Surdez e cegueira no idoso declinam com sua saúde geral? São tratáveis?
Audição e visão são dois dos cinco sentidos fundamentais para nossa percepção de mundo e, quando se fala da pessoa idosa, preservá-los influencia diretamente na sua saúde geral de duas formas: mais de imediato, na redução do risco de quedas e outros tipos de acidentes físicos rotineiros e, por consequência, na saúde mental e cognitiva, já que os dois sentidos viabilizam uma boa comunicação, com grande impacto positivo na sociabilização do idoso.
Não valorizar isso é aceitar o comprometimento de vários aspectos. "O idoso vai andar e interagir menos, mas também se entreter menos, pois não poderá assistir TV, usar celular, fazer leituras. Igualmente, terá de deixar de dirigir, se exercitar [pois não percebe potenciais obstáculos], viver só, se divertir e isso leva a isolamento, depressão e redução da qualidade de vida", alerta Leonardo Marculino, oftalmologista do Hospital Cema, em São Paulo.
Ainda segundo Marculino, a família não incentivar, não dar suporte e não querer tratar causas de surdez e cegueira reversíveis no idoso é lamentável, pois hoje a medicina dispõe de diversas cirurgias e tecnologias avançadas.
"Seu papel também é prestar atenção, pois há idosos que não percebem dificuldades ou não reclamam, por vergonha, por não quererem atrapalhar os familiares ou dar despesas. Mas é preciso levá-los para avaliação médica o quanto antes."
Problemas oculares envolvidos
Com o processo de envelhecimento, a "lente" transparente e flexível localizada atrás da pupila (cristalino do olho) não consegue focar adequadamente objetos que estão perto. É a chamada presbiopia, cujos primeiros sintomas começam a se manifestar aproximadamente a partir dos 40 anos, mas pode ser "driblada" com o uso de lentes corretivas e lubrificação constante dos olhos. Esse é um dos problemas de visão mais comuns em idosos, porém há muitos outros.
Catarata (visão "borrada"); glaucoma (quando a pressão dentro do olho se eleva, resultando em dano ao nervo óptico, que leva a informação visual captada pelos olhos até o cérebro, para processamento e interpretação); retinopatias (lesões da retina por hipertensão e diabetes); degeneração macular (embaçamento no centro do campo visual, percebido durante leitura, bordado), distúrbios de refração (embaçamento na visão para perto, mas também para longe).
"A catarata é tratável cirurgicamente e se resolve muito bem. Glaucoma também se trata [por meio de medicação, cirurgia ou raio laser]. Já o tratamento de degeneração macular deixa um pouco a desejar, mas a condição é prevenível e estabilizável, assim como as retinopatias [é importante usar óculos de sol, consultar o oftalmologista anualmente, parar de fumar, ter um estilo de vida saudável e controlar comorbidades]", informa Paulo Camiz, geriatra e professor do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
No que compete a problemas de refração (miopia, hipermetropia, astigmatismo) é indicado fazer a correção visual com óculos de grau, lentes de contato, em alguns casos cirurgia e evitar a síndrome do olho seco (causadora de ardor, coceira) com aplicação de lágrimas artificiais.
Surdez não é "normal da idade"
A perda de audição em idosos (presbiacusia) tem a ver com a redução das células auditivas e de fibras do nervo auditivo funcionantes. Componentes genéticos, infecções e exposição a ruídos muito intensos por anos podem acelerar esse processo, bem como diabetes, pressão alta, tabagismo e uso excessivo de álcool, repercutindo em sintomas como zumbidos, tontura, dificuldade em entender conversas (especialmente ao telefone) e falar em ambientes cheios.
Por isso, novamente, é preciso visitas regulares ao médico e exames preventivos, ainda mais o idoso tendo doenças crônicas e incômodos. Dados da ABORL-CCF (Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial) apontam que, após perceberem algo de errado com a audição, pacientes adultos demoram cerca de sete anos para procurar um especialista e ainda mais dois anos para se decidir sobre tratamentos (tais como dispositivos amplificadores de som ou implante coclear), negligências que podem terminar em uma surdez definitiva.
"Não dá para encarar como algo 'normal da idade'. Quando há dificuldade para ouvir, é necessário passar por avaliação com otorrinolaringologista. Em neurologia, audição, assim como visão, são consideradas funções sensitivas especiais", afirma Ester Campos, neurologista do Hospital da Pessoa Idosa e professora de pós-graduação da Ipemed-Afya, no Recife.
"Ah, mas ele não gosta de usar aparelho", pode argumentar o cuidador do idoso. Pois vale citar os benefícios, esclarecer dúvidas na presença do médico e informar que hoje em dia os aparelhos auditivos são muito pequenos, adaptativos, modernos e quase imperceptíveis.
Por menos perdas e mais ganhos
"Tratar surdez e cegueira, mesmo sem obter cura, mas já atenuando e compensando perdas, não só ajuda o idoso a escutar e ver melhor, executar tarefas, manter a socialização, evitar hospitalizações, como age como um fator protetor para a saúde do cérebro, prevenindo transtornos de humor e demências", explica Natan Chehter, geriatra da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) e da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
"Ainda há o agravamento de doenças, alterações de comportamento, como agressividade e quadros de desorientação chamados de delirium. Observamos que sem seus aparelhos auditivos e seus óculos de grau, pacientes idosos internados, mesmo que temporariamente em UTI, apresentam estado de confusão mental e a solução, além de obviamente descartar outras causas, acaba sendo devolver para eles suas órteses e seus mecanismos de correção de visão e audição."
Escutar e enxergar bem ainda evita indiretamente prejuízos para o coração, insônia, ganho de peso e perdas de resistência e de massa magra, grandes vilões da longevidade, assim como ajuda o idoso a querer ter propósitos, se cuidar e perceber que é amado.
"A pessoa bem adaptada ao seu meio realmente desempenha melhor os seus papéis, vive melhor, é mais ativa e obtém-se isso com sua conscientização e a atuação do médico, com apoio da família", finaliza o geriatra.
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