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Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Fígado maior, membros encurtados: série mostra como é viver com doença rara

Lara Moura, 12, tem ASMD, uma doença que faz com que ela seja menor e mais magra do que crianças de sua idade - Reprodução/Globoplay
Lara Moura, 12, tem ASMD, uma doença que faz com que ela seja menor e mais magra do que crianças de sua idade Imagem: Reprodução/Globoplay

Do VivaBem, em São Paulo

31/03/2023 04h00

O fígado de Lara é maior do que deveria ser. Já os músculos de Rafael não se desenvolvem corretamente. Assim como os membros de Davi, que são encurtados. A pele de Theo é frágil. O pulmão de Beatriz tinha "pressão alta". No caso de Miguel, a coagulação do sangue é falha. E os movimentos do corpo de Laissa foram afetados.

As condições, no entanto, não impedem Lara de nadar ou Rafael de jogar bola, nem impossibilitam Laissa de dançar ou Beatriz de completar a faculdade. A rotina e os desafios deles e de outras crianças e jovens que convivem com doenças raras são contadas na série documental "Viver é Raro", que estreia nesta sexta-feira (31) no Globoplay.

Essas doenças afetam uma pequena proporção de indivíduos na população —daí o nome raras. No conjunto, porém, elas acometem um grande número: só no Brasil, é estimado que mais de 13 milhões de pessoas tenham o diagnóstico de alguma doença considerada rara.

"Precisamos levar essa temática para o entretenimento e sensibilizar as pessoas", disse Luciana Pires, produtora-executiva da Cine Group, que participou da produção da série, durante a pré-estreia, que aconteceu no Espaço Itaú de Cinema no Bourbon Shopping (SP), na terça-feira (28/3), e foi acompanhada pelo VivaBem.

Segundo Antoine Daher, presidente da Casa Hunter - Associação Brasileira dos Portadores da Doença de Hunter, que produziu a série, e cofundador da Casa dos Raros, a produção quer ajudar a fomentar o debate sobre políticas públicas de inclusão e tratamento, e tem a missão de "desmistificar a jornada das doenças raras", mostrando as pessoas por trás de suas condições de saúde. A direção é de Sérgio Raposo.

'Você ter que explicar tudo para o próprio médico é cansativo'

Entre as doenças dos protagonistas da série estão a AME (Atrofia Muscular Espinhal), que afeta a capacidade de andar, comer e respirar; a distrofia muscular de Duchenne, condição que causa fraqueza muscular progressiva; e a ASMD (deficiência de esfingomielinase ácida), síndrome que prejudica o crescimento e dificulta a alimentação.

lara - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Levou dois anos e "muitos exames" até que Lara fosse diagnosticada com doença rara, conta sua mãe
Imagem: Arquivo pessoal

Esta última é o caso de Lara Moura, 12. A paulista era um bebê aparentemente saudável até que, aos seis meses de idade, começou a perder peso. Infecções de ouvido e garganta também se tornaram recorrentes, segundo contou sua mãe à reportagem.

"Com 8 meses, ela teve uma infecção gravíssima e, no pronto-socorro, identificaram que o seu fígado era muito alterado para uma criança da idade dela", diz Roberta de Moura. O que aconteceu a seguir é descrito por ela como a "saga do diagnóstico".

Levou cerca de um ano e "muitos exames" para que a criança fosse diagnosticada com ASMD, aos 2 anos. O distúrbio metabólico provoca o acúmulo de fosfolipídios no fígado e em partes do corpo como baço e pulmão, o que pode desencadear desde alterações no tamanho desses órgãos até atrasos no crescimento da criança. A doença é causada por uma mutação genética.

Moura conta que lutou para encontrar informações em português sobre a condição, mas na época elas ainda eram escassas. Ela diz que tentou aprender inglês para ajudar sua filha e afirma que foi desafiador encontrar um médico que estivesse familiarizado com a doença.

Muitas vezes cheguei nos hospitais com minha filha e os médicos perguntavam 'mas o que é isso? como é que se escreve?'. Sei que por um lado é uma doença rara, mas por outro você ter que explicar tudo para o próprio médico é cansativo. Roberta de Moura, mãe de Lara, que tem ASMD

A doença não tem cura e até ano passado não tinha nenhum tratamento específico, apenas cuidados paliativos. Para não prejudicar o fígado, Lara segue uma dieta livre de frituras, doces ou farinha branca. Além disso, também faz natação, seu esporte favorito. "Gosto de água desde pequena", diz ela, que nada desde os 8 meses.

