Depressão resistente: veja seis tratamentos que vão além dos medicamentos
O Brasil é líder em casos depressivos na América Latina e ocupa o segundo lugar nas Américas. No mundo, são mais de 300 milhões de pessoas afetadas, segundo a Opas (Organização Pan-Americana da Saúde), ligada à OMS (Organização Mundial da Saúde).
O transtorno mental multifatorial —causado pela combinação de fatores genéticos, biológicos, ambientais e psicológicos— apresenta gravidade, frequência, duração e sintomas distintos entre as pessoas e representa a principal causa de incapacidade em todo o mundo.
O tratamento para a depressão consiste na combinação entre medicamentos e o acompanhamento psicológico. Entretanto, em alguns casos, o uso das medicações não resulta em melhorias. É a chamada depressão resistente ou refratária.
Quando a depressão não responde aos medicamentos, apresentando-se resistente a três ou quatro medicamentos, existem outras opções de tratamentos. "Muitas delas estão no rol de tratamentos chamado de psiquiatria intervencionista", afirma André Russowsky Brunoni, psiquiatra e coordenador do SIN (Serviço de Neuromodulação Interdisciplinar) do IPq (Instituto de Psiquiatria) do HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
Essas intervenções consistem em técnicas de estimulação cerebral que podem ser invasivas ou não.
Como sei que preciso das intervenções?
O primeiro passo é confirmar a existência do transtorno. "Pode ser outra doença, como hipotireoidismo, tumor cerebral, insuficiência de adrenal (baixa produção de hormônios no córtex das glândulas adrenais), entre outras condições. Até mesmo pode ser um um remédio", explica Brunoni.
Com a confirmação do diagnóstico da depressão, investiga-se o seu subtipo: bipolar, unipolar —chamada também de transtorno depressivo maior—, com ansiedade ou com transtorno de personalidade. Em alguns casos, é efetuada a adequação medicamentosa.
Se a depressão for confirmada e os fármacos estiverem corretos, a terceira etapa consiste em otimizá-los, pois pode ocorrer baixa dosagem ou combinação equivocada.
Por fim, as alternativas intervencionistas são indicadas, dependendo do tipo da condição. "Podem ser usadas desde episódios leves até os graves, tanto em situações agudas quanto crônicas ou recorrentes, em qualquer faixa etária, exceto em crianças e adolescentes, quando se deve usar com bastante cautela", pontua Jales Clemente, psiquiatra especialista em dependência química, sexualidade, eletroconvulsoterapia e casos refratários, de Natal (RN).
Quais são as tecnologias para o tratamento da depressão?
1. Eletroconvulsoterapia (ECT)
Criado na década de 1930, é o procedimento mais eficiente na psiquiatria até hoje. Os efeitos costumam ser mais rápidos comparados aos antidepressivos. Há relatos de alívio dos sintomas em menos de uma semana.
"É indicado quando não houve resposta com o uso de antidepressivos e em casos graves, como risco suicida, depressão na gestante e com sintomas psicóticos (alucinações e delírios)", lista Mikkael Duarte dos Santos, psiquiatra e professor da Faculdade de Medicina da UFC (Universidade Federal do Ceará) e da Uninta (Centro Universitário Inta).
São necessárias sedação e anestesia para a indução de uma crise convulsiva, por meio de pequenas correntes elétricas para o cérebro. Eventualmente, podem ocorrer déficits de memória de longo prazo.
Apesar dos resultados comprovados, ainda existe estigma, devido ao uso em manicômios, sem critérios técnicos, entre outras práticas, nas décadas passadas.
2. Estimulação magnética transcraniana (EMT)
É uma técnica não invasiva e com boa eficácia que emprega campos magnéticos para estimular as células nervosas em regiões específicas do cérebro. Entre as vantagens, a pessoa permanece acordada, sem sedação e sem anestesia.
"É menos complexa em relação à ECT, já que a aplicação não depende de ambiente especializado e pode ser realizada em clínica, com resposta, geralmente, em quatro semanas", informam Alexandre Guerreiro e Sérgio Semeraro Jordy, neurologistas da Rede D'OR e do Centro Médico Sinapse, de São Paulo (SP).
A desvantagem é a necessidade de se deslocar para execução do procedimento todos os dias.
"A estimulação magnética transcraniana começou a ser aplicada em pessoas na década de 1990. No Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) registrou o primeiro aparelho de EMT em 2007, mas apenas em 2012 o CFM (Conselho Federal de Medicina) regulamentou o procedimento", pontua Clemente.
3. Magnetoconvulsoterapia ou terapia de convulsão magnética (MST)
A técnica também induz uma crise convulsiva por meio de campos magnéticos. Entre as vantagens está a ausência de efeitos colaterais na memória.
O IPq (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas, em São Paulo (SP), está realizando estudo para verificar se ela tão eficaz quanto à eletroconvulsoterapia. O instituto está recrutando voluntários para essa pesquisa. Mais informações no site www.sin.org.br
4. Estimulação transcraniana por corrente contínua (ETCC)
Não invasiva, a técnica consiste na estimulação transcraniana por corrente contínua aplicada, usando eletrodos colocados sobre o couro cabeludo.
É uma intervenção segura e tolerável, usada na terapêutica do transtorno depressivo maior. Mas no Brasil os estudos ainda estão em fase de finalização.
5. Estimulação do nervo vago (VNS)
É uma alternativa ainda não executada no Brasil e consiste em colocar um marcapasso conectado ao nervo vago, estimulando-o.
Existem diversos ensaios clínicos sobre estimulação do nervo vago na depressão unipolar e bipolar que demonstram sua eficácia, como um de 2017, que apresentou taxas de resposta de 67,6%.
6. Estimulação cerebral profunda (ECP)
Esse procedimento invasivo envolve a implantação de um ou mais eletrodos no cérebro. Os eletrodos são conectados a um gerador de pulso sob a pele. Como requer cirurgia, tem mais riscos do que as técnicas não invasivas. É uma neurocirurgia promissora, segundo o psiquiatra André Russowsky Brunoni, mas ainda experimental.
Acesso às alternativas é restrito
Esses tratamentos não estão disponíveis pelo SUS (Sistema Único de Saúde), com exceção da ECT, que é feita em poucos centros no Brasil.
Além disso, essas tecnologias, apesar de comprovada eficácia de algumas, ainda têm dificuldade de serem incluídas no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde).
"As pessoas que sofrem de depressão e precisam desses tratamentos sofrem não só com a doença como também com a dificuldade de acesso. Até hoje, por exemplo, nem a ECT nem a EMT conseguiram ser implementadas no rol de procedimentos obrigatórios da ANS, sendo necessário o usuário de plano de saúde abrir processo judicial", comenta o psiquiatra Jales Clemente.
Fontes: Alexandre Guerreiro, neurologista da Rede D'OR e do Centro Médico Sinapse, de São Paulo (SP); André Russowsky Brunoni, psiquiatra e coordenador do SIN (Serviço de Neuromodulação Interdisciplinar) do IPq (Instituto de Psiquiatria) do HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo); Jales Clemente, psiquiatra pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), especialista em dependência química, sexualidade, eletroconvulsoterapia e casos refratários, de Natal (RN); Mikkael Duarte dos Santos, psiquiatra e professor da Faculdade de Medicina da UFC (Universidade Federal do Ceará) e da Uninta (Centro Universitário Inta); Sérgio Semeraro Jordy, neurologista da Rede D'OR e do Centro Médico Sinapse, de São Paulo (SP).
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.