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Pesquisa detecta agrotóxicos em nuggets e requeijão; como isso afeta saúde?

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Do VivaBem*, em São Paulo

28/07/2022 17h05Atualizada em 29/07/2022 16h21

Uma pesquisa realizada pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) detectou a presença de resíduos de agrotóxicos em alimentos ultraprocessados comuns na mesa do brasileiro, como salsicha, empanado de frango (nuggets) e requeijão.

Em 2021, foi publicada a primeira edição do estudo "Tem Veneno Nesse Pacote", na qual se evidenciou pela primeira vez um perigo duplo: além de causarem problemas crônicos de saúde, os ultraprocessados também estão contaminados com agrotóxicos.

Agora, em 2022, o segundo volume do estudo analisou ultraprocessados de origem animal, como carnes e leites. Foram 24 amostras de produtos de oito categorias. Os resultados foram bastante preocupantes, segundo o instituto. De 24 ultraprocessados derivados de carnes e leite analisados, 14 apresentaram resíduos de agrotóxicos.

Todas as categorias de produtos de carne e duas das três marcas de requeijão apresentaram resíduos desses compostos, entre eles o glifosato, agrotóxico que é considerado como "provável cancerígeno" pela ONU (Organização das Nações Unidas). Apesar de já ter sido proibido em diversos países, no Brasil segue sendo o agrotóxico mais utilizado.

Produtos que mais apresentaram resíduos de agrotóxicos:

  • Empanado de frango (nugget) Seara, com 5 agrotóxicos;
  • Requeijão Vigor, com 4 agrotóxicos;
  • Requeijão Itambé, com 3 agrotóxicos;
  • Empanado de frango Perdigão com 3 agrotóxicos.

Na lista de produtos com agrotóxicos aparecem também salsichas, hambúrgueres de carne, mortadela e linguiça suína de calabresa. Ainda segundo o Idec, Nescau, Toddy e Pirakids e os iogurtes Activia, Nestlé e Danone não apresentaram resíduos. Ainda assim, a pesquisa do Instituto afirma que é possível que o produto analisado tenha dado resultado negativo para a presença de resíduos nesse lote, mas que o resultado seja diferente para outros lotes.

O que as empresas dizem?

Em nota, a BRF, responsável por Sadia e Perdigão, informou que retornou o contato do Idec respondendo a todos os questionamentos levantados pelo instituto. "Os produtos são devidamente fiscalizados por órgãos competentes, como a Anvisa e o Mapa, que utilizam padrões internacionais de pesquisa para detecção de eventuais resíduos de defensivos agrícolas, eventualmente utilizados pelos produtores de insumos na ração animal."

Já a Seara disse que, em março, "forneceu ao Idec respostas técnicas detalhadas sobre os itens supostamente encontrados em seus produtos e lamenta que esses esclarecimentos não tenham sido contemplados no relatório publicado".

"Todos os produtos avaliados respeitam os parâmetros para itens alimentares regulamentados pela Anvisa. A empresa mantém vigilância ativa de controle de matérias-primas de origem animal, vegetal e mineral, além de laboratório próprio dedicado a pesquisas de resíduos e contaminantes."

A Vigor informou, em nota, que não teve acesso a informações importantes para que pudesse, na ocasião, analisar e rastrear o lote do produto citado, tais como data de fabricação e/ou validade do produto, laudo técnico, laboratório onde foi realizada a análise, data de realização do exame e método específico utilizado.

"A companhia reforça que realiza constantemente programas de controle interno em todas as suas unidades fabris e postos de captação de leite, bem como o monitoramento através de laboratórios credenciados na rede brasileira de qualidade do Leite-RBQL, não tendo verificado a presença de inseticidas, acaricidas e agrotóxicos em seus produtos (...) A empresa reforça mais uma vez que preza pela saúde e o bem-estar de seus consumidores e tem como prioridade a Segurança dos Alimentos, bem como a garantia da qualidade de seus produtos em todas as etapas da cadeia de produção." A reportagem ainda aguarda posicionamento das outras marcas.

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Como isso impacta nossa saúde?

