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Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Ele comeu açaí e acordou delirando, e então descobriu diabetes tipo 1

Guilherme passou a ter vida mais saudável após o diagnóstico de diabetes aos 13 anos - Arquivo pessoal
Guilherme passou a ter vida mais saudável após o diagnóstico de diabetes aos 13 anos Imagem: Arquivo pessoal

Janaína Silva

Colaboração para VivaBem

20/11/2022 04h00Atualizada em 21/11/2022 15h25

Guilherme Giuliano Rodrigues Gonçalves Costa, 16, ficou três dias em coma após tomar insulina pela primeira vez, aos 13 anos. Hoje, após 3 anos, convive bem com a condição e afirma ser mais saudável do que era antes do diagnóstico de diabetes tipo 1 —que representa, aproximadamente, 10% dos casos de diabetes no mundo. Em geral, acomete pessoas mais jovens, com uma evolução mais rápida e necessidade de uso de insulina.

No início de 2020, ele passou por uma cirurgia dentária para a retirada dos caninos de leite que impossibilitavam o crescimento dos permanentes. "A cicatrização foi ótima, os pontos caíram, não houve nenhum problema. Acredito que até aquele momento eu não tinha diabetes."

Depois disso, ele recorda que começou a ter alguns sintomas. Sem casos de diabetes na família, não houve desconfiança de que pudesse ser algo grave relativo a alguma doença. Uma noite, após tomar açaí com leite condensado, passou mal e acordou delirando. Abaixo, ele conta sua história:

"Passei a sentir muito cansaço, impossível de controlar, e chegava a dormir a tarde inteira. Além disso, tinha muita sede. Lembro que bebi 4 litros de água em uma noite. Mas a sede excessiva também não foi notada porque já tomava muito líquido. Até as idas constantes ao banheiro eram consideradas normais, por conta da ingestão de água.

As aulas teriam início em breve e resolvi pesquisar na internet alimentos que dessem energia. Tomei açaí umas três vezes, inclusive na noite anterior ao dia em que acordei ofegante, sem conseguir respirar direito, delirando e com dor abdominal.

Meus pais me levaram a um posto de saúde e lá desconfiaram de que pudesse ser apendicite. A ambulância foi chamada com urgência, pois a cirurgia teria que ser feita o quanto antes, mas faltava o teste de glicemia. No primeiro, apareceu no aparelho HI —indicando que não foi possível fazer a medição—, acreditaram que fosse falha no equipamento; refizeram e novamente não foi possível obter o resultado.

Na terceira vez, em outro medidor, a glicemia estava em 584; a chamada cetoacidose —quando os níveis de açúcar do sangue estão muito altos devido à falta de insulina no organismo.

Foi aí que tomei pela primeira vez insulina, entrei em coma e acordei 3 dias depois aos poucos. Ainda não estava bem, a glicemia permanecia alta nesses primeiros dias, nos quais comecei a descobrir o que é o diabetes. A internação durou 21 dias.

Novos hábitos alimentares e atividade física

Apesar do diabetes, tenho uma vida mais saudável, diferentemente do que muitos pensam. Minha alimentação não era variada. Consumia sempre as mesmas coisas: arroz, feijão, carne moída, linguiça ou filé de frango. Frutas, só morango.

Depois, passei a comer alimentos mais saudáveis, inclusive carne —antes era apenas moída, mesmo. Pratico atividade física também, ficava muito em casa e brincava só na escola.

Quando ainda me adaptava às novas rotinas, sempre ficava muito preocupado com medo de comer qualquer coisa que tivesse açúcar e pudesse passar mal e ser internado novamente.

Com o tempo, entendi a contagem de carboidratos para aplicar a dose de insulina de acordo com a porção do que eu irei ingerir. Durante a internação, minha mãe tomou conhecimento da ADJ Diabetes Brasil e foi lá que obtivesse mais informações e que me ajudaram a mudar a percepção sobre assuntos como esse, por meio de programas educacionais, grupos de apoio e consultas.

Hoje em dia, não tenho mais tanto medo. Eu controlo. Não como mais a mesma quantidade que gostaria, mas não me afeta em nada. Minha família também se adaptou bastante. No início, era algo novo e acreditávamos que bastava não ingerir doces. Mas, assim como eu, todos aprenderam e a alimentação mudou aqui em casa, melhorando a saúde da família toda.

Minha dieta inclui frutas, arroz, feijão e proteína. Como pipoca todos os dias. No máximo, uma vez por mês, como algo de que gosto não tão saudável, como donuts, que eu adoro.

Se eu for a um restaurante e a sobremesa for boa, eu vou comer, normalmente. A única alteração será a dosagem de insulina que irei ajustar.

No início, usava insulina apenas quando minha glicemia estava alta. Hoje, não é mais assim, aplico sempre 15 minutos antes das refeições.

A glicemia é medida regularmente. São em média seis medições diárias: no café da manhã, no almoço, lanche da tarde, janta, na hora de dormir e, porventura, se passo mal.

