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Saúde

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'Estômago necrosou e quase morri': ele teve problema raro após bariátrica

Laís Seguin

Colaboração para VivaBem

08/03/2023 04h00

Felipe Vinha, 38, teve complicações raras de uma cirurgia bariátrica, realizada em outubro. O estômago dele necrosou e, após quase morrer, ele hoje se recupera das sequelas. Jornalista, Vinha integra a equipe de produção de conteúdo do influenciador Felipe Neto, mas está afastado. Ao VivaBem, ele conta sua história.

"Infelizmente ganhei muito peso durante a pandemia, trancado em casa e me alimentando mal. Para piorar, em junho de 2022 fui diagnosticado com a covid-19 e, como sequela, minha respiração piorou demais.

Resolvi me consultar com um médico cirurgião especializado [em bariátrica] e ele recomendou a cirurgia porque eu realmente estava em um estágio crítico de obesidade, pré-diabético e precisava perder peso de maneira drástica.

Ele [o médico] avaliou que eu já havia tentado perder peso de outras formas, como dieta, nutricionista, endócrino, exercícios, remédios, e nada deu certo. Então partimos para o último recurso, que foi a cirurgia bariátrica [a operação consiste, em linhas gerais, em uma redução do espaço para os alimentos no trato digestivo].

O médico me alertou que toda cirurgia tem riscos, mas no caso da bariátrica eram pequenos e com grande taxa de sucesso no histórico dele

'Cheguei em casa e senti dores'

Fiz a cirurgia em 31 de outubro de 2022. Tive alta no dia seguinte. Quando cheguei em casa, comecei a sentir dores no abdome e voltei para a emergência. Meu estômago necrosou e foi necessária uma nova cirurgia.

A segunda cirurgia conseguiu reverter o problema, mas, depois dela, fiquei 50 dias no CTI [Centro de Terapia Intensiva], sendo 20 deles desacordado.

Soube que toda a equipe do CTI ficava constantemente comigo durante vários dias. Meu cirurgião chegou a me acompanhar até 4 horas da manhã para me estabilizar.

Fiquei intubado por 20 dias no CTI e precisei tomar muito relaxante muscular para não prejudicar a intubação — mal conseguia respirar e quase morri diversas vezes nesses momentos. Perdi os movimentos de braços e pernas [temporariamente] devido ao tempo parado na cama e aos relaxantes musculares em doses cavalares

'Fiquei depressivo'

Foi desesperador não ter meus movimentos mais básicos. Não conseguia nem coçar o nariz. Era muito frustrante e por muitos momentos estive depressivo.

O trabalho também me preocupava desde que acordei no CTI. Cheguei a pensar que não conseguiria trabalhar nunca mais.

Felizmente, tive uma equipe muito boa de fisioterapia. Os movimentos dos braços voltaram. Em janeiro, já conseguia mexer de novo no celular, folhear gibis e até jogar videogame no quarto. Atualmente, também consigo comer com garfo e faca, ficar de pé e andar.

A fisioterapia segue até hoje. É um trabalho de repetição que exige enorme paciência. Fui aprendendo isso aos poucos. Quando comecei a dar meus primeiros passos em 2 de fevereiro, com um andador, chorei muito.

Vinha - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Felipe Vinha: 'mal conseguia respirar e quase morri'
Imagem: Arquivo pessoal

'Não foi erro, mas uma complicação'

Minha família me visitava no CTI todos os dias. Fui sortudo de ter todo esse suporte. Todos os meus colegas de trabalho se mostraram muito preocupados.

O que houve não se tratou de erro médico: foi uma complicação realmente

A bariátrica se manteve. Não aguento comer nem metade do que comia antes. Mas já posso comer de tudo."

Bariátrica: como funciona?

A bariátrica é indicada para tratar casos de obesidade e costuma ser segura, segundo o Ministério da Saúde. Além disso, é uma estratégia importante para reverter quadros graves de saúde e controlar comorbidades.

Como qualquer procedimento cirúrgico, porém, há risco de complicações. As mais comuns são:

  • intolerância alimentar na primeira fase da dieta;
  • dificuldade ou dor ao engolir;
  • sangramentos nas fezes, em vômitos ou intra-abdominais.

Segundo o cirurgião-geral João Pedro da Silva Giorgetta, que trabalha com cirurgia bariátrica há mais de uma década e operou Vinha, alguns pacientes têm maior risco de complicações.

Quanto mais comorbidades o paciente tiver, como hipertensão, diabete, asma e índice de massa corporal acima de 50, por exemplo, maior o risco de complicações. João Pedro da Silva Giorgetta

Felipe Vinha teve isquemia e necrose do estômago excluso — a parte do estômago que fica desconectada do fluxo de alimentos no sistema digestório após a cirurgia — na primeira operação, algo bastante raro.

"Foi o primeiro caso que vi em 15 anos de trabalho e não achei nada próximo do que ele teve. A priori, é uma complicação raríssima e ainda não podemos afirmar com certeza a causa", disse Giorgetta.

A isquemia é a falta de circulação sanguínea no órgão, no caso, o estômago. A necrose é uma consequência dessa falta de circulação, explica Antonio Carlos Valezi, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.

Valezi também destaca que esse tipo de complicação é "extremamente raro".

Cada cirurgião que trabalha com bariátrica poderá contar os casos em que verá isso em seus dedos das mãos. Antonio Carlos Valezi

Além disso, segundo Valezi, esse tipo de complicação não é exclusivo da bariátrica — pode acontecer em outras cirurgias do aparelho digestivo. Se acontece, a conduta correta é diagnosticar e remover o tecido necrosado rapidamente, para não causar infecção ou morte — como fez o médico.

Reafirmo que quem tiver a recomendação médica da cirurgia não deixe de fazê-la, porque ela não costuma ter complicações. Antonio Carlos Valezi