Mãe compartilha rotina de filho com transtorno sensorial; como identificar?
A jornalista e fotógrafa Tanara Hormain, 29, compartilha a vida e a rotina de seu filho Levi Hormain Dutra, 4, diagnosticado com transtorno do processamento sensorial, ou TPS, no TikTok. As imagens têm feito sucesso: um desses vídeos, publicado em 9 de janeiro, conta com mais de 900 mil visualizações.
Na gravação, Levi conta que se incomoda com água caindo no rosto e na cabeça, não gosta do chão áspero e dos sons do aspirador e do secador de cabelo.
Entre os comentários, há muitas dúvidas: "Isso é parecido com TEA [transtorno do espectro autista], TA [transtorno de ansiedade] ou TDAH [transtorno do déficit de atenção e hiperatividade]?", questiona uma usuária. "Como descobriu?", pergunta outra.
A família de Rio Grande, município do Rio Grande do Sul, percebeu que Levi tinha sinais, mas demorou para entender o que era, porque desconhecia o transtorno.
A mãe relata que, quando bebê, ele não gostava de alimentos pastosos, tinha sensibilidade para andar em chãos áspero, preferindo ficar sempre de tênis, e sons altos o deixavam estressado.
Ele já tinha muitos e muitos sinais. Como desconhecia o TPS, só não entendia os motivos. Em outubro de 2022 fomos em um grande evento, foi quando ele teve a primeira crise sensorial. O sofrimento dele era nítido e precisamos ir embora urgente. Tanara Hormain
Depois da primeira crise do filho, Tanara conta que buscou um diagnóstico.
O que é TPS?
Segundo a neuropediatra Bianca Madeiro, o transtorno do processamento sensorial é uma alteração de como a pessoa percebe os estímulos sensoriais (paladar, tato, audição, visão e olfato), seja na intensidade ou na qualidade, como uma sensação ruim ou de dor.
Madeiro diz que a criança com TPS pode ter uma rejeição inexplicada a alguns ou a vários alimentos e intolerância a determinadas sensações. O que chama a atenção da família para pensar que algo está errado é a desproporção entre o estímulo e o incômodo causado por ele.
Quais são os sintomas
O pediatra Nivaldo Fracacio afirma que existem alguns sinais comuns de transtorno em crianças, incluindo:
- Reações exageradas ou incomuns a estímulos sensoriais, como barulhos, luzes, texturas, odores ou sabores;
- Dificuldade em tolerar determinadas roupas ou texturas de alimentos;
- Dificuldade em se concentrar ou se sentir desconfortável em ambientes barulhentos ou movimentados;
- Problemas de coordenação motora, como escrever ou usar tesouras;
- Dificuldade em se adaptar a mudanças no ambiente ou rotina;
- Problemas de comportamento, como agitação ou comportamento agressivo, devido a estímulos sensoriais desagradáveis.
Como saber se meu filho tem o transtorno sensorial?
Madeiro conta que o diagnóstico é feito em consulta, baseado nos sintomas, e que questionários podem ser usados com esta finalidade.
A seletividade alimentar pode ser confundida com erro alimentar e gerar sentimento de culpa na mãe. Muitas vezes, a mãe diz: 'Doutora, eu criei meus quatro filhos da mesma forma; os outros comem tudo, mas fulaninho só come arroz branco e frango sem tempero'. Uma peça de roupa um pouco fora de lugar pode fazer a criança parar uma atividade importante, ou até fazer a família parar o carro no meio do trânsito movimentado, para que a roupa seja arrumada. Bianca Madeiro, neuropediatra
Como lidar com o transtorno?
O pediatra elenca várias maneiras de lidar com o TPS em crianças:
- Terapia ocupacional: os terapeutas ocupacionais podem trabalhar com as crianças para ajudá-las a desenvolver habilidades sensoriais e motoras, bem como adaptar o ambiente para torná-lo mais seguro e confortável.
- Terapia da fala: os fonoaudiólogos podem trabalhar com as crianças para desenvolver habilidades de comunicação e comer.
- Estimulação sensorial: usando técnicas e ferramentas específicas, os profissionais podem ajudar as crianças a desenvolver e aumentar sua tolerância a estímulos sensoriais específicos.
- Educação e orientação para os pais e professores: os pais e os professores podem ser orientados a entender como o TPS afeta a criança e como adaptar o ambiente para melhorar a experiência da criança.
Lala Fonseca, psicóloga, afirma que a dificuldade em processar as sensações pode ser transmitida como agressividade e sofrimento pela criança. De acordo com ela, bebês e crianças apresentam baixa tolerância aos desconfortos em geral, já que vamos aprendendo, conforme crescemos, a suportar frustrações.
