'Parecia uma faca sendo torcida': com muita dor, artrite a deixou sem andar
Cissa Sabbag, 54, consultora comercial, foi a mais de 20 médicos para tentar descobrir por que sentia tantas dores nas articulações. Ela ficou um tempo sem conseguir andar e até mesmo fazer tarefas cotidianas, como lavar o cabelo sozinha, e vivia no hospital tomando morfina. Foi só depois de cinco anos que ela recebeu o diagnóstico de artrite reumatoide e iniciou o tratamento que lhe garantiu mais qualidade de vida.
"Lá em 2011/2012, comecei a sentir algumas dores pelo corpo. Ia ao médico, tomava um analgésico e depois passava. Mas foi em 2014 que as dores voltaram com muita força. Eram dores articulares e a sensação era como se alguém enfiasse uma faca na articulação e torcesse. Eram insuportáveis e muito fortes, principalmente nos punhos, dedos, cotovelos, ombros, quadril, joelho e tornozelos.
De início, busquei um ortopedista, pois as dores eram mais concentradas nos joelhos, tornozelos e dedos dos pés. E assim começou a saga de descobrir o que eu tinha... Fui a clínico geral, médicos da dor e foi um deles que me indicou um reumatologista.
Desde então cheguei a ir a 15 reumatos diferentes. Cada um deles me dava um diagnóstico diferente, cheguei a ouvir que minhas dores eram psicológicas e até que devia buscar uma igreja para 'tirar o demônio' de mim.
Um deles chegou a me encaminhar para um oncologista alegando que o meu caso era de câncer nos ossos. Esse médico chegou até a me dar um tempo de vida: 3 meses.
Mas sempre soube que minhas dores eram reais e não sou a pessoa de ficar sentada sem fazer nada e sentindo dor. A esse ponto já não ia para as consultas andando, tinha crises tão fortes que não aguentava nem que encostassem em mim. Fora que precisava do meu marido e dos meus filhos para me ajudar a comer, tomar banho e me vestir.
Acordava travada e vivia internada, precisava tomar morfina. Passava mais tempo no hospital do que em casa, pois toda vez que ia para lá ficava, no mínimo, uma semana. Minha família estava desesperada e o que mais trazia angústia era seguir sem um diagnóstico.
Hoje, sei que naquela época estava com todas as articulações inflamadas e, por isso, essa dor extrema que deixou inclusive minhas mãos tortas.
Foi só em 2018 que encontrei o meu médico atual na internet. Estava pesquisando sobre dor sem causa aparente e apareceu um vídeo dele. Muito do que ele disse bateu com o que eu estava sentindo e resolvi agendar. Meu marido achava que ia ser só mais um, já que tínhamos ido a tantos especialistas sem sucesso. Mas nunca pensei em desistir.
Fui para a consulta com uma sacola grande e cheia de exames, como raio-X, ressonância, ultrassom. Ele viu tudo, me examinou e pediu exames complementares com urgência. Logo no retorno ele me deu o diagnóstico: artrite reumatoide.
Eu sorria e chorava ao mesmo tempo e ele não entendeu nada, mas a verdade é que agora sabia o que tinha e contra o que precisava lutar.
Ele me explicou o tratamento, disse que não era de um dia para o outro, mas que, com o tempo, pararia de sentir essas dores terríveis. Comecei com os injetáveis e depois passei para os biológicos. Em um ano, minha vida já tinha voltado 80% ao normal e o médico começou a falar de remissão. Foi uma felicidade, nem meu médico esperava que fosse tão rápido.
Claro que, além do tratamento medicamentoso, também sigo uma rotina regrada de alimentação e atividade física. Meu nutricionista retirou todos os alimentos que podem causar inflamação da dieta. Claro que às vezes queria comer um chocolate, mas vontade dá e passa! O mais importante é a minha qualidade de vida.
Também retomei a atividade física, que tinha parado por conta das dores. Estava super encurtada, nem conseguia esticar minhas pernas. Comecei a musculação e voltei com todos os movimentos e hoje não tenho deformações.
Os primeiros meses foram terríveis, mas com insistência comecei a gostar e encarar como um remédio. Aquela pílula que você precisa tomar todo dia, mesmo que não queira.
Durante a pandemia, acabei perdendo a compensação da doença e as dores voltaram, mas como faço acompanhamento constante, readequamos o tratamento e, em breve, espero ter boas notícias de que estou em remissão novamente.