Bater o martelo sobre os riscos à saúde é complexo. Primeiro por questões éticas. Não é possível fazer experimentos com humanos, pois não se sabe qual seria a quantidade segura do uso dessas substâncias. Depois, pelas análises feitas até o momento serem observacionais, muitos fatores podem confundir os resultados, afinal, o corpo é exposto a uma série de outros produtos potencialmente tóxicos, como a fumaça do cigarro, por exemplo, e a poluição.

Os dados que se tem até o momento também são mais evidentes em trabalhadores que lidam diretamente com os agrotóxicos e a população rural. Pouco se sabe sobre os impactos na saúde de quem apenas consome esses alimentos.

Mas de acordo com o cardiologista e nutrólogo Edmo Atique Gabriel, professor livre-docente na Unilago (União das Faculdades dos Grandes Lagos) e colunista de VivaBem, qualquer quantia de agrotóxico, por mais que seja um resíduo, pode fazer mal ao corpo —isso a curto, médio e longo prazo.

"As repercussões mais comuns são as que afetam o sistema digestivo, como vômito, diarreia e desidratação. No público infantil, pode ocorrer a desnutrição", explica o médico. "As complicações mais graves podem envolver o desenvolvimento de câncer de todos os tipos, além de repercussões cardíacas, como arritmia, e as neurológicas, como convulsões, alterações do movimentos corporais e dos reflexos", afirma. Já em gestantes, podem levar ao aborto e à malformação congênita.

Ainda segundo o médico, tudo isso vai depender da quantidade ingerida. Se uma pessoa, por exemplo, come nuggets todos os dias —no almoço e no jantar—, ela pode apresentar os sintomas mais graves.

Para o nutrólogo, o resultado do estudo é preocupante e mostra que nem sempre é possível confiar na embalagem dos produtos. "Sabemos que existe um controle de qualidade razoável, mas nem sempre ele consegue garantir, totalmente, a ausência de todo o tipo de substâncias tóxicas", conta.

Carlota Aquino, diretora executiva do Idec, considera essa brecha no monitoramento de agrotóxicos em ultraprocessados preocupante. "Muitas pesquisas anteriores e inclusive o próprio programa de monitoramento da Anvisa identificaram agrotóxicos em frutas, legumes e verduras in natura, o que pode induzir o consumidor a pensar que esses alimentos são menos seguros do que os ultraprocessados", diz.

"Nossas pesquisas vêm para expor essa lacuna e para cobrar do governo a realização do monitoramento, a fiscalização e a ampla divulgação dos resultados das testagens de resíduos de agrotóxicos em alimentos, e a expansão das análises para incluir os ultraprocessados", afirma a diretora.

De acordo com o Idec, foram enviadas notificações para todas as empresas responsáveis pelos produtos analisados em que foram encontrados agrotóxicos. Os dados também foram enviados ao Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e comunicados à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), apesar de a agência ter a política de só monitorar a presença dessas substâncias em alimentos in natura.

O que podemos fazer?

O alto uso de agrotóxicos é um problema sério, porém não é o único ponto crítico de nosso sistema alimentar baseado na produção e consumo de ultraprocessados e produtos de origem animal. Segundo o Idec, a expansão insustentável da agricultura, motivada em partes por hábitos alimentares desequilibrados, aumenta a vulnerabilidade humana e dos ecossistemas e tem como consequência a competição por terras e água.

Para Rafael Arantes, coordenador do Programa de Consumo Sustentável do instituto, "é preciso avançar nas discussões em relação à inexistência ou lacuna de regulação sobre o assunto, e, especialmente, buscar que o Estado exerça efetivamente seu papel de monitorar e fiscalizar sobre a presença de agrotóxicos. Esses resultados servirão para dar transparência e demandar ações nos setores da sociedade civil, empresas públicas e privadas, e subsidiar as agências reguladoras".

O colunista de VivaBem sugere que as pessoas passem a questionar mais a origem de cada produto, como quem produziu, de onde vem (cidade, estado) etc. "É questionar mais e entender a procedência do alimento", diz Gabriel.

* Com informações de reportagem publicada em 27/11/2020.