Vídeos de faxina em casa de pessoas depressivas viralizam; entenda relação
Vídeos da modelo e apresentadora Ellen Milgrau limpando casas de pessoas com problemas emocionais viralizaram nas redes sociais. Em um dos registros, publicado em março, ela organiza o apartamento de uma jovem de 21 anos que entrou em depressão após a morte de um ente querido e não limpava a casa desde junho de 2021.
"Teve um momento durante a limpeza em que ela desabou, começou a chorar e se sentir culpada da gente estar fazendo isso por ela. Mas a gente explicou, acolheu e deu tudo certo", conta no vídeo, que mostra baratas pela casa e panelas com comidas estragadas e larvas.
Descuidar dos cuidados domésticos não é incomum em quadros depressivos. Isso acontece porque há um nível de anedonia, perda de prazer perante à vida, incluindo em cuidar de si, explica a psicóloga Ana Gabriela Andriani.
"Há perda de prazer em estar no seu ambiente. A pessoa não se cuida porque não vê sentido na vida e isso se reflete no ambiente, ela também deixa de trabalhar, sair com amigos", detalha Andriani, mestre e doutora pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Isolamento piora a situação
Iniciativas como a de Ellen ganham destaque. A influenciadora finlandesa Auri Katariina tem 1,7 milhão de inscritos no YouTube que acompanham as faxinas gratuitas em casas de pessoas com depressão. Inspiradas pela atitude, as amigas Julia Melhem e Mônica Garcia lançaram o projeto Limpeza Voluntária, em Santos, no litoral paulista.
"Nós duas tivemos depressão. Nunca chegamos ao nível de não conseguir limpar a casa, mas o jeito que estávamos era ruim, já nos sentíamos mal fazendo coisas domésticas e pensamos: 'Imagina quem não consegue?'", contou a estudante Julia, 21, a VivaBem.
A mensagem das duas em um grupo de mulheres viralizou. O projeto optou por não compartilhar registros das limpezas, para assegurar o anonimato das participantes. Mesmo assim, cancelamentos são comuns. "Bastante gente cancela, porque é difícil receber pessoas em momentos assim, normalmente elas não querem interagir."
O isolamento, comum em casos de depressão, pode ser um agravante para a doença e, consequentemente, a falta de limpeza na casa. "A pessoa se isola e muitas vezes não busca ajuda. Para ter consciência da situação é preciso força interna, e é superimportante que familiares e amigos fiquem atentos, vão visitar e identifiquem algo que possa estar errado", alerta a psicóloga Ana Gabriela Andriani.
Desajuste neuroquímico
Romper com o pensamento de que para sair da depressão é preciso apenas vontade é o primeiro passo para entender a doença de fato.
"Existe um circuito do cérebro que funciona para vivenciar reações na hora certa. Essas regiões podem adoecer, como qualquer órgão. A depressão é um desajuste do funcionamento das áreas que controlam o humor, por isso reagir não depende mais apenas da vontade da pessoa", diz o psiquiatra Pablo Vinícius, mestre pela UnB (Universidade de Brasília).
Inclusive, deixar de organizar a casa a ponto de viver em um ambiente com muita sujeira pode não ser sinal de desleixo, mas de evolução da doença.
"A energia diminui cada vez mais, assim como a vontade de se cuidar. A pessoa que limpava a casa e já não quer cuidar mais. Podemos entender isso como um agravamento da doença, porque cuidar da casa é cuidar de si. Às vezes até vê que está sujo, mas não tem vontade de limpar e as pessoas não entendem", descreve Vinícius.
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