Como em 'Terrifier 2': por que alguns passam mal vendo filme de terror?
No começo deste mês, o filme "Terrifier 2" se tornou assunto após relatos de pessoas que passaram mal ao assistir ao longa, nos Estados Unidos. As cenas de violência e repletas de sangue —como uma em que uma mulher é repartida ao meio— fizeram pessoas vomitarem, desmaiarem e até saírem de ambulância do cinema.
Por mais exagerado que pareça, o medo tem esse poder. Ele pode causar aumento de frequência cardíaca, respiração um pouco mais ofegante, olhar vidrado (com dilatação das pupilas), aumento de sudorese, tremor, náuseas, vômitos e até diarreia.
Mas além das reações físicas, há também as psicológicas. A administradora Denise Franceschi, 46, conta que uma série de terror de zumbis impactou sua vida anos atrás. Por semanas, ela teve crise de ansiedade, palpitações e sensação de medo e angústia constante.
"Imaginava situações de como eu reagiria, onde poderia ficar protegida, isolada. E o mais impensável: que armas eu precisava ter para me manter segura. Justo eu, que não consigo tocar em uma", diz.
Segundo Denise, foi traumático e ela não andava pela casa sem as luzes acesas. "Dormia tão encolhida, que acordava com dores no corpo."
O publicitário Rodnei Higa, 39, também teve uma experiência nada boa. Ele, que já não era fã do gênero, resolveu dar uma chance ao filme "Atividade Paranormal", de 2007, e se arrependeu.
"Foi uma situação extremamente tensa. Ao chegar em casa, acendi as luzes de todos os cômodos antes de chegar ao meu quarto. Depois disso, não assisti mais a nenhum título classificado como assustador", diz.
De acordo com Leonardo Morita, psiquiatra da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, é preciso cautela para ter acesso a esse tipo de conteúdo. Isso porque cenas chocantes demais podem impactar negativamente na saúde mental de uma pessoa.
"Conforme o tamanho desse estímulo, isso pode gerar um trauma e esse trauma pode gerar uma fobia. É uma reação orgânica natural que, só pela vivência, vai desencadear, através do sistema nervoso autônomo, algumas mudanças", explica.
Mas por que isso acontece?
Psicólogo do Hospital Universitário Onofre Lopes, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), Rodrigo Costa Oliveira explica que o medo é algo natural e um comportamento desejado.
"O medo é um conjunto de afetos que são naturais do ser humano. Todo ser humano tem medo e precisa ter medo. É também uma instrumentalização evolutiva. Se não fosse o medo, a gente não teria se preservado o suficiente para sobreviver enquanto espécie", diz.
Segundo ele, o que acontece é que existem pessoas mais e menos tolerantes a esse tipo de estímulo. "Depende de como ela é exposta a esse tipo de conteúdo e da intensidade da exposição, se foi no contexto de susto, de curiosidade, de ameaça, pode se configurar em uma situação análoga ao trauma, que pode gerar sequelas ou reações inadequadas e intensificadas", explica.
Hoje com 23 anos, Raphael Santos, animador de eventos e influenciador digital, lembra-se muito bem da primeira vez que sentiu pânico assistindo a um filme que nem de terror era, aos 7 anos.
A experiência foi tão traumática que, passados mais de 15 anos, ele não consegue se desvencilhar do incômodo. "Nunca me atraiu filme de terror. Evito o máximo que puder, mas por insistência de amigos e do meu namorado, acabo cedendo. Quando pego para assistir com eles, fico me distraindo com outras coisas para não focar no filme, porque se começo a focar, fico bem desestruturado. Eu suo frio, fico até meio atordoado. Parece que dá uma caída na pressão", diz.
O que acontece com Raphael —e com todas as pessoas que também têm medo de filmes de terror— é uma ativação de estruturas do cérebro para o estado de alerta e pavor, como explica Fernando Gomes, neurocirurgião e professor livre docente do Hospital das Clínicas de São Paulo.
"As estruturas mais envolvidas nesse processo são as amígdalas cerebrais e o córtex frontal, e também o hipotálamo, provocando emoções como o medo, estado de alerta máximo causado pela expectativa", diz.
Gomes revela que o estado é passageiro, mas, por meio de um jogo progressivo de informações e estímulos sensoriais, a pessoa ainda pode ficar em alerta por um tempo, mesmo depois de o filme ter terminado.
"Assim que uma cena deixa de ocorrer, existe um alívio contrabalanceado pela ativação do sistema nervoso autônomo parassimpático", explica. Enquanto está vivendo a sensação, ainda pode haver minutos de desconforto, mas depois que acaba e começa a viver outras sensações e a ter outras experiências ao longo do dia, essas sensações novas vão ocupando a memória de curto prazo. "Isso vai melhorando e dando espaço aos novos momentos e vivências."
Respeite seu medo (e o dos outros)
Quem não gosta de filme de terror deve, obviamente, evitar assistir a esse tipo de gênero. Respeitar o que se está sentindo, nesse caso, é o que vai fazer a diferença e impedir que o medo se torne trauma.
"Se não quiser assistir, não assiste. A pessoa não deve se violentar nesse processo nem ser submetida a algo que não queira. Ninguém deve se expor a algo para o qual não está disponível, não está interessado, não está preparado, porque aí é violência", diz o psicólogo Rodrigo Costa Oliveira.
A psicóloga Ana Carolina Peroni, 42, é fã de filmes de terror. A última experiência não foi tão boa, mas ela não deve desistir de acompanhar títulos do gênero por conta disso. "A sensação foi de um desconforto muito grande, porque o filme toca em assuntos muito atuais, pertencer a algum grupo, não saber lidar com a frustração, aceitar algumas situações só para não ser mal visto. Fiquei tensa e desconfortável. Mas voltei ao normal no dia seguinte", diz.
Também fã do gênero, Oliveira revela que insistir nesse tipo de conteúdo pode ajudar a superar o medo. "Se a pessoa quer assistir, e assiste colocando a mão nos olhos, isso já é um avanço, já é algo importante. Ela está entrando em contato com esse medo, está enfrentando, está criando recursos naturais, saudáveis e internos para lidar com isso e, aos poucos, está se expondo a essa situação", diz.
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