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Com narcolepsia, ele tem sono incontrolável: 'Até professores faziam piada'

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Danielle Sanches

Colaboração para VivaBem

26/12/2022 04h01Atualizada em 26/12/2022 15h30

Vitor Dmetruck, 20 anos, recebeu o diagnóstico de narcolepsia na adolescência. A doença rara provoca crises de sono incontroláveis e a pessoa pode dormir "do nada" em situações que não faria isso, como ao comer, tomar banho e até no sexo. O estudante sofreu bullying na escola e não passou em um vestibular por dormir por mais de uma hora durante a prova. Mas aprendeu a controlar o problema e hoje lida bem com sua condição, como conta a seguir:

"No primeiro ano do ensino médio, com 14 anos, comecei a sentir um sono fora do normal durante as aulas.

Minha mãe achou que eu estava passando a madrugada acordado usando o celular e jogando videogame. Mas logo ela percebeu que não era o caso e buscamos ajuda médica.

Primeiro, fomos a um psiquiatra, que me encaminhou para um especialista em sono. Ao ouvir a descrição dos meus sintomas, o médico já desconfiou ser narcolepsia —o que foi confirmado por exames.

Não encarei a doença como algo ruim e iniciei o tratamento com remédios, algumas mudanças de hábito e ajustes na rotina.

O médico explicou que eu precisaria planejar minha agenda para tirar alguns cochilos durante o dia e, assim, reduzir as crises de sono.

Mesmo fazendo tudo direitinho, tenho duas a três crises por dia. Poderia ser pior: sem os cochilos, as crises diárias chegariam a 10

Vitor Dmetruck, narcolepsia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Hoje, os amigos entendem a condição de Vitor e o estudante encara o problema de forma leve
Imagem: Arquivo pessoal

Na época que descobri o problema, a escola não me ajudou. Eu me sentia menosprezado pelos colegas de sala, que me viam com sono na aula e davam risadinhas maldosas, coisa de adolescente mesmo.

Até piada de professor eu ouvi. Para mim, foi um exemplo do que não fazer.

Tinha apenas dois amigos de verdade com quem podia contar. Eles se preocupavam comigo, me protegiam quando eu dormia e me ajudavam com a matéria. Foi um período bem traumático

Faculdade mudou tudo

Quando comecei a fazer graduação na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, as coisas melhoraram muito. Tenho novos amigos que compreendem melhor minha condição. Levamos tudo com muito bom humor. Eles me chamam de 'Narco' e não vejo problema algum nisso.

Para os professores, eu me apresento e já falo da doença, para que entendam que, quando eu durmo em aula, não é por desrespeito, desinteresse ou maldade. É algo inevitável.

Minha vida hoje é bem próxima do normal. Pratico esportes, toco na bateria da faculdade, vou a festas.

Mas preciso ter sempre um plano de ação, porque a crise uma hora vem e eu vou precisar parar e dormir em algum lugar. Geralmente, um cochilo de 15 minutos resolve a situação. No entanto, pode demorar mais.

Vitor Dmetruck, narcolepsia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Vitor às vezes tem crise e precisa dormir no meio da aula, mas colegas e professores respeitam sua condição
Imagem: Arquivo pessoal

A primeira vez que prestei vestibular tive uma crise de sono durante a prova, que durou uma hora e 40 minutos. Não consegui terminar o teste e reprovei, obviamente

A minha narcolepsia está em grau intermediário. Isso quer dizer que, quando o sono vem, eu ainda tenho tempo de reação. Consigo parar o que estou fazendo e ir dormir em um lugar seguro.

No entanto, o sono é muito forte e minha cognição fica imediatamente comprometida. Assim, eu não posso dirigir, já que uma crise poderia colocar a mim e a outras pessoas em perigo.

E, quando durmo, durmo pra valer. Em qualquer lugar, com o barulho que for ou sol na cara. Uma vez, dormi durante um ensaio da bateria da escola.

A narcolepsia também gera cataplexia, uma fraqueza muscular que literalmente me derruba no chão quando acontece. É algo que vem do nada e eu posso ficar uns 30 segundos assim, caído e paralisado

Costumo dizer que é diversão garantida para quem está perto. A cataplexia geralmente é despertada por uma emoção forte. No meu caso, o gatilho é sempre algo que eu considere muito engraçado.

Vitor Dmetruck, narcolepsia - Arquivo pessoal  - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Cuidar da parte psicológica é importante pois, depois da crise de sono, geralmente bate um sentimento depressivo bem forte e temporário.

No geral, levo minha condição bom humor. A doença não tem cura e é algo com que terei de conviver para o resto da vida. Então, por que não tornar isso algo leve? Se não posso lutar contra a narcolepsia, o jeito é adaptar minha vida."

O que é narcolepsia?

Doença rara sem cura, que provoca crises de sono em situações em que pessoa normalmente não dormiria, como tomando banho, comendo e até fazendo sexo.

O tipo 1 é provocado pela deficiência de hipocretina, um neurotransmissor que ativa o sistema nervoso para nos deixar acordados. "Nesse caso, os neurônios que produzem a substância morrem", explica Alan Luiz Eckeli, neurologista e professor da USP. O quadro ainda provoca a cataplexia, fraqueza muscular que dura alguns segundos e deixa o paciente imóvel.

O tipo 2 de narcolepsia apresenta níveis normais de hipocretina e é considerado mais leve, além de não gerar cataplexia.

A doença costuma aparecer na segunda década de vida, mas já dá sinais antes —justamente como ocorreu com Vitor.

OUTROS SINTOMAS DA NARCOLEPSIA

Além das crises incontroláveis de sono e da cataplexia, o indivíduo pode ter:

  • Paralisia do sono (quando a pessoa acorda, mas não consegue se mexer);
  • Alucinações no início do sono, como se estivesse "sonhando acordado";
  • Sono noturno fragmentado, com vários despertares.

É uma doença com grande impacto na vida do paciente, que aumenta o risco de transtornos mentais e até suicídio Alan Luiz Eckeli, médico neurologista e professor do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP

TRATAMENTO

  • Uso de medicamentos que aumentam o tempo de vigília (acordado) e reduzem as crises de cataplexia;
  • Matner hábitos saudáveis, como praticar exercícios, ter uma boa alimentação, evitar o álcool e o tabagismo;
  • Ter uma boa noite de sono, dormindo por pelo menos sete horas;
  • Programar cochilos durante o dia para reduzir as crises.

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