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Lúpus na infância é mais agressivo: 'Achei que ia perder minha filha'

Maria Eduarda, hoje com 14 anos, e a mãe Ana Cristina; a jovem segue com o lúpus controlado - Arquivo pessoal
Maria Eduarda, hoje com 14 anos, e a mãe Ana Cristina; a jovem segue com o lúpus controlado Imagem: Arquivo pessoal

Do VivaBem, em São Paulo

31/03/2023 04h00

O lúpus é uma doença autoimune grave e pode afetar vários órgãos, como pele, rins e cérebro. Os casos em crianças são raros, mas tendem a ser mais sérios do que em adultos. Ana Cristina Carvalho viu isso de perto com a filha Maria Eduarda, diagnosticada com a enfermidade aos 7 anos. A seguir, a mãe conta a história da pequena, que ficou 4 meses internada e teve de fazer hemodiálise:

"Em setembro de 2016, a Maria Eduarda teve uma febre que não cessava. Ficamos uma semana indo ao postinho, eles passavam remédio, mas não conseguiam saber o que era. Liguei para um hospital infantil e, lá, ela ficou 14 dias internada.

Os médicos diziam ser chikungunya, pois ela começou a ter dores articulares e ficar com mãos e pés inchados. Tomou remédios, fez vários exames demorados e ninguém conseguiu descobrir o problema.

Quando estava com 12, 13 dias [de internação], ela apresentou manchas escuras no rosto, que começou a inchar só de um lado. Ficou totalmente deformada. Uma médica suspeitou de lúpus, mas não tinha como fazer exames mais profundos, porque o hospital não tinha suporte.

Aí começou meu desespero. O rosto inchado, os olhos não abriam mais, já não urinava muito e foi quando ela foi da sala amarela para a vermelha. Uma febre que não cessava em hipótese alguma. Nessa época, eu achei que ia perder minha filha.

Eles nos recomendaram tentar uma vaga em um hospital grande. O pai da minha filha conseguiu uma vaga no [Hospital Universitário] Pedro Ernesto [no Rio de Janeiro]. Chegando lá, a internaram.

Os médicos conversaram comigo, com ela e resolveram intubar por dez dias. Fizeram todos os exames possíveis e quando recebemos o diagnóstico, era lúpus.

Eu não tinha noção do que era, foi desesperador quando falaram que era uma doença autoimune e não tinha cura.

Maria Eduarda teve diagnóstico de lúpus na infância - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Maria Eduarda e a mãe após três meses de internação
Imagem: Arquivo pessoal

Devido à doença, ela teve um processo muito longo. Os rins dela pararam e teve de fazer hemodiálise por um bom tempo. Surgiram vários tipos de doenças além do lúpus, mas sempre com tratamento, várias medicações. Ela ficou internada por quatro meses.

Ela teve trombose, a pele ficou muito ressecada, precisou fazer muitas biópsias para chegar ao diagnóstico. Minha filha praticamente morreu e voltou.

Hoje em dia, os cuidados que temos é com alimentação saudável, não pegar sol e tomar todos os medicamentos. Ela vive uma vida normal, mas não vai à praia, à piscina. A única coisa de que ela tem vergonha hoje é da cicatriz na coxa, por causa da biópsia.

Depois da alta do hospital, ela não teve mais nada. O tratamento é para a vida toda, e ela tem consulta de seis em seis meses, fazendo exames de rotina."

Entenda sobre o lúpus na infância

O lúpus é uma das 80 doenças autoimunes conhecidas atualmente, em que o organismo produz células e anticorpos que agem contra o próprio corpo. No Brasil, estima-se que 65 mil tenham a enfermidade, segundo a SBR (Sociedade Brasileira de Reumatologia).

As causas são desconhecidas, mas uma combinação de fatores pode desencadear o problema, como

  • Hormonais;
  • Genéticos;
  • Infecciosos (bactérias, vírus);
  • Emocionais;
  • Ambientais (raios ultravioleta).

Nas crianças, o lúpus é mais raro e a ocorrência varia de acordo com o país. Segundo a SP-SP (Sociedade de Pediatria de São Paulo), considerando dados internacionais, a incidência é de cerca de 0,3 a 7 pacientes por 100 mil crianças e adolescentes.

Os casos são mais comuns na adolescência —com diagnóstico aos 12 anos de idade, em média— e em mulheres, independente da idade. Por ser autoimune, a doença pode afetar qualquer órgão, então a manifestação não será igual para todas as pessoas diagnosticadas.

Os sinais do lúpus incluem:

  • Queda de cabelo;
  • Afta;
  • Dor articular;
  • Mancha no rosto;
  • Comprometimento renal;
  • Alteração neurológica.

Por se manifestar de formas diversas, o lúpus pode ser de difícil diagnóstico e confundido com outras doenças. Também não há explicação precisa, mas o quadro e as complicações tendem a ser mais graves nas crianças, por isso é importante identificá-lo o mais rápido possível.

"Quando a manifestação é clássica, com mancha em formato de asas de borboleta no rosto, queda de cabelo, afta, é mais fácil de pensar em lúpus se o médico tiver tido essa vivência", comenta o reumatologista pediátrico Leonardo Rodrigues Campos, membro da diretoria da SR-RJ (Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro) e presidente do Departamento Científico de Reumatologia da Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro.

Como diagnosticar o lúpus

Para identificar corretamente o lúpus, o mais importante é o histórico da pessoa, diz Campos. Mas há uma série de procedimentos:

  • Os profissionais da saúde vão conversar com os responsáveis pela criança --e com ela mesma, se for viável-- para identificar sintomas e o que ocorreu até ali;
  • Fazer exame físico completo para avaliar todo o corpo;
  • Realizar exames complementares, laboratoriais e de imagem, para entender quais órgãos estão comprometidos.

Há também exames específicos, mas eles só devem ser feitos quando há indicação. Campos cita o FAN (fator antinúcleo), que identifica anticorpos em casos de doenças autoimunes.

"Mais de 95% dos casos de lúpus estão com FAN positivo, mas esse anticorpo não é específico do lúpus, pode estar presente em outras infecções", alerta o médico. Assim, para pedir esse exame, é necessário ter suspeita forte da enfermidade.

Já as biópsias são realizadas quando ainda restam dúvidas após diferentes exames, mas não é usual, segundo o reumatologista.

Tratamento de lúpus

O lúpus é uma doença crônica, então não se fala de cura por enquanto, mas de controle. São usados, principalmente, imunossupressores, que baixam a ação das células e dos anticorpos que estão atacando o organismo.

Contudo, o medicamento não mira apenas os anticorpos do lúpus; afeta, inclusive, os anticorpos saudáveis que têm o papel de proteger o organismo. Então, a imunidade da pessoa fica mais baixa, o que a deixa mais suscetível a infecções.

Para evitar um efeito danoso, é preciso rastrear antes se o paciente teve infecções como tuberculose. E, ao longo do tratamento, é importante um acompanhamento multidisciplinar.

No dia a dia, para controlar a doença, é necessário evitar fatores que possam desencadear um novo surto:

  • Evitar exposição solar;
  • Usar protetor solar todos os dias, inclusive dentro de casa;
  • Aderir corretamente aos medicamentos e suplementos necessários, como cálcio e vitamina D;
  • Realizar consultas e exames periodicamente;
  • Seguir uma alimentação saudável;
  • Praticar exercício físico;
  • Cuidar da qualidade do sono;
  • Proteger a saúde mental, tanto do paciente quanto da família.