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Como é procedimento milionário que fez Claudia Rodrigues vender imóveis

Claudia Rodrigues vai fazer procedimento nos EUA no próximo ano - Divulgação
Claudia Rodrigues vai fazer procedimento nos EUA no próximo ano Imagem: Divulgação

Do VivaBem, em São Paulo

20/12/2022 16h13

A atriz Claudia Rodrigues, 52, vai fazer um procedimento no próximo ano para tratar a esclerose múltipla, doença neurodegenerativa com a qual convive desde 2000. O custo seria de US$ 5 milhões (cerca de R$ 26 milhões, na cotação atual), segundo a companheira da atriz, Adriane Bonato. A empresária disse que Claudia colocou alguns imóveis à venda para pagar o tratamento.

Chamada BTT Abreu 700, a técnica foi criada pelo médico brasileiro Marc Abreu, formado pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Segundo seu criador, a tecnologia teria aplicação possível contra 16 condições, incluindo outras doenças neurodegenerativas, como Alzheimer, Parkinson e ELA (Esclerose Lateral Amiotrófica).

Especialistas ouvidos por VivaBem, entretanto, afirmaram que o procedimento ainda carece de comprovações científicas e não é possível afirmar que ele seja capaz de tratar essas ou outras doenças.

A empresa BTT Corp, que detém o procedimento, disse que o preço varia entre US$ 36 mil e US$ 50 mil por sessão (de R$ 155 mil a R$ 259 mil, na cotação de hoje). O número de aplicações depende da avaliação individual do paciente.

Vou me curar. Essa cirurgia vai sarar minhas sequelas. É genial. Cláudia Rodrigues à colunista Patrícia Kogut, do jornal O Globo

O que é o procedimento?

  • BTT é uma sigla para túnel térmico cerebral.
  • A técnica é não invasiva, sem cortes, por isso não é chamada de cirurgia --e sim de procedimento ou tratamento. Também não demanda tempo de recuperação.
  • Cada sessão dura cinco dias.
  • No procedimento, há um estado de hipotermia guiada pelo cérebro em ambiente hospitalar, usando um aparelho com princípios de termodinâmica cerebral e frequências termorregulatórias.
  • A pessoa usa um capacete, dentro de uma máquina, em que recebe ondas eletromagnéticas e estímulos neurais.
  • Na esclerose múltipla, o tratamento ajudaria a restaurar as bainhas de mielina, capas de gordura que revestem os nervos e que o próprio organismo ataca nos portadores da doença.
  • O aparelho tem aprovação da FDA (Administração de Alimentos e Medicamentos), agência dos EUA nos moldes da Anvisa, para monitorar a temperatura durante procedimentos cirúrgicos, sala de recuperação e cuidados intensivos.

Por que gera controvérsia?

  • Segundo o neurologista Jefferson Becker, presidente do Comitê Brasileiro de Pesquisa e Tratamento da Esclerose Múltipla, a ausência de discussões de pesquisadores sobre o procedimento é um alerta.
  • A influência das proteínas de choque térmico também não é relevante nas investigações feitas até aqui sobre a doença, diz.

Proteína de choque térmico não é uma coisa que faz parte da fisiopatologia da esclerose múltipla. Eu nunca li e vi mesa redonda qualquer que fale sobre isso como algo importante na doença. Jefferson Becker

Sem a discussão em congressos e publicações sobre o tema, o tratamento seria experimental, afirma Becker.

Outro alerta é a promessa de ação nos neurônios e a consequente reparação das sequelas. Uma vez que há perda grande, não é possível recuperá-los, explica o médico.

Esse, inclusive, é o dilema das condições neurodegenerativas, porque a maioria dos pacientes descobre a doença quando a perda de neurônios já é extensa.

"Se pegarmos doenças como Alzheimer, ELA [Esclerose Lateral Amiotrófica], Parkinson, normalmente, os pacientes começam a ter sintomas depois que perderam 50% dos neurônios, e não têm mais reserva funcional", diz o neurologista.

O que dizem as entidades de saúde

Entidades de saúde já emitiram notas sobre o tratamento com o BTT Abreu 700. A ABN (Academia Brasileira de Neurologia) disse em dezembro do ano passado que a técnica não tem "qualquer sustentação científica".

Não havendo evidências de efetividade à luz da ciência, a adoção é estranha aos postulados da medicina. Assim, configura infração ética, inclusive por expor pacientes a riscos e/ou perdas econômicas, dependendo de cada caso. Promessas de melhora ou cura em episódios de doenças tão graves —sem sólida base científica— são um ardil em geral, e especialmente em episódios de saúde tão graves que, não raramente, fragilizam pacientes e seus familiares.

A SBN (Sociedade Brasileira de Neurocirurgia) também emitiu nota em dezembro de 2021 para lembrar que tecnologias apresentadas como "inovadoras" causam ansiedade e precisam de comprovações.

A SBN entende que essas novas opções de tratamentos geram grandes expectativas e ansiedade em quem sofre dessas patologias e em seus familiares, mas ressalta que toda nova possibilidade de intervenção terapêutica deve passar por uma rigorosa etapa de testes clínicos com estudos multicêntricos, para que a sua eficácia e segurança sejam efetivamente demonstradas.

O que diz a empresa

Procurada, a BTT Corp afirmou que a tecnologia é um "caminho para tratar doenças neurológicas". Veja abaixo:

"Em 2007 foram iniciados estudos sobre tratamentos utilizando o Túnel Térmico Cerebral (BTT) na Universidade de Yale, nos EUA, pelo doutor Marc Abreu, e em 2011, foram apresentados os resultados da aplicação da tecnologia para tratamento de pacientes com esclerose múltipla. Apresentados no congresso da Sociedade Americana de Anestesistas ASA (American Societ of Anesthesiologists) com o trabalho The Brain Temperature Tunnel: More Than a Path for Monitoring Temperature, os resultados revelaram que o BTT é muito mais que um caminho para monitorar a temperatura do cérebro, mas também um caminho para um tratamento com sucesso para doenças neurológicas.

A descoberta levou à invenção e patente do sistema Abreu BTT 700, aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador norte-americano semelhante à Anvisa. 

Estudos continuam a ser feitos pois envolvem uma combinação de diferentes avanços, como, por exemplo: (1) primeira tecnologia a monitorar continuamente e de forma não invasiva a temperatura do cérebro, (2) a aplicação da física/termodinâmica para finalidades terapêuticas, (3) primeira tecnologia a conseguir induzir proteína de choque térmico, e (4) primeira tecnologia que consegue restaurar funções cerebrais que foram perdidas. Portanto, um novo paradigma na medicina e ciência."

Errata: este conteúdo foi atualizado
A primeira versão do texto informava que o cérebro passava por um processo de aumento da temperatura. Na verdade, é de hipotermia. A informação foi corrigida.
A sigla SBN é de Sociedade Brasileira de Neurocirurgia. A informação também foi corrigida.