Por que tem pais e filhos que estão sempre competindo entre si?
Se Mauricio Nascimento, 35, e seu pai Jorge, 65, ambos de São Paulo (SP), fossem figuras mitológicas, provavelmente seriam, até pouco tempo, os gregos Édipo e Laio. A boa notícia é que não tiveram o mesmo desfecho trágico —Édipo matou Laio, que era seu pai, tomando seu lugar como rei e desposando sua viúva, no caso, sua mãe.
"Quando eu era garoto, por volta dos quatro anos, comecei a ter muito ciúmes do meu pai com minha mãe. Se visse os dois juntos abraçados, separava-os imediatamente. Batia nele quando dormia, sujava suas roupas e ele ficava com muita raiva de mim. Quando minha irmã nasceu, ele se apegou muito mais a ela, então não cresci muito próximo dele", diz Mauricio.
Freud usou justamente o mito de Édipo para explicar esse conflito entre pais e filhos. Segundo Eduardo Perin, psiquiatra pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o criador da psicanálise se apropriou da história para formular sua teoria de que o desenvolvimento sexual infantil começa a partir do momento em que o menino, entre os 3 e 5 anos, formula um desejo incestuoso pela mãe, mas é impedido pela figura paterna, que acaba odiada por essa disputa.
Perin continua que passada essa fase, do chamado complexo de Édipo, o menino, segundo a teoria freudiana, então teria duas alternativas. Na primeira, deixaria espontaneamente de perceber o pai como um obstáculo e se identificaria com ele, imitando seus comportamentos com o objetivo de desenvolver habilidades para o futuro e estruturar sua personalidade.
Mas se tal identificação não ocorresse, os conflitos típicos do complexo de Édipo poderiam ser estendidos até a maioridade. A psicanálise considera ainda casos em que o pai também não consegue se colocar no lugar do filho, apenas se enxerga e deposita nele suas frustrações, em especial quando não tem seus desejos correspondidos ou por ter crescido em um lar abusivo.
Maurício explica que seu pai queria que ele estudasse direito, um sonho que Jorge não realizou por falta de estudo, recursos e incentivo da família. "Falei que não, mas por pressão do meu pai, que me ajudava e queria que eu trabalhasse com ele, optei pela administração. Mas depois a gente brigava tanto, por ter visões diferentes, que quase não nos falávamos", diz.
Narcisismo, imaturidade e dependência
Outras questões a serem consideradas quando uma relação entre pai e filho é conflituosa demais é o narcisismo ou a imaturidade do pai, ou a dependência do filho, aponta Wimer Bottura, psiquiatra especialista em psiquiatria infantil pelo IPq/HCFMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
"Infelizmente acontece com frequência, em todas as combinações, principalmente do genitor com o filho do mesmo sexo. Podemos citar como as mais comuns a competição pela beleza (mais prevalente entre as mulheres) ou pelo sucesso, seja social ou econômico e, quando se trata dos narcisistas, não admitem que o problema se inicia com eles", continua o médico.
Quando evolui para transtorno, provocações nesse tipo de relação são comuns, para se criar situações de vitimização. Se não ocorrem, o narcisista parte para o ataque, para evidenciar sua percepção de grandeza ou de sabedoria, nunca admitindo que o oponente esteja à altura. O filho pode ser visto como posse, que pode ser exposta, ter vontades e privacidade anuladas.
Trate mágoas o quanto antes
A maioria das desavenças entre pais e filhos, independentemente de gênero, podem ser resolvidas com psicoterapia, afirma Joeuder Lima, doutorando em psicologia pelo IESLA (Instituto de Educação Superior Latino-Americano), em Palmas (TO), com uma ressalva em se tratando de narcisistas patológicos, pois dificilmente admitem que precisam de alguma ajuda.
Não foi o caso do pai de Mauricio. "Quando ele fez 55 anos, minha madrinha, vendo que nos adiávamos por tudo, nos presenteou com um retiro de reeducação psicoemocional. A princípio não queríamos, mas fizemos e percebemos como nossos ressentimentos e a falta de perdão eram os problemas. São 'vícios' que exigem ser superados, para recomeçar", diz Mauricio.
E esse exercício não é exclusivo a adultos, acrescenta Lima. "Na infância e adolescência também, mas pouco adianta terapia se o genitor não reconhecer que requer participar. Com a orientação familiar, o que inclui não agir com imposição, às vezes nem é necessário tratar o menor, que pode apenas estar reagindo às condições de uma pressão psicológica", diz.
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