A artrite reumatoide é uma doença difícil, que impacta nos seus movimentos, na sua autoestima e na saúde mental, mas por ser uma doença invisível, as pessoas não entendem isso, acham que é frescura. Isso faz com que seja muito fácil se entregar, mas é com o apoio da família que conseguimos seguir em frente. No entanto, mesmo com todos te apoiando, a única pessoa que pode te levantar, de fato, é você mesmo!
Sempre digo que quero viver até os 100 anos sem usar bengala e é por isso que treino e me alimento da melhor forma possível.
Hoje me levanto de manhã sem dor, consigo lavar meu cabelo. São coisas simples, mas quando a gente perde, vê o real valor que tem nisso."
Mitos e verdades sobre artrite reumatoide
A artrite reumatoide é uma doença autoimune, ou seja, o corpo começa a produzir anticorpos contra diversos tecidos e células do próprio corpo, em especial as articulações. "Isso gera um processo destrutivo na própria articulação, na cartilagem e nos ossos", fala Thiago Ferreira da Silva, reumatologista e doutor em ciências pela FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
A doença não tem uma causa definida e o principal sintoma são dores articulares, que ficam pior na parte da manhã. "Quando a pessoa acorda ela sente as 'juntas' rígidas e travadas pela manhã, pelo menos por uns 30 minutos. Essa rigidez acomete principalmente as mãos e os pés, que são articulações menores no nosso corpo. Além disso, também é comum fadiga e sensação de indisposição", explica. Conheça abaixo alguns mitos e verdades sobre a doença:
1 - Ter dor é normal
Mito. Silva explica que é importante entender a diferença entre dor mecânica e dor inflamatória. Segundo o especialista, a dor mecânica é a mais comum, que todos nós já sentimos uma vez na vida e ela piora com o exercício e melhora com o repouso. Já a inflamatória, que os pacientes com artrite sentem, melhora com o exercício e piora com o repouso. "Qualquer dor que persista por mais de três meses é considerada crônica e, independente da característica da dor, é importante buscar um especialista", afirma o reumatologista.
2 - A artrite reumatoide só impacta os idosos
Mito. Existe essa percepção que a doença só impacta os idosos, pois o reumatologista, médico que trata a condição, também é associado a população dessa faixa etária. No entanto, os primeiros sintomas da doença aparecem bem antes da velhice, por volta dos 35/40 anos. "O que acontece é que nos pacientes mais idosos a característica da dor pode ser confundida com outros processos do envelhecimento, como artrose e outras doenças reumáticas. Mas a artrite impacta os pacientes independente de idade", explica Silva.
3 - A artrite reumatoide ataca apenas as "juntas"
Mito. Como é uma doença inflamatória sistêmica, ou seja, que não impacta apenas um órgão ou região do corpo. Por ser uma doença autoimune e outras doenças desse tipo também serem desencadeadas pelo mesmo mecanismo é frequente que o paciente com artrite também possa ter tireoidite de Hashimoto, por exemplo. Outra complicação comum, além do impacto nas articulações e ossos, é o aumento de predisposição de doenças que estão relacionadas a deposição de placas de gordura (colesterol) nos vasos sanguíneos. "Há um risco muito elevado de ter um infarto ou derrame, além de outras doenças como diabetes, osteoporose e até demência", explica o reumatologista.
4 - A artrite reumatoide impacta na saúde mental dos pacientes
Verdade. Por conta das dores, muitos pacientes se afastam das atividades sociais e profissionais, além de interromper a prática de esporte e outras atividades do dia a dia. Isso pode contribuir para o aparecimento de doenças mentais, como a ansiedade e depressão. Por isso, Silva destaca a importância de um cuidado multidisciplinar do paciente reumático, com grande atenção à saúde mental, até para garantir a adesão ao tratamento.
5 - A artrite reumatoide não tem cura
Verdade. De fato, a artrite não tem cura, assim como o diabetes ou a pressão alta. No entanto, é possível ter uma boa qualidade de vida com os tratamentos disponíveis. Atualmente, há duas opções de medicamentos: os sintéticos, que são a primeira escolha dos especialistas, e os biológicos, que são utilizados caso haja falha com os sintéticos. Segundo Silva, muitas vezes os tratamentos são complementares. Enquanto os sintéticos são drogas orais, os biológicos são medicamentos mais modernos e a administração é feita por via intravenosa ou subcutânea. "Há uma série de opções de medicamentos disponíveis e acessíveis no SUS, mas o importante mesmo é que o tratamento prescrito seja individualizado de acordo com o caso do paciente", explica Silva.
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