Uma terapia aprovada pela Anvisa em setembro de 2022 trouxe nova esperança. O Xenpozyme (olipudase alfa) é um medicamento que repõe a enzima que as pessoas que têm a doença não produzem naturalmente, por meio de injeções na veia.

Desenvolvido pelo laboratório Sanofi, o medicamento teve eficácia comprovada em testes clínicos, mas por enquanto só circula nas farmácias de alto custo. Os pais de Lara entraram com uma ação judicial para ter direito ao remédio e agora aguardam retorno. "Faz 12 anos que a gente espera pela criação de um tratamento. É uma esperança para a vida da Lara e para todas as crianças que têm a doença", diz Moura.

'Picadinhas de amor'

A família de Davi, 5, também precisou recorrer à Justiça para ter direito a uma alternativa de tratamento para a criança.

davi - Reprodução/Globoplay - Reprodução/Globoplay
Davi, 5, foi diagnosticado aos dois meses com acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo
Imagem: Reprodução/Globoplay

Diagnosticado com acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo, Davi é acompanhado desde os dois meses por uma equipe multidisciplinar para tratar comorbidades relacionadas à condição, como uma deformidade óssea nas pernas que causa dores constantes, e problemas respiratórios.

Além disso, há seis meses a criança faz uso do medicamento Voxzogo, da empresa BioMarin, que foi aprovado pela Anvisa em novembro de 2021 para o tratamento do nanismo. O remédio, que estimula o crescimento ósseo, fez a criança crescer 5.5 cm em seis meses de aplicações, segundo sua mãe.

Arielli Ishii, no entanto, diz ao VivaBem que prefere não falar para o filho que ele está recebendo um remédio para crescer. "Até porque a gente não aplica por esse motivo, mas para trazer uma melhor qualidade de vida para ele", diz ela, que apelidou a terapia de "picadinhas de amor".

Ela diz que não sabe se a estatura de seu filho será maior no futuro, mas que, independentemente disso, ele sempre terá o apoio dos pais. "O que eu gostaria muito é que ele vivesse uma vida sem preconceito e consiga fazer o que quiser."

'Mundo não está preparado para as doenças raras'

Arielli e seu marido Daniel Ishii são conselheiros do Instituto Nacional de Nanismo e auxiliam pais cujos filhos acabaram de receber o diagnóstico de acondroplasia. Eles contam que também vão às escolas para dar palestras sobre a doença.

O mundo não está preparado para as doenças raras, o mundo não é acessível, as políticas públicas não colaboram e ainda tem a questão do preconceito. Então, para nós, a virada de chave é levar informação para as pessoas. Daniel Ishii, pai de Davi, que tem nanismo

A mãe de Lara tem opinião semelhante. Na infância, conta Roberta Moura, a criança ficou constrangida quando não podia usar biquíni devido à distensão de seu abdome. Quando ficou mais velha, enfrentou preconceito de colegas na escola.

Mas sua mãe a ensinou a explicar sua condição aos outros e a ter orgulho de quem ela é. "Ensinei ela a explicar a doença para os coleguinhas, porque o preconceito é consequência da falta de informação."

Muito do que Moura aprendeu sobre a condição que afeta a filha foi com outras mães que também têm filhos com ASMD. Trocar figurinhas com outras mães, diz ela, foi e continua sendo essencial para a família. "A luta é individual, mas a nossa causa é coletiva", diz ela.

familiares - Reprodução - Reprodução
Familiares e alguns dos protagonistas da série se reuniram para o evento de pré-lançamento. Da esquerda para a direita, é possível ver Lara (saia rosa), Laissa (de cadeira de rodas), Davi (no colo de Laissa), Miguel (de óculos) e Rafael (de camisa preta e cadeira de rodas)
Imagem: Reprodução

A expectativa de Daniel Ishii é que, ao difundir informação sobre doenças raras, a série possa ser um "divisor de águas" para as pessoas que têm essas condições e suas famílias.

"Através de vidas reais, com certeza vai trazer mais informação e de certa forma sensibilizar as famílias, os políticos, as pessoas que têm doenças raras, outras enfermidades e as pessoas consideradas 'normais'', diz Ishii.

Quais são as doenças dos 7 protagonistas da série?