas mais severas. "E com os adultos vacinados e adoecendo menos, as crianças passaram a ter até um peso maior no número de casos. Não que elas estejam mais suscetíveis, mas é uma proporção que cresce", diz.
Segundo dados dos cartórios de registro civil, desde o início da pandemia até 30 de novembro de 2021 morreram de covid 1.111 crianças de até 9 anos no país, o que representa 0,18% do total de óbitos do Brasil no período.
Mortes por idade no país de covid-19 até novembro:
"Apesar do avanço da vacinação na população acima dos 12 anos, temos mais de 25 milhões de crianças entre três e 11 anos não vacinadas, que estão desprotegidas", alerta Paulo Martins-Filho, epidemiologista chefe do Laboratório de Patologia Investigativa da UFS (Universidade Federal de Sergipe).
Ele explica que, com o avanço da nova variante e das disparidades socioeconômicas no país, o retorno às aulas no início de 2022 deve ocorrer já com as crianças vacinadas. "É de fundamental importância imunizar essas crianças o quanto antes", diz.
Brasil atrasado (de novo!)
Enquanto o Brasil demora a começar a vacinar os pequenos, países do mundo já deram início e estão avançando a vacinação. Cuba foi o primeiro país do mundo a iniciar vacinação em crianças e já está vacinando, desde setembro, menores a partir de 2 anos. A China, desde outubro, autorizou vacinar crianças a partir de 3 anos.
Em outubro, a FDA (Food and Drug Administration, na sigla em inglês) autorizou o uso da vacina Pfizer em crianças. No mesmo mês, a Índia (segundo país mais populoso do mundo e onde surgiu a variante delta) autorizou o uso da Covaxin. Em novembro, foi a vez da Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) ampliar a faixa etária de imunização com a Pfizer e atender crianças.
No último dia 7, por sinal, o departamento europeu da OMS (Organização Mundial da Saúde) cobrou maior proteção às crianças de 5 a 14 anos, alegando que ela seria a faixa da população mais afetada pela nova onda da covid-19.
Martins-Filho lembra que, nos Estados Unidos, a FDA fez a recomendação de uso ainda no final de outubro. "De acordo com a Pfizer, a vacina é segura e tem uma eficácia superior a 90% na prevenção de infecção pelo novo coronavírus nessa faixa etária", explica.
Pelos dados apresentados de benefício-risco, levando em conta que perdemos 2.500 menores de 18 anos pela pandemia, vemos como excelente para proteção das nossas crianças a incorporação da vacina [da Pfizer]. Rosana Richtmann, da Sociedade Brasileira de Infectologia
A CoronaVac também já é usada em crianças em outros países do mundo, como China e Chile, com bons resultados. "Somente na China, 84 milhões de crianças e adolescentes já foram vacinadas e o governo chinês anunciou que a população de crianças de três até 17 anos será totalmente vacinada até o final do ano", diz Dimas Covas, presidente do Instituto Butantan.
"Temos a tarefa de vacinar todas as nossas crianças tendo uma vacina eficaz e segura em estoque aqui no Butantan. A ignorância em relação a utilizar a CoronaVac para vacinar nossas crianças e jovens é imperdoável", completou, em fala durante o 1º Simpósio Internacional da CoronaVac, o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, que é fundador e ex-diretor da Anvisa.
Ômicron muda algo?
No caso da ômicron, médicos em Londres relataram que algumas crianças têm apresentado sintomas incomuns, como sinais de pele e falta de apetite. Já autoridade sul-africana diz que crianças com covid-19 no país têm infecções leves.
Melissa Palmieri, pediatra e diretora da regional São Paulo da SBIm, afirma que ainda é cedo para tirar qualquer conclusão de mudança no comportamento da covid-19 em crianças com a ômicron.
"É muito precoce, muito difícil falar que teremos repercussão grave nas crianças. Ainda temos muito que descobrir com relação a essa variante", afirma.
Ela diz ainda que é necessário que o retorno às aulas venha com vacinação não só da covid-19, mas de doenças que causam problemas sérios em crianças.
Chamo atenção que, para as crianças, se faz preponderante a vacinação da gripe. Ela tem uma repercussão importante para elas. Estamos vivendo um surto no Rio de Janeiro e não atingimos uma cobertura ideal na campanha de vacinação esse ano; e tem também a questão do sarampo, que o vírus está circulando em São Paulo, Rio e outros lugares. É crucial atualizar a carteira de vacinação. Melissa Palmieri, pediatra
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