Câncer no sangue foi confundido com osteoporose: 'Minha filha suspeitou'
Dores fortes e incapacitantes na coluna levaram o professor aposentado Elvys Vieira Gomes, 59, a ser diagnosticado com osteoporose. Dois meses depois, porém, havia um indício de mieloma múltiplo, tipo de câncer sanguíneo que começa na medula óssea.
A suspeita partiu da filha dele, que é médica patologista e indicou que ele fizesse um exame específico. Até então, Elvys tinha passado em quatro ortopedistas e nenhum havia cogitado a doença do sangue. É que uma das consequências do mieloma é a deterioração dos ossos, o que pode ser confundido com osteoporose.
Novos exames e uma biópsia da medula confirmaram o tumor, e ele iniciou o tratamento adequado. Hoje, o professor tem uma qualidade de vida melhor, segue com medicamentos, faz exames mensais e acompanhamento com hematologista. A seguir, conheça a história dele:
"Em janeiro de 2021, comecei a sentir dores nas costas que foram aumentando a ponto de eu não conseguir levantar da cama, nem para ir ao banheiro. Ia com ajuda da minha esposa.
Deixando de fazer atividades diárias, procurei um médico e, como era emergência, ele passou medicamentos emergenciais e me encaminhou para um ortopedista. Fui, fizemos raio-X e ele indicou outros exames. Fiz esses exames e fui a outros especialistas. Passei com quatro ortopedistas, pegando opiniões diferentes.
Os exames acusaram uma osteoporose grave e fratura na coluna, na vértebra T9. Com o efeito dos remédios que me passaram, as dores amenizaram, porém, temos uma filha médica que se especializou em patologia e ela disse: 'Pai, não estou satisfeita com esse diagnóstico. Osteoporose grave na sua idade? Pode ser outra coisa'.
Ela pensou em câncer, mas eu não pensei nisso. Ela pediu o exame eletroforese, que mostrou um indício de mieloma múltiplo.
Conversando com minha filha, ela pediu para eu perguntar aos ortopedistas se não poderia ser mieloma múltiplo, e todos que a gente consultou, infelizmente, disseram que não. Não sei se eles desconheciam ou não, mas eles não sabiam.
Foi por ela que descobri. Do contrário, não tinha como, porque não sabia sobre mieloma múltiplo e os ortopedistas não pediam exames específicos.
Como sou do Pará, e ela mora em São Paulo, ela falou que eu precisava ir urgentemente para lá por causa da suspeita de mieloma múltiplo. A gente foi para São Paulo, mas precisava de outros exames para certificar, inclusive biópsia de medula óssea. Em agosto, saiu o resultado da biópsia, que acusou exatamente o que ela já desconfiava.
Muda muita coisa ter um problema de coluna que eu poderia tomar um cálcio e depois ter diagnóstico de câncer. A gente fica abalado, mas ficamos confiantes. Somos cristãos evangélicos e ficamos tranquilos, porque temos esperança em Deus. Mas começamos o tratamento imediatamente.
Em sete meses, fiz 28 sessões de quimioterapia e depois um transplante de medula óssea chamado autólogo, que não precisa de doador externo. Como os médicos dizem, esperava-se que ela pegasse, que reagisse bem, e ela pegou no 16º dia.
Fiquei mais uma semana internado, tirando os medicamentos aos poucos, e depois recebi alta. Em seguida, foram marcadas mais oito sessões de quimioterapia. Nesse momento, estou em manutenção, tomando medicamentos orais em casa, fazendo exames mensais e acompanhamento com hematologista.
A demora no diagnóstico correto não prejudicou tanto o tratamento porque foi um período muito curto, cerca de dois meses. Mas achei esquisito que os médicos sequer detectaram nem pediram novos exames.
Minha frustração foi essa. Mesmo eu perguntando o nome correto do câncer, eles disseram que não.
Ter a minha filha foi essencial. Se não fosse ela, seria difícil descobrir. Eu ia ficar estagnado. Também, graças a Deus, tenho esposa que ama a área nutricional e cuida muito bem disso. A gente foi na nutricionista e minha esposa seguiu à risca o que ela passava, o que melhorou muito minha saúde em outros aspectos. Eu era hipertenso, tinha colesterol alto, triglicerídeos e tudo isso foi indo embora. Foram muitas transformações."
Saiba mais sobre mieloma múltiplo
O mieloma múltiplo ocorre quando um tipo de célula do sangue, o plasmócito, sofre uma mutação e se replica como célula maligna. E, em vez de produzir anticorpos saudáveis que vão proteger o organismo, produz um único tipo de anticorpo anormal.
Segundo Angelo Maiolino, professor de hematologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pesquisador do Instituto Américas, uma das manifestações mais frequentes do mieloma é a destruição óssea.
"É um quadro que pode levar a muita dor, principalmente na coluna, e fratura. No início, pode até ser confundido com osteoporose, mas no decorrer do tempo, é um quadro muito mais grave", diz o médico.
Embora a doença ocorra em pessoas na faixa dos 62 anos, em média, no Brasil, o especialista alerta que indivíduos mais jovens também podem desenvolver o quadro, ainda que mais raramente.
Como diferenciar mieloma e osteoporose?
É importante se atentar a alguns sinais do mieloma:
- Anemia, que não ocorre na osteoporose
- Indisposição
- Formigamento nas extremidades do corpo (mãos e pés)
- Disfunção renal, com alteração dos níveis de creatinina no sangue
- Nível de cálcio elevado
- Baixa imunidade, identificada por infecções recorrentes, como pneumonia
Só o raio-X é insuficiente para detectar o mieloma, então é recomendado fazer tomografia, ressonância magnética e um exame de proteína mais específico chamado eletroforese. O diagnóstico é dado pelo conjunto de sinais e sintomas envolvidos e observados em exames.
Tratamento para mieloma
As formas de tratar esse câncer passaram por avanços e hoje é possível usar uma combinação de medicamentos inovadores, como drogas-alvo e imunomoduladores, mas cujo acesso no sistema público é deficitário. A quimioterapia também pode ser necessária, como ocorreu com Elvys.
"Tem perspectiva de uma cura no sentido funcional, porque a doença não desaparece completamente", afirma Maiolino. Se há cerca de 20 anos o diagnóstico de mieloma determinava uma redução do tempo de vida, hoje a pessoa atinge longevidade padrão.
Outro tratamento é o transplante de medula óssea autólogo, feito com a medula do próprio paciente. Sobre o procedimento, é importante saber que:
- É feito após um tratamento inicial com combinação de medicamentos e doença sob controle.
- Não é um tratamento isolado nem curativo
- Por ser intenso, geralmente não é feito em pessoas com mais de 70 anos
- É necessária internação mais prolongada
Nesse transplante, os médicos retiram células-tronco da pessoa, que são congeladas. Depois disso, há a possibilidade de fazer quimioterapia com dosagem mais alta. Em seguida, as células-tronco são devolvidas ao organismo, que vão servir para a recuperação.
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