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Como mulher que não tem área cerebral responsável por linguagem é bilíngue

Pesquisadores avaliaram ressonâncias do cérebro de EG - Departamento de Cérebro e Ciências Cognitivas do MIT
Pesquisadores avaliaram ressonâncias do cérebro de EG Imagem: Departamento de Cérebro e Ciências Cognitivas do MIT

Sarah Alves

Do VivaBem, em São Paulo

18/04/2022 18h27

Uma mulher dos Estados Unidos, identificada apenas como EG, não tem o lobo temporal esquerdo, região cerebral envolvida no processamento da linguagem, mas é fluente em inglês e russo.

EG descobriu a alteração no seu cérebro em 1987, durante exame no Hospital Universitário George Washington por uma condição não especificada. Em 2016, ela escreveu para pesquisadores do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e aceitou participar de uma série de estudos. O primeiro foi publicado no periódico Neuropsychologia em edição que circula a partir de 3 de maio.

De acordo com os cientistas, EG pode ter sofrido um derrame quando era bebê que lesionou a área. Isso mostra a neuroplasticidade do órgão, capacidade de compensar o trabalho de demais regiões. "As redes neurais, conexões do cérebro, compensam, ou seja, assumem a função da área lesada", explica o neurocirurgião Wanderley Cerqueira de Lima, do Hospital Israelita Albert Einstein (SP) e diretor do WCL Neurocirurgia.

Esse processo é mais intenso nos primeiros anos de vida, com maior probabilidade de "remanejar" a área que desempenha a função. Em pessoas mais velhas, há mais risco de alterações causarem sequelas. É o caso da afasia, que pode ocorrer após AVC (acidente vascular cerebral), por exemplo. "Há área do cérebro com perturbação da habilidade da linguagem, que inicialmente estava intacta, mas a lesão afetou alguma região ou a conexão entre as áreas", diz Lima. Mesmo assim, dependendo da alteração, não é incomum que pacientes reestabeleçam funções após fisioterapias focadas.

Cirurgias para tumores cerebrais também podem afetar áreas do cérebro. Assim como derrames pré-natais, antes do nascimento, em que a plasticidade pode fazer com que o bebê nasça sem qualquer manifestação que indique a alteração cerebral.

No artigo, os pesquisadores apontam que EG transferiu o processamento das habilidades para a região direita, e que um único lado conseguiu dar suporte ao desenvolvimento linguístico. As análises usaram ressonância magnética funcional para avaliar a atividade cerebral durante ações relacionadas à linguagem, como ler frases, e resolver problemas de matemática.

Áreas do cérebro

Para a linguagem, duas regiões do cérebro exercem trabalho essencial. Uma posterior, chamada área de Wernicke, responsável pela compreensão. E, mais à frente, a área de Broca —no lobo temporal esquerdo—, responde pela "expressão" da linguagem, como fala e escrita.

Ao site Wired, a doutoranda no MIT Greta Tuckute indicou que algumas pessoas podem ter a carga da linguagem dividida nos dois lados do cérebro. Outras, mais raramente, podem conectar esse sistema ao hemisfério direito.

O que define a lateralidade do cérebro, ou seja, qual lado é responsável por cada função, ainda tem indefinições. Existem questões hereditárias e há uma lógica cruzada relacionada ao fato de a pessoa ser destra ou canhota. Geralmente, ambas centram as atividades do lado esquerdo, mas quem é canhoto tem mais chances de concentrá-las no hemisfério direito, descreve o neurologista Felipe Graça, do Hospital Vera Cruz (SP).