Varíola dos macacos, acne e herpes: é possível diferenciar lesões na pele?
Os casos de varíola dos macacos (monkeypox) têm aumentado exponencialmente no Brasil e no mundo. No país, já são mais de 3.000 casos registrados, segundo última atualização do Ministério da Saúde.
Um dos sintomas da doença, a lesão na pele, virou um ponto de apreensão entre as pessoas e, inclusive, entre os médicos. O motivo é que essa ferida pode mesmo confundir com outras situações corriqueiras nos hospitais, como herpes e sífilis, além de ser muito parecida com uma acne ou espinha —o que tem sido um dos maiores obstáculos em relação à varíola dos macacos, dificultando o trabalho dos especialistas.
"Clinicamente falando, essas lesões lembram herpes, varicela, foliculite e até uma afta. Essa é a grande dificuldade da varíolas dos macacos. Dependemos do exame laboratorial para fechar o diagnóstico", explica Evaldo Stanislau de Araújo, membro da diretoria da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia) e infectologista do Hospital das Clínicas de São Paulo.
O diagnóstico é realizado a partir do exame de PCR (RT-PCR e qPCR), que avalia o material genético das amostras após raspagem do cotonete (swab) nas lesões. O procedimento pode ser doloroso já que é necessário "abrir" as feridas e passar o cotonete no material.
"São técnicas sofisticadas, então, do ponto de vista clínico, é realmente difícil de diagnosticar, principalmente para quem está ali no pronto-socorro", diz Araújo.
Como identificar as lesões
Pensando nisso, VivaBem entrevistou especialistas para mostrar quais são as características da lesão pela varíola dos macacos. Antes, é importante ressaltar que o diagnóstico deve ser feito por um médico e, não, por conta própria.
O mais comum é que as lesões apareçam de forma "linear", em várias etapas (conforme a foto abaixo):
- Região fica avermelhada
- Surgimento de uma lesão
- Formação de líquido dentro, com uma bolha de pus amarelado dentro
- Umbilicação na lesão (furo no meio)
- Desenvolvimento de uma crosta
- Crosta cai e forma cicatriz
Depois disso, as lesões deixam de ser contagiosas, segundo os especialistas. "Geralmente, as pessoas têm de 5 a 10 lesões, principalmente no rosto, tronco, braços e pernas. Isso é o mais frequente", afirma Alexandre Naime Barbosa, professor da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) e vice-presidente da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia). "Já em pacientes imunossuprimidos, por exemplo, estamos vendo mais de 200 lesões. Isso também acontece com crianças ou idosos", explica.
No entanto, os casos novos têm apresentado novas características, segundo o médico. "São lesões em estágios distintos, ou seja, é quando elas aparecem com bolhas em uma região e, em outro lugar, está na fase da vermelhidão. Portanto, agora, neste novo surto, as lesões são assíncronas", diz.
Além disso, os especialistas afirmam que as feridas têm aparecido com maior frequência nas regiões genitais, como pênis, escroto, vulva, ânus e perianal, além da mucosa da boca. Na maioria dos casos, essas lesões são acompanhadas de muito desconforto, segundo Álvaro Costa, infectologista do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
"É principalmente doloroso quando é no genital e no ânus. Na pele também, mas não dói tanto. Essa inflamação no reto, por exemplo, causa bastante dor. Muitos relatam desconforto para evacuar. Tem gente que toma morfina de tanta dor que sente", conta.
Outro ponto levantado pelo médico, além dos outros especialistas ouvidos por VivaBem, é que o paciente pode ou não ter febre. "Às vezes, a pessoa só tem febre após o aparecimento da primeira lesão. Às vezes, a febre vem antes e, então, aparece a lesão", diz, mostrando o desafio que é diagnosticar a varíola dos macacos.
Há ainda outros sintomas da doença como fadiga, dor de cabeça, dores musculares, ou seja, sintomas inespecíficos e semelhantes a um resfriado ou gripe.
Muito além das lesões
Para além de sintomas, o infectologista explica que é todo o histórico do paciente que ajuda neste momento. É descobrir como é o comportamento sexual —independentemente de gênero ou orientação sexual— e se teve contato com pessoas infectadas.
"Os casos se concentram mais na população de homens que fazem sexo com homens, mas a doença já caminha para grupos de mulheres e crianças, ainda que em velocidade mais lenta", afirma Costa.
Para o vice-presidente da SBI, é preciso ir além, é necessário suspeitar de qualquer lesão que tenha as características citadas acima —mesmo se a pessoa em questão não estiver neste "grupo de risco". E ele explica o motivo:
"Às vezes, o vínculo epidemiológico não está muito claro. Isso ocorreu com um bebê que atendemos, com lesões parecidas com monkeypox. Demoraram para fazer essa ligação e ele precisou ser hospitalizado. O teste veio positivo e, depois, conversando com os pais, descobrimos que a criança esteve em uma festa onde uma pessoa —o caso índice (primeiro) deste caso— com a doença a segurou no colo", diz Barbosa.
Por isso, para ele, é fundamental que as pessoas sejam testadas, já que essa é a única maneira de confirmar se o caso é positivo ou não. "Essa lesão suspeita pode ser parecida com acne, herpes simples, herpes-zóster, sífilis. Por isso, qualquer pessoa com uma lesão que tenha essas características —vermelhidão inicial, mácula, vesícula, ferida e crosta— deve ser entendida como suspeita", reforça.
Confusão com outras ISTs
Conforme dito acima, até os médicos citam a dificuldade do diagnóstico clínico, já que as lesões da varíola lembram as de outras doenças, como o herpes e a sífilis. "Mas as lesões do herpes genital, por exemplo, têm uma evolução igual. Ocorre tudo ao mesmo tempo. E a diferenciação é mesmo difícil", afirma Álvaro Costa. Mais uma vez vale lembrar que o diagnóstico é sempre feito em consulta médica.
Outro ponto levantado pelo médico é que muitos pacientes chegam à consulta com mais de uma IST diagnosticada, além da varíola. "Não é nada incomum ocorrer isso", conta. "Usualmente, quando a pessoa tem atividade sexual sem camisinha, ela abre as portas para várias doenças. E temos visto pelo mundo todo que alguns pacientes com monkeypox não usaram preservativos", conclui o infectologista.
E, apesar de não prevenir totalmente a varíola dos macacos, já que sua transmissão se dá principalmente pelo contato direto com as lesões, é essencial usar camisinha durante a relação sexual para evitar outras doenças. Há ainda outras medidas que diminuem os riscos de transmissão do monkeypox; veja abaixo:
- Ficar atento aos sintomas e buscar atendimento médico;
- Evitar o contato próximo com pessoas infectadas ou com suspeita de infecção: nada de toque, beijo ou sexo;
- Limitar o número de parceiros sexuais;
- Evitar compartilhamento de objetos, incluindo roupas de cama e toalhas;
- Não estigmatizar a doença: qualquer pessoa pode contrair o vírus;
- Usar máscaras;
- Cobrir braços e pernas em aglomerações;
- Higienizar as mãos.
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