Quando vou comer alguma coisa com muito açúcar, aplico mais insulina do que normalmente. Além disso, se ao medir a glicemia ela estiver mais alta, preciso de mais insulina para diminuir a concentração de açúcar no sangue. Quando está baixa, preciso de menos insulina para que a taxa suba.

Se fizer muito exercício, tenho que injetar menos insulina porque meu organismo está gastando mais energia. Por isso, é muito importante fazer acompanhamento com um endocrinologista, pois a dosagem de insulina depende da idade, do peso e da altura. Há também indicações de uso como a insulina de absorção rápida ou lenta.

Aprendi a aplicar a insulina ainda durante a internação no hospital. Na primeira vez, coloquei a agulha, mas fiquei com medo e, em vez de pressionar o embolo, tirei sem injetar a insulina. Hoje, uso a caneta de insulina e em locais diferentes do corpo para não causar lipodistrofia, que é acumular insulina debaixo da gordura da pele e não ser absorvida.

Passo mal em duas situações, ao calcular a insulina para consumir algo e não comer. Por exemplo, no caso da pipoca, apliquei para uma porção e comi menos. Ocorre também quando a glicemia está estável, mas faço muita atividade física, e daí ela cai.

Nessas horas, é importante tomar ou comer algo que seja absorvido facilmente, como uma bala que dissolve rápido, um torrão de açúcar, mas é sempre melhor que seja líquido como água com açúcar, um refrigerante ou mesmo um suco. Eu tenho sempre mel em embalagens do tipo sachê na mochila.

Às vezes, as pessoas não entendem que posso comer doce; é uma questão de ajuste e controle. Mas não é raro ouvir algo do tipo: 'depois não sabe porque passa mal'."

O diabetes tipo 1

O diabetes tipo 1 é uma condição autoimune, na qual ocorre a destruição das células do pâncreas que, naturalmente, produzem insulina. Até o momento, segundo Ronaldo José Pineda Wieselberg, médico endocrinologista e vice-presidente da ADJ Diabetes Brasil, não há forma de prevenção.

"O tipo mais perigoso é aquele que não recebe o cuidado correto. Com acompanhamento médico, alimentação e atividade física adequadas, o diabetes não é uma sentença, e pode inclusive levar a pessoa a ter uma vida ainda mais saudável", explica o médico.

Carboidratos - iStock - iStock
Imagem: iStock

Contagem de carboidratos? No caso do diabetes tipo 1, por não existir a produção de insulina pelo próprio organismo, é preciso repor essa substância da forma mais parecida possível com o que o organismo faria.

Wieselberg explica que, em situações fisiológicas, o organismo produziria mais insulina conforme a pessoa comesse mais, e também produziria mais insulina caso a glicose no sangue aumentasse.

Dessa forma, a pessoa que tem diabetes e usa insulina —independente do tipo— precisa aferir a glicemia antes de comer, de forma a aumentar a dose se a taxa estiver mais alta e também adequá-la de acordo com o que vai degustar. Chamada de contagem de carboidratos, essa terapia permite uma melhor qualidade de vida bem como um manejo mais eficaz da glicose. "É o pâncreas em sua versão manual", exemplifica o endocrinologista.

Medição de glicemia em criança, pai mede glicemia em filho - iStock - iStock
Imagem: iStock

Anote os sinais de alerta. Apesar de terem causas diferentes, os sinais e sintomas do diabetes tipo 1 (autoimune) e do tipo 2 (multifatorial) são bastante semelhantes.

A pessoa que tem taxa de açúcar no sangue acima de 180mg/dl começa a eliminar o excesso dela na urina. Ao urinar mais, a pessoa desidrata e, por isso, sente muita sede.

"A sede excessiva é um sinal, porém, não é muito sensível. As pessoas passam a sentir sede justamente porque têm menos água no organismo. Uma indicação de que ela pode indicar diabetes é avaliar se mesmo após beber muito líquido a pessoa continua com a sensação de sede", orienta o endocrinologista da ADJ.

Além disso, como a glicose se acumula no sangue, e não dentro da célula, onde deveria estar, o organismo sinaliza que precisa de energia e há um aumento da fome. Pode ocorrer também perda de peso de forma não saudável, pois o organismo usa outras fontes energéticas, como as proteínas dos músculos.

Em relação ao consumo de doces, eles não são o único problema, ao contrário do que diz a crença popular, mas também os carboidratos, presentes nas farinhas, massas, pães e frutas, que são ricas em frutose (açúcar da fruta). "É possível planejar a alimentação para que, de vez em quando, se possa ingerir algum doce, por exemplo uma fatia de bolo em uma festa de aniversário", afirma Wieselberg.

Vale ressaltar que nenhum alimento sozinho causa diabetes, seja ele doce —como o açaí com leite condensado— ou não. No caso de Guilherme, que tem diabetes tipo 1, é uma condição autoimune, e a causa não foi o açaí, ele apenas foi a gota d'água que o fez passar mal e proporcionou uma investigação para que se descobrisse o diagnóstico.