Estudo sugere que fibras melhoram resposta à imunoterapia; qual a relação?
Encontradas em boas quantidades nos alimentos do tipo cereal, como arroz e aveia, e frutas e verduras, as fibras têm como função auxiliar no funcionamento intestinal. Mas elas também aumentam a saciedade, ajudam no controle da glicemia e do colesterol —por retardar a absorção desses compostos no organismo—, atuam no combate aos radicais livres —por conta dos antioxidantes—, e na prevenção de doenças cardiovasculares. Recentemente, elas ainda ganharam mais um benefício: contribuir na melhor resposta à imunoterapia em pacientes com melanoma, um tipo de câncer de pele.
O estudo, publicado em dezembro de 2021 na revista Science, apontou que uma dieta rica em fibras poderia promover uma maior diversidade de bactérias saudáveis no trato gastrointestinal. Segundo os pesquisadores, essa maior quantidade de micro-organismos deixaria o sistema imune mais alerta e pronto para agir. "Então, ao ser estimulado pela imunoterapia, o nosso organismo estaria mais forte e apto para promover a resposta terapêutica contra o câncer", explica Markus Gifoni, oncologista clínico e professor de oncologia clínica da UFC (Universidade Federal do Ceará).
A imunoterapia é um tratamento que potencializa o sistema imunológico com o intuito de combater doenças como câncer. Nesse caso, as drogas não visam as células do tumor, e sim as células de defesa do organismo, a fim de que elas detectem e combatam a doença. Ela responde bem ao câncer de pulmão e ao melanoma, em especial os em estágio avançado.
O que estudo mostrou
Liderada pela Universidade do Texas e pelo Instituto Nacional de Saúde (EUA), a pesquisa se concentrou em uma técnica terapêutica chamada bloqueio de ponto de verificação imunológico, que utiliza drogas conhecidas como ICI (Inibidores de Checkpoint Imune).
Na prática, funciona assim: algumas células tumorais adquirem a capacidade de frear o trabalho do sistema imunológico contra o tumor, que é o chamado checkpoint imune. Então, os ICI contribuem para evitar que o tumor atrapalhe o organismo, deixando o sistema imune livre para combater a doença. É aí que entram as fibras, para deixar o corpo mais forte para essa batalha.
No estudo observacional, os pesquisadores avaliaram os perfis da microbiota fecal, hábitos alimentares e uso de suplementos probióticos em pacientes com melanoma e realizaram estudos pré-clínicos paralelos. Os pacientes com melanoma que relataram alto consumo de fibras (prebióticos) tiveram uma melhor resposta à imunoterapia com inibidor de checkpoint em comparação com os pacientes que relataram uma dieta pobre em fibras.
Como fibras estimulam sistema imune
Alguns estudos sugerem que o consumo de fibras pode modular o sistema imunológico a partir da microbiota, uma vez que esses micro-organismos que habitam o intestino se alimentam das fibras. Um estudo publicado em 2018 no periódico Immunity mostrou que a microbiota intestinal tem, entre outras funções, o poder de regular a resposta imune a infecções e inflamações.
Além disso, quando as fibras são ingeridas, elas são totalmente fermentadas pelos micro-organismos que vivem nas partes mais avançadas do intestino. "Dessa fermentação, resultam subprodutos, principalmente ácidos graxos de cadeia curta, que nutrem e protegem as células que revestem a parede do intestino e que são cruciais para a função imunológica do nosso corpo", aponta Marcella Garcez, médica nutróloga, diretora da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia) e pesquisadora em suplementos alimentares no Serviço de Nutrologia do Hospital do Servidor Público de São Paulo.
Um estudo, também publicado em 2018, até mostrou que esses ácidos graxos formados são responsáveis por nos proteger de resfriados e gripes mais do que a própria vitamina C. Como resultado disso, a casca da laranja seria mais eficaz para o sistema imune do que a própria polpa.
Atenção aos probióticos
De acordo com os autores do estudo feito com pacientes com melanoma, o benefício mais marcante foi observado para os pacientes que relataram uma combinação de alto consumo de fibras, mas que não usaram suplementos probióticos vendidos sem receita.
"Os pesquisadores sugerem que o microbioma (flora intestinal) pode ser modificado com o uso de suplementos probióticos e a resposta ao tratamento pode ser menor no comparativo com uma dieta rica em fibras, mas sem o uso do produto", aponta Ana Carolina Cantelli Pereira, líder de nutrição do A.C. Camargo Câncer Center, em São Paulo.
São necessários mais estudos, mas assim como qualquer tipo de suplementação alimentar, é preciso tomar um certo cuidado em relação a esse produto que promete melhorar a saúde intestinal. Geralmente, os probióticos são indicados para algumas doenças intestinais, como a síndrome do cólon irritável, doença inflamatória intestinal, e mesmo para amenizar a toxicidade associada à quimioterapia.
A literatura recente tem demonstrado que o que traz maior benefício na melhora da microbiota é a qualidade da alimentação, retirando aditivos alimentares, adoçantes, emulsificantes, conservantes, gordura saturada e excesso de proteínas de origem animal. Os alimentos protetores são principalmente aqueles ricos em fibras e compostos bioativos, como grãos e cereais integrais, frutas, verduras, legumes, feijões e castanhas". Gabriela Villaça, chefe substituta da Seção de Nutrição e Dietética do HCII (Hospital de Câncer II) do Inca (Instituto Nacional de Câncer).
Portanto, os suplementos de probióticos devem ser consumidos somente com orientação e prescrição médica. "Pacientes com câncer e em tratamento imunoterápico também precisam de uma indicação individualizada", aponta Garcez.
Consumo de fibras está abaixo do recomendado
Novas pesquisas ainda serão necessárias para que a medicina chegue a uma conclusão concreta sobre a relação das fibras com a imunoterapia, inclusive em outros tipos de câncer além do melanoma. Mas, ainda sim, o estudo em questão mostra a relevância de uma dieta saudável.
De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o brasileiro consome cerca de 12,5 g de fibras por dia. Algo bem abaixo dos 25 a 30 g recomendados pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Para melhorar esse índice, o ideal é consumir pelo menos cinco porções de frutas e vegetais sem amido, como melancia, pêssego, morango, melão, couve, brócolis, repolho, entre outros. Além disso, invista nos cereais integrais, como aveia e seus derivados, além da chia e linhaça, que podem ser consumidas junto com frutas e iogurtes, por exemplo.
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