A aceitação é o fundamental para o um prognóstico positivo. Tanto pais, que esperam o 'filho perfeito', com desenvolvimento e crescimento de acordo com as próprias expectativas, quanto da própria criança. Lala Fonseca, psicóloga
Fonseca explica que, independentemente se há ou não algum transtorno presente na vida da criança, para a adequação, é importante que os pais demonstrem ao filho que ele é aceito como é.
É necessário acompanhamento médico?
A avaliação com neuropediatra é importante para detectar ou afastar outros transtornos que podem estar associados. Como o diagnóstico é clínico, o neuropediatra só solicitará exames se achar algo específico que justifique.
Levi, por exemplo, faz terapia ocupacional com integração sensorial, é acompanhado por uma neuropediatra e já fez psicoterapia. Fonseca reforça que é essencial o tratamento multidisciplinar com neurologista, terapeuta ocupacional, psicólogo, fonoaudiólogo e médico. O papel dos pais consiste em dar suporte e compreender os limites da criança.
Como diferenciar os sintomas de TEA, TDAH, TA?
É importante notar que crianças podem ter mais de um transtorno simultaneamente. O transtorno do processamento sensorial, por exemplo, é muito comum em quem tem autismo, mas também pode se apresentar isoladamente.
De acordo com o pediatra Nivaldo Fracacio, o TPS, os transtornos do espectro autista, o TDAH e o transtorno de ansiedade são diferentes, e é importante lembrar que cada criança é única e pode apresentar uma combinação de sintomas diferente.
- O TEA é caracterizado por dificuldade em comunicação, interação social e comportamento repetitivo. As crianças com TEA podem ter dificuldades com a comunicação, dificuldade para se relacionar socialmente, comportamentos repetitivos e restritos, e sensibilidades sensoriais incomuns.
- O TDAH afeta a capacidade da pessoa em focar e ter atenção, controlar impulsos e regular o comportamento motor. Os sintomas podem incluir déficit de atenção, hiperatividade e impulsividade.
- O transtorno de ansiedade se caracteriza por uma sensação persistente de medo, ansiedade e preocupação excessiva. Os transtornos de ansiedade incluem transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de pânico, fobia social, TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), entre outros.
Sinceramente, foi um alívio descobrir o TPS. Hoje eu sei o que é, estudo e diariamente aprendo a ajudá-lo. Já sei o que desregula e estou aprendendo como ajudá-lo a se regular. Nem sempre dá certo, mas entendo que estou aprendendo. Tanara Hormain
Adultos com TPS
O TPS se manifesta já na infância, mas pode continuar pela vida adulta, causando desconforto para a pessoa afetada e também naqueles com quem ela convive, diz Madeiro.
De acordo com a psicóloga, é preciso ter cuidado, porque muitas pessoas com esse transtorno sofrem de ansiedade e depressão. E que, apesar de não haver cura, é possível aprender a lidar com os sintomas.
Fonseca aponta que é interessante prestar atenção na forma como Tanara respeita os desconfortos do próprio filho, independentemente de ser um quadro com sintomas específicos, a criança deixa claro seus limites e termos.
A técnica de respirar e inspirar é bastante utilizada nos transtornos ansiosos, assim como crises de pânico, e é uma ótima sugestão. Isso porque o aumento da oxigenação no sangue permite um relaxamento dos batimentos cardíacos, além da concentração na respiração e não no desconforto responsável pela crise.
Se você suspeita que seu filho possa ter TPS, é importante consultar um profissional de saúde, como um médico de família, pediatra e terapeuta ocupacional, para avaliar, diagnosticar e acompanhar corretamente. A equipe multidisciplinar pode recomendar tratamentos e intervenções adequadas para ajudar a melhorar a qualidade de vida de forma individualizada. Nivaldo Fracacio Júnior, pediatra
Fontes: Lala Fonseca, psicóloga pela FMU e pós-graduanda em psicologia clínica e terapeuta com abordagem cognitiva-comportamental pela USP, tem especialização em psicofarmacologia pelo Hospital das Clínicas da FMUSP e capacitação em psicologia do sono pelo Instituto do Sono da Unifesp; Nivaldo Fracacio Júnior, pediatra na Sami Saúde, médico graduado pela Universidade de Marília, cursou residência em pediatria e também em medicina preventiva e social na USP; Bianca Madeiro, neuropediatra, médica do ambulatório de neurogenética e preceptora da residência médica de neuropediatria do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco.
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