É ficção um vigor como o do trio de velhos heróis em 'Jurassic World'?

Nos anos 1990 eles corriam, escalavam e saltavam árvores e cercas elétricas, brigavam com dinossauros e, agora, passados 30 anos... fazem exatamente a mesma coisa, a diferença é que estão com 55, 69 e 74 anos. A reportagem se refere, em ordem, a Ellie Sattler (Laura Dern), Ian Malcolm (Jeff Goldblum) e Alan Grant (Sam Neill), personagens heroicos do clássico de Steven Spielberg "Jurassic Park" e que este ano retornam para o épico final "Jurassic World: Domínio".

O novo filme ainda não estreou, mas pelo que já foi exibido em seu trailer e confirmado pelo próprio elenco e direção, o trio de veteranos terá o mesmo protagonismo dos jovens atores, que estão na faixa etária dos 30 e 40 anos.

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Daí a pergunta que não quer calar e que não tem a ver com trazer dinos de volta à vida: o vigor deles para enfrentar tantos desafios é pura ficção, ou pode ser alcançado de verdade, por idosos ou pessoas na meia-idade na vida real?

Tudo bem que muitas cenas são feitas por dublês, que se arriscam no lugar das celebridades, não importando a idade, mas o intuito da história, convenhamos, é mostrar que os próprios personagens é que dão conta da ação. Isso faz vislumbrar uma possibilidade fora das telas... Se ela for confirmada, o que fazer para se tornar um "aventureiro"? O candidato precisaria ter tido um passado ativo? Quais os ganhos? Há diferença entre idades e homens e mulheres?

O que dizem os médicos

Truque de cinema é alguém sobreviver ao ataque de um superpredador, à destruição de um avião ou a choque de 10 mil volts sem sofrer nenhum ferimento grave. Fora isso, sim, pode um idoso ou alguém que esteja perto dessa fase ter uma vida dinâmica, com muita adrenalina.

Segundo Natan Chehter, geriatra pela SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) e da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, não tem a ver com o acúmulo de anos.

"De forma alguma se coloca o idoso que é ativo e está disposto a novos desafios numa categoria de exceção. Muito pelo contrário, um envelhecimento saudável pressupõe que os idosos consigam realizar tudo aquilo que se predispõem a fazer. Obviamente com preparação e cuidados, mas isso cabe até aos jovens. O idoso não tem que ser impedido de praticar uma atividade física mais intensa, ou diferente, se ele tiver boas condições para isso", explica.

O geriatra continua que problemático é tolher desejos, anseios, projetos que o idoso tenha e encare fazer, simplesmente por conta da idade. Para ser impedido, só se não estiver pleno física e mentalmente, pela falta de condicionamento, ou por alguma doença.

Mas, atenção: para começar, praticar qualquer tipo de exercício mais intenso, exige-se antes passar por uma avaliação, inclusive com médico. Se não houver contraindicação, então não há impeditivos.

Como se volta à ação

O elenco do antigo parque passou por situações como as de agora poucas vezes, ou seja, não possui repertório suficiente de resistência, velocidade e força. Nesse ponto, se voltar com pique de atleta, se preparou.

Para encarar um filme desse, exige-se treinamento específico, ninguém vira um aventureiro de uma hora para outra, comenta Fabrício Buzatto, médico do esporte e fisiatra do HC-UFES (Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Espírito Santo).

Portanto, para voltar a uma "maratona" estando destreinado, passa-se antes por um longo e abrangente processo, com dedicação, regularidade e paciência, não basta apenas o querer.

"Deve haver cuidado especial com a alimentação, até porque, muitas vezes, a absorção acaba prejudicada pelo envelhecimento. É preciso adequar carboidratos, proteínas, e treinamento de força preconizado por, pelo menos, quatro vezes na semana", acrescenta o médico do esporte.

Pode-se realizar qualquer modalidade esportiva que seja segura, desde que —de novo— antes haja avaliação clínica e acompanhamento de geriatra e preparador físico, para evitar erros, lesões e seguir, com progressos, um programa personalizado.

Importante salientar ainda que no primeiro mês de ativa deve-se dar ênfase à melhora do condicionamento físico, o que inclui equilíbrio, resistência cardiorrespiratória, mas sem deixar de lado o fortalecimento muscular.

Requer vasta experiência?

Saiba que ter histórico de herói também não coloca ninguém acima dos 60 anos em vantagem sobre seus iguais, que nunca ralaram para escapar de um Tiranossauro Rex, por exemplo. Um estudo da Universidade de Birmingham, na Inglaterra, constatou que idosos que nunca foram regulares em exercícios possuem praticamente a mesma habilidade de ganhar músculos de idosos altamente treinados com a mesma idade quando são induzidos ao treino de força.

"Mudar hábitos que trazem prejuízos e perdas na velhice [sedentarismo, etilismo, tabagismo, má dieta] produz benefícios e resultados muito mais significativos e impactantes em qualidade de vida, independência e autonomia, comparado aí, sim, com outras faixas", afirma Christiane Machado, geriatra do Hospital São Rafael, em Salvador, e diretora científica da SBGG.

Em pessoas que resolvem se movimentar, as articulações ficam menos sobrecarregadas pelo peso, músculos ganham força e a autoconfiança e os estímulos mentais aumentam, o que possibilita conquistar muito mais coisas, cita a médica.

Entre as quais, realizar tarefas, quebrar ciclos de dependência, melhorar estado de humor e socialização e reduzir prejuízos, como declínios de imunidade, coordenação, postura, além de evitar e controlar comorbidades e recaídas.

No final das contas, também não há grande diferença entre gêneros, Sattler está páreo a páreo com Malcolm e Grant. Por conta da testosterona, eles podem até sair com certa vantagem em termos de percentual muscular, mas não significa que ela e outras mulheres fiquem impedidas ou cumpram menos desafios.

Tem a ver muito mais com persistência. Na dúvida... "Podemos discutir sexismo em situações de sobrevivência quando eu voltar", garantiu a heroína jurássica.