Tocofobia: mulheres com medo exagerado de engravidar dão os seus relatos
"Na minha primeira crise fiz três testes de gravidez, além de ultrassom e tomografia, até que o médico chamou minha atenção", relata a estagiária de direito Beatriz Antônio, de 22 anos. Ela sofre de tocofobia, nome que se dá ao medo exagerado de engravidar e do parto.
Beatriz conta que dias após ter relações sexuais é comum ela sentir ânsia, barriga inchada, cólica e sensibilidade nos seios. "Você não acredita nos métodos contraceptivos e acha que todos vão falhar com você. E quando você acaba tendo relação sexual, acha que engravidou mesmo sem sintomas, e aí começa a ansiedade", fala.
Duas crises fortes de tocofobia fizeram com que ela fosse parar no hospital. Em uma delas, no auge da pandemia, um médico chamou sua atenção, reforçando que não havia gravidez alguma.
O medo é tanto que algumas mulheres recorrem a métodos extremos e pouco saudáveis. A operadora de caixa Alice França, 19, já passou dois anos sem ter relações sexuais para não correr o risco de engravidar, e só nesse ano fez o uso da pílula do dia seguinte três vezes. "Antes, eu tomava chá de canela [conhecido por ser abortivo] e umas misturas sem sentido e sem eficácia nenhuma."
Ela, que iniciou sua vida sexual aos 16 anos, diz ter sentido vergonha de conversar com alguém sobre o assunto na época. Acabou, então, recorrendo à internet e foi vítima de desinformação sobre métodos contraceptivos. Quando fazia sexo, sempre achava que tinha engravidado. Com o tempo, foi aprendendo mais sobre o assunto. "Acabei tomando consciência de muita coisa, mas ainda sinto um medo e uma ansiedade enormes."
Para Viviane Verdu Rico, professora e pesquisadora do Departamento de Psicologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), não receber informação adequada sobre o tema pode piorar o quadro de tocofobia. Ela sugere que o ideal é conversar com um médico ou até mesmo com uma mulher que já teve filhos. "Chamamos isso na psicologia de psicoeducação, que é trazer informação de qualidade. Às vezes, só isso já dá uma baixada na ansiedade da pessoa. Porque ela está com medo de algo que ela não conhece."
Medo da falha dos métodos contraceptivos
Foram posts nas redes sociais que assustaram a estudante de cinema Rafaela Costa, 19. "Toda vez que havia qualquer mudança no meu ciclo menstrual vinha esse medo de fazer parte da porcentagem de falha dos métodos contraceptivos, até porque o que eu mais via na internet eram esses casos de 'engravidei tomando anticoncepcional e usando camisinha'."
Mesmo recorrendo a todos os cuidados possíveis, a estudante diz que ficava "supernervosa" e "paranoica", além de reforçar para si mesma que "nunca mais teria relações sexuais". Isso só melhorou quando ela passou a se informar melhor sobre o assunto e a seguir influenciadoras que falam sobre o tema. A estudante relata também que sua mãe teve partos muito complicados. "Esse medo se instalou desde aí, juntando com o fato de eu não gostar de sentir dor."
De acordo com Caroline Lemos, psicóloga da Maternidade Escola Januário Cicco, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), a tocofobia pode ser primária, quando a mulher nunca foi mãe e sente esse medo grave, e pode também ser secundária, quando ela já teve essa experiência anterior.
Lemos ressalta que os estudos sobre tocofobia começaram a chamar a atenção nos últimos 30 anos. "E os fatores de risco que esses estudos trazem são idade materna avançada, histórico de transtorno mental, personalidade ansiosa ou depressiva, histórico de abuso sexual, experiência traumática anterior, abortos espontâneos e infertilidade."
A tocofobia pode acometer também mulheres que já estão grávidas, ressalta Lemos. "Pode ser difícil para elas falarem sobre o parto e pode, inclusive, interferir no vínculo com o bebê." Além de acarretar prejuízos à saúde materna e perinatal, conforme alerta José Paulo de Siqueira Guida, médico obstetra do Caism (Hospital da Mulher da Unicamp). "A mulher com tocofobia pode apresentar, durante a gestação, sintomas mentais exacerbados, com prejuízo às suas atividades diárias e cuidados consigo e com a gestação", diz.
Existem diversos tipos de tratamento para a condição. "Algumas medidas que reconhecidamente reduzem a tocofobia incluem educação em saúde, terapia cognitivo comportamental, grupos de gestantes e arte terapia", pontua o médico. Já Verdu Rico ressalta: "A medicação é a segunda frente. Acaba sendo uma necessidade para os casos em que a psicoterapia não está sendo suficiente."
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