Cerveja sem glúten, orgânica, low carb: alguma é melhor para a saúde?
A discussão sobre se existe cerveja saudável é similar aos extensos bate-papos de boteco: todo mundo tem a sua opinião e os argumentos, muitas vezes, não são suficientes para convencer os que discordam ou não. A verdade é que a bebida —que lista entre as preferidas dos brasileiros— está cada vez mais democrática por conta das novas versões, que têm conquistado mais espaço nas gôndolas dos supermercados e um público fiel.
É possível encontrar cervejas artesanais, sem álcool (zero ou baixo teor), light, low carb, sem glúten e até orgânicas —feitas com ingredientes cultivados de forma natural sem a adição de produtos químicos.
Antes de tudo, é importante saber que o Cisa (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool) recomenda a ingestão máxima de duas doses de álcool por dia para homens e uma dose para mulheres, considerando uma dose igual a 14 g de álcool, o que corresponde a 350 ml (uma lata) de cerveja. A diferença ocorre porque as mulheres apresentam menores níveis de enzimas responsáveis pela metabolização do álcool e demoram mais tempo para eliminá-lo.
Segundo os especialistas consultados, as melhores opções (com álcool) são justamente as mais naturais, com o menor número de ingredientes, sem a adição de produtos químicos —ou seja, as artesanais e as orgânicas. Mas o ideal mesmo seria uma com poucas calorias, sem álcool e natural. Isso porque os estudos são controversos. Por mais que alguns mostram que, em dose moderada, o consumo proteja o coração, outros revelam que apenas uma dose diária já é capaz de encolher o cérebro.
Mas será que tirando todos esses fatores a bebida ainda seria considerada cerveja no país que tanto a ama?
Cerveja também tem benefício
Diferente do que muitos acreditam, a cerveja (mais natural) tem uma série de nutrientes. Em sua composição, além de água, que corresponde a 90%, são encontradas substâncias antioxidantes, derivadas do lúpulo e do malte, que ajudam na manutenção de funções orgânicas. "Ela dispõe de um aporte proteico e calórico, além de sais minerais e algumas vitaminas do complexo B, principalmente", lista Flávio Luís Schimdt, engenheiro de alimentos, professor da FEA-Unicamp (Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas).
Juliana Kato, nutricionista e diretora executiva do departamento de nutrição da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo), explica que as flores de lúpulo, utilizadas na fabricação, que conferem o sabor amargo e aromatizante, também contêm compostos fenólicos que possuem atividades antioxidante e anti-inflamatória. "Além disso, a levedura da cerveja é rica em micronutrientes, e considerada um probiótico por conter o fungo Saccharomyces cerevisiae."
Entre os vitaminas estão niacina (B3), que atua na redução do colesterol e na saúde em geral, e o folato (B9), cuja ação está relacionada à formação de DNA. Os minerais encontrados são o magnésio, com papel nos processos de funcionamento das células do organismo, o fósforo está envolvido na reparação de células e tecidos e o selênio, com propriedades antioxidantes, colabora no combate aos radicais livres.
"Recentes estudos mostraram que a ingestão moderada, incluindo a cerveja, pode ter um efeito protetor sobre as doenças cardiovasculares e mortalidade quando comparada a indivíduos abstêmios", diz Juliana Kato.
Entretanto, só há benefícios à saúde se o consumo for moderado e não exista intolerância aos ingredientes e aos produtos da fermentação.
Os malefícios
Não se pode esquecer que a cerveja é calórica: cada lata de 350 ml contém 150 kcal. "A light deve ter até 35 kcal por 100 ml para receber essa classificação. No entanto, uma lata de 350 ml teria 122,5 kcal, ou seja, a redução comparada à tradicional não é tão significativa. Além disso, mesmo com quantias menores de calorias e carboidratos, ainda há álcool na composição", afirma Mayara Bernardo, nutricionista clínica e renal do HC-UFPE (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco), ligado à rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares).
A dica para as pessoas que buscam um estilo de vida mais saudável é consultar sempre a tabela nutricional e a lista de ingredientes para saber o que está consumindo.
