Vitória Rosa: 'Achava saúde mental besteira até saber que não sou blindada'
"Sabe quando sua cabeça está mandando o corpo ir, mas ele não responde? É assim que me sinto quando a saúde mental não está boa. A conta simplesmente não fecha", diz Vitória Rosa, a velocista carioca de 26 anos que é hoje considerada a mulher mais rápida do Brasil e compete em provas de 100 e 200 metros rasos.
Antes de passar por um período recente em que não se sentiu bem emocionalmente e sentir os reflexos nos treinos, a atleta confessa que sentia um certo preconceito quando ouvia outros esportistas falando sobre a tal "saúde mental".
"Pensava que a pessoa só podia estar 'doida', que nada daquilo poderia acontecer comigo, já que eu tinha a cabeça forte. Mas aí gente passa por alguma situação e descobre que a nossa cabeça não é tão forte assim, que a mente não estava totalmente blindada e sempre pode ter uma brecha para que alguma coisa escape. Acabei entendendo quem estava no mesmo lugar antes, e descobri que não sou uma máquina, o atleta também é, no fim das contas, humano."
Para Vitória, o fato de o atletismo ser um esporte bastante individual pode acabar colocando ainda mais pressão mental para os competidores —afinal, apesar de contar com uma equipe multidisciplinar nos treinos e preparo físico e mental, os resultados finais dependem da performance do atleta.
Um estudo publicado no periódico Frontiers in Psychology reforça essa visão: resultados da pesquisa apontam que a prevalência de depressão costuma ser maior em atletas que praticam esportes individuais (como competições de atletismo) do que para aqueles que fazem parte de uma equipe (como no futebol).
Vitória compete, com a saúde mental "muito mais em dia", segundo ela, representando o Brasil no Mundial de Atletismo que acontece entre 15 e 24 de julho na cidade de Eugene, em Oregon, nos Estados Unidos, tentando alcançar bons resultados nas duas provas em que geralmente disputa (100 e 200 metros).
Quando passou por um período de dificuldade, sua solução foi conversar com o treinador sobre como estava se sentindo. Hoje, ela faz acompanhamento com um psicólogo, o que julga ser essencial para conseguir estar bem, não só na esfera profissional, mas na sua vida como um todo.
"Quando você tem algumas 'linhas tortas', um psicólogo ajuda a deixá-las retas. Apesar da proximidade que tenho com a minha mãe, com meu noivo, é diferente, não consigo abrir tanto o que estou sentindo fora do consultório", diz.
Na opinião da atleta, a desistência da premiada ginasta Simone Biles em uma prova na Olimpíada de Tóquio, que ocorreu por questões de saúde mental da jovem norte-americana, abriu espaço para que a saúde mental de esportistas profissionais fosse discutida.
"Hoje temos consciência do quanto aquele momento foi importante. A gente não é 100% todo dia, não somos máquinas. O corpo responde à mente, um depende do outro, precisam estar alinhados em harmonia."
Buscando o título mundial
Nos Jogos de Tóquio, Vitória Rosa ficou em sexto lugar na prova classificatória dos 200 metros rasos com o tempo de 23,59 segundos e não conseguiu chegar às semifinais. Na ocasião, ela desabafou sobre a dificuldade de ter passado o ciclo olímpico sem patrocínio e durante a pandemia da covid-19. Mas ela se fortaleceu desde então, anotando resultados mais expressivos.
No último 'GP' que competiu, o Grande Prêmio Internacional Brasil de Atletismo, que aconteceu no começo de maio, Vitória venceu os 100 m (com o tempo de 11,05s) e os 200 m (com 22,68s), garantindo o índice para o Mundial.
"O resultado me deu confiança, já que cheguei muito perto da melhor marca da minha carreira [11,03 segundos nos 100 m e 22,62 segundos nos 200 m]. Venho tendo um ano de resultados muito bons, e espero que isso continue no próximo ano. O objetivo é seguir assim até a próxima Olimpíada", afirma.
As provas nas quais Vitória compete têm um nível extremamente alto de performance. Entre as suas adversárias, está a jamaicana Elaine Thompson, 29, que tem um recorde pessoal de 10,84s nos 100 m e 22,31s nos 200 m —e é a principal aposta para o lugar mais alto do pódio na competição.
Nos 100 metros do campeonato mundial, a brasileira ficou em quinto em sua bateria —e apenas as três primeiras colocadas avançam na competição. Nos 200 metros, ela se classificou para a semifinal, que acontece nesta terça (19), às 22h15.
"Hoje já percebo que outras atletas não me veem mais só como uma mera competidora, mas, sim, como uma adversária. E para uma pessoa competitiva como eu, isso é combustível."
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