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Haja coração! Por que risco de infarto cresce durante a Copa do Mundo?

Torcedores do Brasil cantam durante a partida entre Brasil e Suíça pela Copa do Mundo do Qatar - Maddie Meyer - FIFA / Colaborador
Torcedores do Brasil cantam durante a partida entre Brasil e Suíça pela Copa do Mundo do Qatar Imagem: Maddie Meyer - FIFA / Colaborador

Isabella Abreu

Colaboração para o VivaBem

02/12/2022 04h00Atualizada em 02/12/2022 15h20

A Copa do Mundo começou e já contagiou os brasileiros, que estão cheios de esperança pelo hexa. Mas antes de sair gritando por aí, saiba que é preciso ter atenção ao seu coração: por ser um evento que causa tanta paixão e suscita fortes emoções, pode trazer consequências sérias para a saúde do órgão.

Leandro Echenique, cardiologista e assessor científico da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo), relembra a morte do comediante Cláudio Besserman Viana, o Bussunda, durante a Copa da Alemanha, em 2006. Ele sofreu um infarto entre o primeiro e o segundo jogo do Brasil, em Munique.

"A gente jogou uma pelada, ele se sentiu mal e pediu para parar. No dia seguinte, deu a parada cardíaca", disse Cláudio Manoel ao UOL, em uma entrevista de 2014. "Eu sempre falei isso. Ele foi um pouco vítima da Copa, no sentido da paixão dele, porque passou mal a noite toda. Eu falei 'vamos chamar um médico', e ele disse 'não vou perder a Copa por causa de bobagem'. Ele não queria perder a Copa de jeito nenhum", disse.

Ainda que não seja possível afirmar se a tensão do torneio foi decisiva para a fatalidade, o médico destaca que Bussunda estava com excesso de peso e de gordura abdominal, e tinha fatores de risco cardíacos genéticos —seus pais tinham uma doença coronariana. Aliada a esses fatores, a ansiedade do campeonato pode ter sido um gatilho. "O fato é que as emoções das competições tendem a dar uma 'ajudinha' negativa para quem se envolve emocionalmente além dos limites e tem propensão às doenças cardiovasculares", diz Echenique.

Um estudo publicado em 2008 no periódico The New England Journal of Medicine avaliou os eventos cardiovasculares sofridos por moradores de Munique durante a Copa de 2006 e constatou que a incidência de emergências cardíacas no período foi 2,66 vezes maior do que em outras épocas. No caso específico dos homens, o risco de ter um evento cardíaco mais do que triplicou.

A pesquisa também mostrou que o número de internações hospitalares por infarto foi 3,7% superior na Copa da Alemanha em comparação com o mesmo período no ano anterior. É citado ainda o número de mortes em decorrência de problemas cardíacos: nas primeiras fases da competição, a mortalidade por patologias do coração subiu de 7,9% para 9,3% e, nas etapas finais, esse percentual subiu para 12%.

Um trabalho desenvolvido pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto e publicado em 2013 corrobora com os resultados anteriores, mostrando que o índice de infartados nessas ocasiões cresce em até 8%.

A apuração contou com o banco de dados do SUS (Sistema Único de Saúde), selecionando casos atendidos em todos os prontos-socorros do país e que sugeriam suspeita de infarto. O levantamento foi feito entre os meses de maio e julho de 1998 a 2010, abarcando quatro Copas do Mundo: França, Coreia do Sul e Japão, Alemanha e África do Sul.

"Assim, a Copa do Mundo pode ser para muitos um evento estressante, e pode se relacionar a eventos cardíacos agudos. Tendo em vista esse risco potencialmente maior, particularmente em homens com doença cardíaca conhecida, medidas de cuidado são recomendadas", alerta João Fernando Monteiro Ferreira
presidente do Conselho Administrativo da SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia).

Ciente dessas estatísticas, a advogada Marisa Fernandes, 46, preocupa-se com o pai, Olinto, de 78 anos. "Ele é hipertenso e sempre passa mal por conta do nervosismo. Então nem o deixamos perto da TV. Ele fica no quarto assistindo a um filme e só contamos o resultado depois", afirma.

