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Ancestralidade africana pode amenizar risco genético do Alzheimer; entenda

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Imagem: iStock

Do Jornal da USP

10/12/2022 11h04

A doença de Alzheimer é o tipo mais comum de demência, síndrome caracterizada pela deterioração progressiva das funções cognitivas, que causa problemas na memória, atividades funcionais, pensamento e comportamento, e é mais frequente com o avanço da idade.

Embora o conjunto completo de causas da condição ainda seja desconhecido, é sabido que certos genes podem aumentar o risco de desenvolvimento do Alzheimer, e um novo estudo indica que um deles, o gene APOE, pode ter seu impacto relacionado à ancestralidade dos indivíduos.

Entenda a pesquisa

Trata-se de uma pesquisa realizada pelo Laboratório de Fisiopatologia do Envelhecimento (Gerolab) da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) em parceria com o Departamento de Genética da USP.

Os cientistas investigaram a complexa interação entre genética, lesões no tecido do sistema nervoso e cognição funcional em uma amostra de 400 indivíduos diagnosticados com Alzheimer em diferentes níveis de gravidade.

"Os resultados dessa pesquisa nos ajudam a entender como o principal fator genético para a doença de Alzheimer, que é a apolipoproteína E, se associa a essa condição de forma diferente entre pessoas que têm ancestralidade africana e aquelas que não têm uma grande quantidade dessa ancestralidade", explica Claudia Kimie Suemoto, professora da Disciplina de Geriatria da FMUSP e pesquisadora do Biobanco para Estudos em Envelhecimento da faculdade.

Como assim? A apolipoproteína E é codificada pelo gene APOE, que desempenha papel-chave no metabolismo de lipídeos, e cuja variação APOE4 é um dos principais fatores genéticos reconhecidos para a predisposição ao desenvolvimento da demência.

De acordo com Michel Naslavsky, professor do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP e primeiro autor do estudo, já se sabia há anos que a APOE4 é uma das variantes comuns com maior efeito sobre Alzheimer.

"O que tem se evidenciado recentemente, graças a estudos mais inclusivos com populações não europeias, é que o APOE4 pode ter um efeito atenuado a depender da ancestralidade", explica o cientista.

Assim, embora esse gene aparente ter efeito danoso em todos os grupos populacionais, indivíduos com mais ancestralidade africana seriam menos suscetíveis ao seu impacto.

Ambiente e genética

Segundo a literatura médica, pessoas com ancestralidade africana costumam ter menor acúmulo de lesões no tecido do sistema nervoso associadas ao Alzheimer.

No entanto, quando essas lesões estão em grande quantidade, essa ancestralidade se associa a uma pior habilidade cognitiva. Nos EUA, por exemplo, a incidência de demências é cerca de duas vezes maior em afro-americanos do que em brancos e outras minorias.

"Grande parte das diferenças se dá por conta de exposições ambientais variadas", comenta o professor Naslavsky. "Ainda assim, sabemos que há distinções genéticas em indivíduos que se autodeclaram brancos e negros devido a múltiplas ancestralidades".

O pesquisador ressalta que a complexidade aumenta quando se analisa países mais miscigenados, a exemplo do Brasil, onde muitos possuem APOEs de diversas origens.

A aposta dos cientistas é que, ao se identificar o papel relativo do APOE em cada população, será possível entender melhor as alterações funcionais no corpo que ocorrem em decorrência da doença de Alzheimer.

O próximo passo da pesquisa, segundo a professora Claudia Suemoto, será continuar coletando mais casos de Alzheimer para aumentar a amostra e fazer outros estudos genéticos, não só com a apolipoproteína E, mas com outros genes candidatos de risco para a doença.

O estudo foi publicado em 7 de setembro de 2022 no periódico Molecular Psychiatry e pode ser conferido em: https://www.nature.com/articles/s41380-022-01729-x