É possível encontrar versões com baixa quantidade de álcool no mercado, com um teor etílico inferior ou igual a 0,5%. As chamadas zero álcool têm teor máximo de 0,05% e as de baixo teor alcoólico, entre 0,5 e 2%.
Segundo a nutricionista do HC-UFPE, por não conter álcool em sua composição, o seu valor calórico também é menor, já que 1 g de álcool equivale a 7 kcal. "A 'sem álcool' pode ter até 50% menos calorias do que a tradicional e acaba, também, sendo escolhida por aqueles que desejam emagrecer ou até mesmo manter o peso saudável."
Mesmo com concentrações alcoólicas menores, elas não são indicadas às gestantes. "Há um consenso no meio científico sobre a não recomendação às grávidas; sobre a cerveja sem álcool, ainda não há uma concordância sobre a liberação do uso", alerta Paulo F. Henkin, médico nutrólogo e diretor da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia).
E as sem glúten?
A cerveja tradicional contém glúten por conta do malte, que é produzido a partir de cereais que possuem a proteína —cevada, trigo, centeio. Por isso, ela não é recomendada para as pessoas que apresentam algum tipo de restrição ao glúten, como a doença celíaca, alergia ou intolerância.
Assim, as opções sem glúten são produzidas a partir de partir de outros cereais, como o arroz, ou com o uso de enzimas que degradam a proteína.
"Os processos de redução ou eliminação do glúten, bem como os usados para diminuir o teor alcoólico, melhoraram muito nos últimos 10 anos. A qualidade dessas cervejas ficou muito próxima das receitas originais. Os atributos de sabor e aroma se mantiveram quase os mesmos", afirma o engenheiro de alimentos Flávio Luís Schimdt.
Porém, a ausência da substância não torna o produto mais saudável. "Além disso, o valor calórico é semelhante ao da tradicional e não há redução das concentrações alcoólicas e de carboidratos", esclarece Bernardo.
A nutricionista da Socesp lembra que é importante beber de forma consciente e elenca entre as orientações: estar alimentado quando for beber, pois com o estômago vazio, o álcool é absorvido de forma mais rápida. A hidratação é também crucial para evitar a ressaca e a desidratação e, por fim, respeitar os seus limites na ingesta.
"É necessário reforçar que, independentemente da bebida escolhida, as quantidades precisam ser controladas. As versões consideradas mais saudáveis dão uma impressão equivocada de que podem ser consumidas livremente", finaliza Bernardo.
Brasileiros inventam cerveja isotônica e com baixo teor alcoólico
Alguns dos problemas do excesso de cerveja são o abuso do álcool e a desidratação. Pensando nisso, uma pesquisadora da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Araraquara (SP) desenvolveu uma pilsen de baixo teor alcoólico e isotônica.
Segundo Deborah Oliveira De Fusco, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp, que criou a versão da cerveja, os ingredientes da receita (malte, lúpulo, levedura, água, sódio e potássio) passam pelo mesmo processo de fabricação das variedades alcoólicas, mas a diferença é que sua fermentação é interrompida no segundo dia após a adição das leveduras, o que controla o teor alcoólico, deixando-o em torno de 0,2%.
Para que a bebida também fosse caracterizada como isotônica, foram adicionados sódio e potássio ao final do processo de maturação. "Muitos produtos isotônicos que estão no mercado contam com adição de várias substâncias artificiais, como corantes e conservantes, por exemplo. Pessoas que buscam um estilo de vida mais natural não querem consumir esse tipo de bebida", disse o professor Gustavo Henrique de Almeida Teixeira, docente da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp, em Jaboticabal, e orientador do estudo que resultou na nova cerveja.
Fontes: Flávio Luís Schimdt, engenheiro de alimentos, professor da FEA-Unicamp (Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas); Juliana Kato, nutricionista e diretora executiva do departamento de nutrição da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo); Mayara Bernardo, nutricionista clínica e renal do HC-UFPE (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco), ligado à rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Paulo F. Henkin, médico nutrólogo e diretor da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia).
Referência: Taco (Tabela Brasileira de Composição de Alimentos).
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