'Casamento às Cegas 2': por que eles topam noivar sem ao menos se ver?
A segunda temporada do reality show "Casamento às Cegas Brasil" estreou nesta quarta-feira (28) na Netflix, com quatro episódios iniciais. De forma resumida, o programa tem como objetivo provar se o amor é realmente cego, propondo que desconhecidos fiquem noivos sem ao menos se ver.
Há muita intensidade, participante desistindo, querendo casar com duas, juras de amor, disputa e choro. Mas o que faria alguém topar uma aventura como essa? Casar com quem jamais encontrou na vida?
Por que as pessoas topam isso?
Segundo Ana Suy, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Paraná e professora da PUC-PR, o programa tem muito do amor cortês, romântico e até um pouco ideal.
Fazemos uma construção fantasiosa de que o amor preenche algum vazio, como a solidão ou até a alegria. Mas não é só disso que se trata o amor. Ana Suy, psicóloga
Além disso, ela cita outros motivos:
- As pessoas tendem a fantasiar que existe alguém ideal e o reality traria a "pureza" do "ser" antes do "ter".
- Os casais, por exemplo, ainda não viram as coisas que não queriam saber, incluindo os defeitos e as falhas do outro. É por isso que alguns participantes ficam noivos sem se ver.
Já Camila de Cássia Ribeiro, psicóloga da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, explica que decisões como essa têm como base a insegurança.
- O ser humano, segundo ela, tem instintos primitivos de se relacionar, para garantir segurança e sobrevivência. Na infância, a relação com os pais garante essa segurança, mas ela é perdida por meio de frustrações.
- A sensação de desproteção tem uma consequência emocional no futuro, principalmente a insegurança. "O problema é que muita gente tenta preencher esse vazio com outra pessoa", diz Ribeiro.
- Há ainda uma pressão social e cultural de formar uma relação sólida, com filhos, principalmente para as mulheres.
"Parece que os homens sozinhos são menos 'mal ditos' do que mulheres sozinhas. Elas têm que lidar com outras coisas, como a questão da maternidade, se vai vir ou não, se vai congelar óvulos. Desde sempre a anatomia mesmo e as condições culturais tem um peso a mais para elas", diz Suy.
Atenção: forçar relações faz mal
Relacionar-se por medo de ficar sozinho pode gerar namoros e casamentos infelizes, segundo as psicólogas.
Isso porque a pessoa diminui os critérios de busca por um companheiro e mantém uma relação fria e distante. Isso traz frustrações, infelicidade, mas ela não consegue terminar por medo, insegurança.
O "ideal" também pode ser um pesadelo abusivo. "Quando duas pessoas se tornam uma é porque alguém deixou de existir. Quando duas estão em uma perfeita harmonia é porque alguém está se mutilando psiquicamente", diz Suy.
Mas o outro nunca será o que esperávamos dele, assim como nós não somos o que ele espera. "Se nos decepcionamos, mas conseguimos suportar que o outro também pode se decepcionar, isso é liberdade", fala a psicóloga.
É por isso que, se há infelicidade, medo de ter um tempo só para si e de encarar as próprias fragilidades, é bom procurar ajuda.
Como encontrar a "tampa da panela"?
Tanto o Tinder quanto o reality, que são exemplos das relações "modernas", estão do mesmo lado, o de encontrar a tampa da panela. Mas o amor não é algo que se procura (pelo menos não na maioria das vezes).
"Quando você procura alguém como se fosse do RH de uma empresa, só encontra gente chata, porque as que estão de acordo com a nossa fantasia não nos interessam realmente", diz Suy.
A psicóloga diz o real é se interessar por alguém de surpresa.
É o cotidiano, o que nós somos. Pensamos que alguém vai nos completar, mas ele não vem para isso. Vem para fazer falta. O amor não vai ser poupado das dificuldades da vida, só sofremos mais quando pensamos assim. Amor e dor são parceiros. Ana Suy, psicóloga
No aplicativo, no reality ou na vida real é importante se conhecer e ter amor-próprio. Suportar a solidão faz parte, afinal, só cabe um dentro do nosso próprio corpo.
* Com informações de reportagem publicada em 13/03/2020.
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