Wordle, Termo: jogos de palavras evoluíram e todos saem ganhando; entenda
Marcelo Testoni
Colaboração para VivaBem
16/03/2022 04h00
Foi-se o tempo em que os idosos —e somente eles— jogavam e contavam apenas com versões impressas de caça-palavras —a clássica revistinha que se comprava na banca de jornal. O passatempo, que consiste em encontrar e circundar palavras escondidas num quadro repleto de letras embaralhadas, evoluiu e hoje pode ser baixado de graça e jogado sem complicações em qualquer smartphone, com nomes como "Wordle", "Termo", "Letreco" e "Contexto", conquistando os mais velhos, mas ainda multidões de todas as idades.
Nesses joguinhos online, os competidores têm algumas tentativas para acertar palavras curtas, geralmente atualizadas a cada 24 horas e que ao serem identificadas geram um placar, cabível de ser compartilhado em redes sociais, atraindo mais adeptos para a brincadeira.
Diariamente, milhões de pessoas no Brasil e no mundo se dedicam a esses desafios, considerados já o maior fenômeno digital da última década e, do ponto de vista médico, há muito o que se comemorar.
Não necessariamente as vitórias da competição, mas os benefícios atrelados à saúde. "A grande vantagem dessas tecnologias é que se consegue fazer tudo de forma simples, divertida e em poucos minutos, então super indico pacientes a jogar Wordle ou outros similares", afirma Júlio Pereira, médico pela UFBA (Universidade Federal da Bahia) e neurocirurgião, destacando que os ganhos estão atrelados à interação, entretenimento, fortalecimento de linguagem e atenção.
Entenda os efeitos no cérebro
Com o envelhecimento, o cérebro, gradativamente, sofre reduções de volume, neurônios, atividade e produção de neurotransmissores e hormônios. Com o acúmulo de proteínas tanto dentro quanto fora das células são favorecidas ainda doenças neurodegenerativas, a exemplo de Alzheimer e Parkinson, e a atenção complexa, dividida (de fazer duas coisas simultâneas) e a velocidade de processamento e de se resgatar memórias igualmente sofrem declínios.
Entretanto, é comprovado cientificamente que buscar manter uma regularidade de exercícios intelectuais e quanto antes tomar atitudes saudáveis reduz as chances de se enfrentar esses efeitos negativos. Então, sem desculpas, até porque, apesar das muitas perdas relacionadas ao avançar etário, a capacidade de se resolver problemas e aprender não se perde, garante Paulo Camiz, geriatra e professor do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
"Só paramos de aprender quando morremos, por isso o cérebro deve ser trabalhado como um músculo, e quanto mais se pratica, desde que não se tenha nenhum problema ou prejudique aquisições, o órgão se torna mais rápido, focado e capaz de acertar desafios", continua o médico, sobre a neuroplasticidade. Há games que ainda melhoram raciocínio lógico, agilidade, imaginação, criatividade, planejamento, habilidades motoras e ajudam com questões internas.
Do mental para emocional e físico
A "gameterapia" funciona tão bem no que compete a uma estratégia a mais para estabilizar o emocional e amenizar a solidão, que pouco depois do "Termo" (versão em português para o "Wordle", que é em inglês) ser lançado em janeiro de 2022, há quem já peça para que seja criada uma versão "premium", em que o competidor possa pagar para entreter-se mais de uma vez ao dia, revelou em entrevista para O Globo, o inventor do jogo, Fernando Serboncini.
Quem joga, pode se afirmar, se sente menos deprimido, mais útil, o que estimula a liberação de endorfina (hormônio do bem-estar), está melhorando autoestima, disposição, memórias, incluindo afetivas (uma vez que tentar formar e acertar vocábulos, por exemplo, pode resgatar lembranças da infância, da época escolar) e, sem perceber, combatendo, ou se aliviando das frustrações, tensões, ansiedade, gerados por isolamento, problemas e incertezas do dia a dia.
Atenta a tantos benefícios, a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) até financiou recentemente um projeto que soma gameterapia à criação de jogos virtuais por alunos acima de 60 interessados em prevenir problemas decorrentes da velhice.
Apoiados em estudos científicos e com ajuda de uma equipe multidisciplinar, eles até desenvolveram um aplicativo, o "Cérebro Ativo", com jogos de saúde e treinos pró mente, físico e sociabilidade.
Não requer QI, mas vontade
Para aproveitar e se sair bem em joguinhos online não é preciso ter quociente de inteligência acima da média —e você também não fica mais esperto que ninguém— apesar de poder apresentar certa vantagem sobre quem nunca praticou.
O principal é querer e isso deve ser estendido em querer rever hábitos ruins, envolvendo alimentação, sedentarismo, vícios em cigarro e álcool e falta de regularidade no médico, pois só jogar não garante superproteção.
"Mas não é para deixar de fazer outras atividades importantes e jogar em excesso (sem tomar cuidado com postura, articulações, sono), pois acaba prejudicando. É preciso ainda estimular outros domínios e o corpo também", ressalta Natan Chehter, geriatra da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) e da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
O querer também envolve gostar e se autodesafiar, ou seja, se o jogo perdeu a graça, ficou fácil demais, é necessário ter outros estímulos, assim o cérebro não cai na zona de conforto e começa a buscar por novos prazeres e estratégias para resolver problemas que lhe aparecem.
Se não quiser só ficar no celular, vá jogar baralho, fazer esculturas, ler um livro, pintar, aprender um novo idioma, tocar algum instrumento musical, mas sem se esquecer do físico. Dança é uma ótima sugestão. A chave é praticar algo novo todo dia e mexer o esqueleto.