Dieta da mitocôndria: há algum benefício ou é outra mentira propagada?
Dieta das mitocôndrias, booster ou soro mitocondrial. Esses são alguns dos termos utilizados na internet para defender que é possível fortalecer as mitocôndrias, responsáveis por parte da energia usada pelas células, com a promessa de otimizar o funcionamento do metabolismo, diminuir a fadiga, aumentar a recuperação alimentar e, consequentemente, emagrecer.
Mas a ciência diz o contrário. Não há validação científica ou estudos que comprovem que uma suplementação para otimizar as mitocôndrias funcione e traga benefícios.
Segundo Manuela Dolinsky, diretora do CFN (Conselho Federal de Nutricionistas), as informações propagadas sugerem que a dieta mitocondrial é uma mistura da dieta cetogênica, priorização de alimentos fontes de gorduras vegetais e redução de calorias, combinadas, ainda, com a suplementação de micronutrientes específicos.
"Não há nenhum estudo que defina o que é de fato uma dieta mitocondrial e seus efeitos. Além disso, a ciência da nutrição ainda não tem consenso sobre a validade e os efeitos a longo prazo da dieta cetogênica para o emagrecimento. É um protocolo dietoterápico com validação científica para casos específicos", explica a nutricionista.
Ana Bonassa, doutora em ciências e que realiza pós-doutorado em metabolismo energético no Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo), destaca que minerais como ferro, cobre, magnésio, cálcio, e vitaminas como niacina, riboflavina, tiamina e biotina são reconhecidos como mantenedores do funcionamento correto das mitocôndrias e conseguimos estes compostos a partir da alimentação e hábitos saudáveis.
"Não adianta tomar suplementos destes compostos, pois o excesso é descartado pelo corpo. A boa função da mitocôndria, assim como de todo o corpo humano, deve levar em consideração se a pessoa dorme bem, tem uma alimentação baseada em alimentos minimamente processados, se faz exercício, fuma, ingere bebida alcoólica", explica Bonassa.
Falta de energia ou disfunção mitocondrial?
"Mesmo com dieta, você não emagrece?" "Está se sentindo muito cansado e com falta de energia?" Essas são algumas das perguntas que os vídeos na internet utilizam para apresentar a suplementação de mitocôndrias a partir de um possível diagnóstico de disfunção mitocondrial, um grupo de doenças que são raras na população.
Segundo a Sociedade de Medicina Mitocondrial dos Estados Unidos, o diagnóstico de doenças mitocondriais requer o uso de exames bioquímicos, de imagem, clínico, oftalmológico, biópsia muscular, dentre outros métodos específicos e não apenas análise de sintomas.
"Os nutricionistas não estão nem capacitados e nem legalmente habilitados para analisar e diagnosticar este tipo de doença", reforça Dolinsky, do CFN.
Apesar do cansaço, falta de energia e dificuldade de ver resultado na atividade física serem situações recorrentes, elas não devem ser ligadas a uma alteração da mitocôndria.
O professor Francisco Pitanga, do Instituto de Ciências da Saúde da UFBA (Universidade Federal da Bahia), avalia que cerca de metade das pessoas das capitais brasileiras pratica menos de 150 minutos de atividade física semanal, e que este pode ser o grande motivo por trás da falta de disposição, e que o início de qualquer atividade física também traz as mesmas queixas.
"No início de uma atividade física, é possível que a pessoa sinta dores, muito cansaço ou não veja o efeito do esforço, contudo, respeitando seu limite, criando uma rotina e aumentando o nível de intensidade de forma progressiva, os benefícios aparecerão e o cansaço vai embora", explica Pitanga.
Como surgiu a dieta mitocondrial: o efeito Terry Wahls
Otimizar as mitocôndrias para um melhor funcionamento do organismo não é uma novidade. Há mais de uma década a hipótese foi apresentada por Terry Wahls, em um TEDx sobre sua experiência pessoal com a esclerose múltipla, doença neurodegenerativa.
Frustrada com os tratamentos convencionais, Wahls desenvolveu um protocolo para diminuir as inflamações no corpo e que ajudam o sistema mitocondrial a ter energia. A médica ampliou seu protocolo para outras doenças autoimunes e degenerativas do sistema nervoso. Contudo, não há evidências científicas de que tenha efeito.
Bonassa aponta que há várias críticas em relação ao protocolo, como falta de controle adequado, conclusões não baseadas nos dados obtidos, conflito de interesse, e que o próprio protocolo é disseminado de forma errada na internet.
"O protocolo Wahls não é sobre suplementação apenas, a dieta vem sempre acompanhada de suplementos, alongamentos, exercícios, estimulação elétrica dos músculos, meditação e massagem", explica Bonassa.
Cuidado com os milagres
O CFN endossa que a demanda por uma alimentação mais saudável e o desejo de atender uma estética corporal idealizada têm levado uma quantidade assustadora de informações sobre nutrição de fontes duvidosas, bem como de produtos e dietas alardeados como milagrosos e, por este motivo, é necessário ficar atento às informações propagadas em redes sociais.
"Alimentos, produtos e dietas que ignoram a recomendação de uma alimentação variada e baseada na comida de verdade como fonte de saúde devem ser vistos como preocupantes. Desconfie de postagens e dietas que citam superalimentos e indicam o uso indiscriminado de suplementos", recomenda Dolinsky.
Vale lembrar que, mesmo estando nas prateleiras de farmácias e podendo ser adquiridos sem receita, os suplementos alimentares podem oferecer riscos à saúde se utilizados de maneira inadequada.
Bonassa reforça que os suplementos e soros podem afetar negativamente diversos órgãos como coração, rins, fígado, ossos, e vitaminas e antioxidantes em excesso podem comprometer o funcionamento do corpo.
"Vitamina C e E, n-acetilcisteína e glutationa podem prejudicar processos importantes no corpo, como o sistema imune, a dilatação dos vasos sanguíneos, que é essencial para o bom funcionamento do sistema cardiovascular, e até prejudicar as mitocôndrias. Por isso, qualquer suplementação é recomendada apenas em situações bem específicas e sempre acompanhadas por um profissional sério."
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