Torcedor do Brasil antes da partida contra a Suíça na Copa do Mundo - Matthias Hangst/Getty Images - Matthias Hangst/Getty Images
Torcedor do Brasil antes da partida contra a Suíça na Copa do Mundo
Imagem: Matthias Hangst/Getty Images

Fique de olho nos sinais de alerta

Durante as partidas, podemos sentir várias alterações ocasionadas pela ansiedade e excitação. Mas como saber se o que estamos sentindo é algo normal do momento ou uma doença de consequências graves?

Gilberto Ururahy, médico pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e diretor da Med Rio Check-up, explica que a ansiedade é uma condição que mexe com o corpo como um todo: taquicardia, elevação da pressão arterial, sudorese, e pode gerar medo, estresse, entre outras alterações.

"São respostas normais. No entanto, se em algum momento o indivíduo apresentar palidez, dor de cabeça, aperto no peito, alterações de sua dinâmica normal, respiração superficial, desmaio, é preciso buscar ajuda", ressalta. Para isso, procure um serviço de emergência imediatamente, ligando para o 192 ou dirigindo-se a um hospital.

"Um paciente com cardiopatia descompensada ou que saiba ter doença cardíaca grave deve evitar esses gatilhos, incluindo emoções extremas. Também é importante o reconhecimento de um evento cardíaco agudo, como o início súbito de dor no peito, falta de ar ou percepção de alteração das batidas do coração e que devem levar a imediata procura por um serviço de emergência", afirma Ferreira, da SBC.

140 batimentos cardíacos por minuto

A ação do Hcor monitorou 30 torcedores que assistiam às disputas de seus clubes. A análise mostrou que, em momentos de grande emoção, o coração acelerou. "Quando um gol foi marcado, por exemplo, registramos quase 140 batimentos por minuto (bpm), um aumento de 75%, se comparado à média de um adulto em repouso, que é em torno de 80", explica César Jardim, cardiologista do Hcor.

Essa alta se dá devido à descarga de adrenalina que acontece após uma situação inusitada, exitosa ou estressante. "Em pessoas saudáveis, esses episódios esporádicos não causam nenhum dano. No entanto, aquelas que apresentam alguma alteração no coração podem sofrer com uma crise de arritmia, falta de ar, dor no peito ou até infartar. Como grande parte das doenças cardíacas e dos fatores de risco não apresentam sintomas, é muito importante estar com o check-up em dia, sendo ou não um amante de futebol", reforça.

Além das situações estressantes, como os jogos de futebol, outros fatores também influenciam na variação da frequência cardíaca, como o uso de algumas medicações ou de substâncias consideradas estimulantes, o condicionamento da pessoa, a própria predisposição de cada um e até mesmo a idade.

O ideal é que os batimentos se mantenham mais baixos, pois isso faz com que a oferta e o consumo de oxigênio pelo músculo cardíaco se mantenham em equilíbrio e previne danos ao órgão.

Preparação para torcer

Os cuidados nos dias de jogos precisam ser redobrados para as pessoas que têm diabetes, hipertensão arterial, colesterol elevado, obesidade ou que são sedentárias. A seguir, algumas dicas do HCor:

  • Caso esteja fazendo algum tratamento, não assista aos jogos sozinho. Se possível, assista em casa, em um ambiente mais tranquilo, com um grupo pequeno de pessoas;
  • Não se esqueça de tomar a medicação regularmente e consulte o seu médico para tirar dúvidas, saber se deve antecipar algum dos remédios para antes dos jogos e se há necessidade de tomar um tranquilizante;
  • Evite o consumo exagerado de bebidas alcoólicas. Duas taças de vinho ou duas latas de cerveja são quantidades razoáveis, desde que seu médico não tenha restringido totalmente por alguma razão clínica;
  • Evite consumir café e refrigerantes em excesso, principalmente aqueles que têm muita cafeína e adoçantes;
  • Mantenha uma alimentação leve ao longo do dia, evitando petiscos com excesso de sal. Muita atenção aos salgadinhos, à batata frita e aos amendoins;
  • Caso seja muito ansioso, explosivo ou daqueles que perdem fácil o controle, tome uma medida radical: deixe o jogo de lado e procure se distrair com outras atividades.