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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Fotógrafo usa redes sociais para compartilhar a dor do luto e viraliza

Bruno Mendes e a esposa - Arquivo pessoal
Bruno Mendes e a esposa Imagem: Arquivo pessoal

Brunna Costa

Colaboração para o VivaBem

29/03/2023 04h00

"Mô, hoje foi mais um dia daqueles que eu passei sentado no sofá vendo o tempo passar." "Mô, eu juro para você que estou tentando seguir de pé. Um segundinho por vez." É desta forma, escrevendo em primeira pessoa e compartilhando nas redes sociais, que o fotógrafo Bruno Mendes, 36, vive o luto pela perda da esposa há quase dois meses.

Seguido por mais de 20 mil pessoas, suas publicações carregadas de sentimentos construíram uma rede de apoio de desconhecidos que diariamente consola o viúvo no Twitter e traz um alívio na saúde mental neste momento difícil.

"Eu sempre usei de forma controlada e interpessoal as redes sociais. Mas no dia que tudo aconteceu, escrevi pedindo oração. Era uma maneira de gritar para todo mundo o que estava sentindo. Tirar aquela dor do peito. E também pedir ajuda", explica Mendes.

O carioca formado em jornalismo teve apego à escrita na adolescência e utilizou como uma ferramenta para entender mais sobre seu momento de vida. Abandonou o hobby devido à falta de tempo na vida adulta. Nunca soube que esta é uma das ferramentas recomendadas pela psicologia para lidar com momentos difíceis ao longo da vida e expressar sentimentos.

Comecei a escrever para desabafar. Não sabia exatamente como lidar com algumas situações do cotidiano. Como quando eu me sentava na sacada de noite com a minha esposa. Era nosso momento do dia. Geralmente, é neste momento, agora sozinho, que vou escrevendo como se estivéssemos conversando sobre o nosso dia. Bruno Mendes

A professora Maria Helena Pereira Franco, coordenadora do Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto da PUC-SP, explica que a escrita pode ser um ato terapêutico pela possibilidade de reorganização do pensamento e das emoções. E no caso do luto, é um processo de expressão da angústia dos sentimentos derivados da perda, fazendo com que a pessoa, ao escrever sobre suas experiências, possa entendê-lo.

Segundo ela, falar ou escrever sobre o luto é "uma viagem rica de significados que merece ser iniciada e percorrida". No caso da escrita, uma pessoa que vive um luto pode se ver nas palavras, visitá-las em diferentes momentos desse processo e buscar reconhecer os sentimentos variados desse período. "Essa escrita pode ser tanto compartilhada nas redes sociais como a não compartilhada, mantida na intimidade das anotações pessoais", diz.

Entre o bem e o mal das redes sociais

Desde a primeira publicação, a história de Bruno e sua família viralizou. Apesar da curiosidade de desconhecidos sobre o que tinha acontecido com a esposa, Ivy, de 33 anos, que morreu em decorrência de uma síndrome rara, Bruno recebeu mensagens de apoio e depoimentos de pessoas que passaram pelo processo de luto. Desde então, segue recebendo suporte e histórias de quem não conhece.

Bruno Mendes em foto com família - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Bruno Mendes com a família
Imagem: Arquivo pessoal

"No começo, os comentários insensíveis me assustaram. Ao longo do tempo, vejo que o que prevalece é a onda de carinho, amor e que eu sou muito grato. Às vezes fico lendo os comentários e as mensagens que recebo e alivia o sentimento de angústia ou vazio, assim como me dão força para cuidar da minha filha", explica o carioca, que em meio ao processo de luto também cuida da filha do casal, Luiza, de 4 anos.

Talita Fabiano de Carvalho, psicóloga clínica e da saúde e conselheira presidenta do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, explica que qualquer espaço de compartilhamento de emoções, seja presencial ou virtual, com outras pessoas que já viveram perdas ou sofrimento intenso, pode ser benéfico, pois gera uma rede de apoio, de vínculo, de proteção e parceria para lidar com as situações. Contudo, é preciso tomar cuidado com o lado negativo das redes sociais.

Compartilhar em espaços de acesso a várias pessoas pode gerar ataques de quem que se sente protegido pelo anonimato e tende a ser mais preconceituoso, violento e menos sensível à dor expressada pelo outro. Neste momento, isso pode ser um gatilho para uma piora da saúde mental. O importante é ter equilíbrio e usar os espaços de compartilhamento de forma controlada e com uma rede de proteção sempre por perto. Talita Fabiano de Carvalho, psicóloga clínica e da saúde

Cada um vivencia o luto de uma forma

Além das redes sociais, Mendes conta com sua rede de apoio vinda de familiares e amigos, escreve em um caderno pessoal e buscou auxílio psicológico.

Maria da Glória Calado, psicóloga e conselheira vice-presidenta do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, aponta que o luto é uma reação psicológica à perda e pode fragilizar bastante a pessoa. Sendo assim, cada um tem sua própria forma de expressar e buscar as ferramentas que são pertinentes para a sua realidade.

"Algumas pessoas ficam bastante reclusas e não conseguem se expressar. Outras ficam muito tempo vivenciando a situação. Geralmente, os sentimentos de negação, isolamento, raiva, melancolia, culpa e depressão aparecem, até que se atinja o processo de aceitação e superação. O mais importante é saber reconhecer seu tempo e construir uma rede de apoio segura", diz Calado.

A ciência não delimita tempo para vivenciar todo o processo de luto. Ele também é um processo individual de ressignificar o sentimento de sofrimento em saudades.

Sinto que eu fui junto com a minha esposa e agora eu vou ter que nascer de novo, como um bebê que aprender a viver e, aos pouquinhos, reconstruir meu plano de vida. Mas primeiro tenho que sobreviver a essa dor. Bruno Mendes