Diagnóstico de glaucoma não é simples de ser concluído; entenda os motivos
Alessandra André Oliveira da Silva, 41, analista de cadastro, tem um histórico forte de glaucoma na família. A avó morreu cega, a mãe faz tratamentos desde bem nova e dois tios foram diagnosticados com a doença.
Ela trabalhava há 18 anos na frente de um computador e usava óculos por causa de hipermetropia. "Fazia um tratamento de prevenção, porque minha pressão ocular estava perto do limite, mas mudei de médico ele falou que eu já tinha glaucoma sem me orientar em nada. Fiquei desesperada", lembra Alessandra.
Para sua surpresa, depois de um tempo, outros exames apontaram que ela não tinha o problema. "Em uma consulta com outro médico, descobri que meu ângulo é fechado e meu olho é muito pequeno. Então ele pediu que, ao fazer os exames, colocasse um adesivo na pálpebra para que meu olho ficasse mais aberto. Assim eu fiz e o resultado não acusou mais nada, mas por conta do meu histórico familiar, continuarei acompanhando", conta.
De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), cerca de 64 milhões de pessoas no mundo apresentam alguma forma de deficiência visual ocasionada pelo glaucoma. Segundo projeção da instituição, em 2040, serão mais de 111 milhões de pessoas acometidas pela doença.
Porém o diagnóstico não é tão simples de ser concluído. Segundo Augusto Paranhos, presidente da SBG (Sociedade Brasileira de Glaucoma), é comum os pacientes já diagnosticados, como Alessandra, chegarem com muitas dúvidas nos consultórios.
Paranhos explica que o glaucoma é um conjunto de distúrbios oculares caracterizados por lesão progressiva do nervo óptico —frequentemente, mas nem sempre, associada à pressão ocular elevada. "O problema é que nem toda pressão alta é por conta de glaucoma, assim como existem pessoas com a pressão normal e tem a doença. Há casos também de olhos com grandes escavações (área circular e sem fibras dentro do olho) que seriam um indício, mas quando investigadas são apenas uma característica fisiológica", esclarece.
Por conta disso, Alessandra Costa, 50, radialista, também viveu momentos de aflição por conta de uma suspeita de glaucoma, mas em relação ao seu filho Bruno Eduardo, então com 15 anos.
"O Bruno usa óculos desde os 7 anos. A médica fez o exame de fundo de olho e disse que o Bruno tinha a 'escavação' aumentada e poderia ser glaucoma. Até terminar a investigação foi muito desesperador, porque eu sabia de todos os danos que a doença causava e ele era ainda muito novo. Quando procuramos outro especialista e realizamos os exames, essa suspeita foi de cara descartada", lembra.
A primeira dúvida da radialista foi: dá para diagnosticar o glaucoma somente com um exame de fundo de olho em consultório? Segundo Luísa Aguiar, oftalmologista, sim. Especialista em glaucoma pelo Cole Eye Institute, da Cleveland Clinic (EUA), a médica explica que essa conclusão pode ser dada com a análise do aumento da escavação e algumas alterações que sugerem dano glaucomatoso, como presença de hemorragia no bordo do disco, atrofia ao redor do disco óptico e afinamento localizado da camada de fibras nervosas, por exemplo.
Já Samantha Vasques, especializada em glaucoma e catarata pelo Instituto Benjamin Constant (RJ), ressalta que na grande maioria são necessários outros exames complementares para concluir melhor o diagnóstico. Vasques pontua que o glaucoma é uma doença que envolve diversas alterações, assim, é muito comum que algumas pessoas apresentem resultados são normais e contra o glaucoma, enquanto outros resultados são alterados e falam a favor da doença.
A avaliação do especialista entra na interpretação desses dados, para decidir quando deve ou não tratar. Desse modo, não cabe falar em um "diagnóstico errado", pois é um processo interpretativo e investigativo.
Casos suspeitos
Ambas especialistas afirmam que algumas inflamações do nervo óptico podem ser confundidas com glaucoma. Aguiar fala que diagnosticar a doença em pessoas com miopia alta normalmente é mais difícil, pois eles têm olhos com anatomia diferente.
Pacientes com córneas mais finas que tenham pressão intraocular alta têm mais chance de evoluir para glaucoma. Córnea fina sem nenhum outro achado ou histórico não é fator de risco. Já em quem tem córnea com espessura grossa, a medição da pressão costuma apontar para um resultado maior do que realmente está, levando também os profissionais a levantarem a suspeita.
Os pacientes com história familiar e os com graus muito altos: altos míopes têm mais risco de glaucoma de pressão normal e altos hipermétropes têm mais risco de glaucoma de ângulo fechado e devem ser analisados com mais atenção.
Segundo Vasques, que também é a idealizadora do canal "Papo Glaucoma" no YouTube, não existe fase pré-glaucoma nem tratamento de prevenção. A prevenção é feita mantendo um estilo de vida saudável com atividade física e alimentação adequada. O que existe são casos confirmados e suspeitos. Os confirmados sempre precisam de tratamento. Os suspeitos devem ser avaliados para decidir se devem ou não ser tratados.
Aguiar, que atende no Hospital São Vicente de Paulo (RJ), diz que em relação ao glaucoma primário de ângulo aberto (o mais comum) é fundamental o diagnóstico precoce e, assim, previne-se perda visual. No glaucoma de ângulo fechado, deve-se fazer o diagnóstico e indicar iridotomia com yag laser, procedimento realizado para abrir o ângulo.
"Importante ressaltar a possibilidade de se adquirir o glaucoma por corticiide, antiinflamatório muito utilizado e que pode aumentar a pressão intraocular. Portanto, evitar o uso indiscriminado e sem orientação médica dessa substância é muito importante", diz a médica.
Exames necessários
O mais eficaz é a combinação de exame clínico e campo visual computadorizado. Mais recentemente, a tomografia de coerência óptica é um exame complementar que também ajuda muito, principalmente em casos suspeitos ou iniciais.
Vasques destaca, porém, que qualquer exame médico é passível de erros, principalmente exames subjetivos como o campo visual. Por isso, é recomendado que o exame seja repetido sempre que surgir qualquer alteração nova, para confirmar se aquela alteração realmente é verdadeira.
Na indicação da especialista, a investigação de glaucoma precisa da consulta oftalmológica, que inclui a medida da pressão ocular e o exame de fundo de olho, associada a exames complementares que são a gonioscopia, a paquimetria corneana, a retinografia, o OCT do nervo óptico e o campo visual. Muitos oftalmologistas agregam também o teste de sobrecarga hídrica (medida da pressão intraocular após ingestão de um litro de água em cinco minutos) nessa avaliação.
Usar colírios sem ter glaucoma não traz nenhum benefício. Qualquer medicação possui efeitos colaterais e só deve ser utilizada com recomendação médica. No caso dos colírios, os principais problemas no longo prazo são relacionados ao ressecamento dos olhos, que pode ocasionar lesões nas córneas, como ceratites e úlceras, havendo, sim, o risco de prejudicar a visão.
Vale lembrar que o glaucoma é uma doença que não gera nenhum sintoma quando está no começo, e que a única maneira de detectar essa suspeita é fazendo um exame oftalmológico anual como rotina.
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