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O que acontece no seu corpo quando você para de beber álcool

Arte UOL
Imagem: Arte UOL

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

11/04/2023 04h00Atualizada em 18/05/2023 15h13

Uma semana sem álcool. Um janeiro seco. Beba só nos finais de semana. Beba menos, seja o seu melhor. Estas frases são exemplos de slogans utilizados em campanhas de saúde idealizadas em diferentes partes do mundo para estimular a redução do consumo de bebidas alcoólicas. Diante dessas, a ordem é adotar aquela regra onde o menos vale mais.

Prejudicial para todos, independente da idade, sexo, gênero, etnia, tolerância ou estilo de vida, o álcool se relaciona com mais de 200 doenças diferentes. Isso significa que, ao investir na abstinência ou na redução de seu consumo, você fica fora de uma estatística que conta 3 milhões de mortes por ano resultantes do seu uso inadequado em todo o mundo.

Esse dado representa 5,3% de todas as mortes.

43% da população com idade superior a 15 anos consumiram a bebida no último ano.

14 anos é a idade na qual os adolescentes tomam a primeira dose nas Américas.

Cerca de 13,5% do total de óbitos são atribuíveis a ele, na faixa de 20 a 39 anos.

1 em cada 12 adultos (8,2%) nas Américas tem transtornos relacionados, quase o dobro da média mundial (5,1%).

A região tem maior prevalência de transtornos relacionados ao álcool em mulheres, e a segunda maior entre homens.

O que você ganha com isso

As evidências científicas sobre a relação existente entre a abstinência ou a moderação do consumo de álcool e a reversão dos impactos negativos da substância em todo o corpo são bastante estabelecidas.

No curto prazo, além do sumiço das ressacas, é comum observar uma melhora nos níveis de energia, da hidratação, do aspecto da pele, além de mudanças no peso, já que haverá menor consumo de calorias.

A longo prazo, os lucros são distribuídos por todos os sistemas do organismo, destacando-se:

  • Mais saúde para o fígado
  • Menor risco de pneumonia
  • Melhora da performance sexual
  • Prevenção e controle de doenças cardiovasculares
  • Blindagem contra alguns tipos de câncer
  • Mais saúde para o feto
  • Cérebro afiado

Você se livra de doenças hepáticas

Entre todos os órgãos afetados pela ingestão exagerada do álcool, o fígado é o que mais sofre. A razão para isso é que ele é responsável por 97% do metabolismo do álcool.

O restante é eliminado pelo suor, pela urina e a respiração. Ele também é o responsável pela eliminação de toxinas ingeridas ou produzidas pelo organismo.

Os danos são progressivos, e começam com a formação de gordura no fígado. Se o consumo continua, aparece a esteato-fibrose.

De 10% a 35% desses quadros evoluirão para a hepatite alcoólica; a partir deste estágio, 40% a 60% dos pacientes terão cirrose hepática com suas complicações —hemorragia, ascite, a popular barriga d'água, encefalopatia—, além do risco de 2% a 4% ao ano de desenvolver tumor no fígado.

O tempo desse processo é de 10 a 15 anos.

As mulheres metabolizam o álcool de forma diferente da dos homens e ainda possuem mais gordura corporal. Esses fatores fazem delas mais suscetíveis aos danos.

Com a abstinência, porém, a gordura do fígado e a hepatite alcoólica são frequentemente reversíveis, e há aumento nas taxas de sobrevida nos quadros da inflamação persistente e cirrose.

Você, enfim, consegue respirar fundo

O álcool é considerado um fator de risco para pneumonias adquiridas fora dos hospitais. E basta ingerir de 10 g a 20 g de álcool diariamente para somar 8% a mais do risco de ficar doente. Os dados foram publicados pelo periódico British Medical Journal.

Relatório da OMS indica que, para além da doença, a substância também atrapalha o tratamento, o que eleva a chance de óbito.

Você tem mais facilidade para entrar no clima

As pesquisas médicas já confirmaram a relação positiva entre abstinência do álcool e melhora da disfunção erétil —especialmente quando não há lesões no fígado, o paciente é jovem e o período de tempo do consumo do álcool é menor, assim como o número de doses consumidas diariamente. Os dados foram publicados no The Journal of Sexual Medicine.

A expectativa, entre todos os gêneros, é que as bebidas alcoólicas sejam capazes de esquentar a vida sexual.

A realidade é que exageros levam à ejaculação precoce, disfunção erétil, insatisfação com o orgasmo e à perda da libido.

A disfunção erétil é a queixa mais comum.

Mais desinibidas, as pessoas fazem sexo desprotegido ou com múltiplos parceiros, e ainda podem se ver forçados a essa prática, o que as expõe a outros riscos, como ISTs (infecções sexualmente transmissíveis).

Você mantém o coração em bom estado

Parar de beber ajuda na prevenção e no controle da hipertensão (pressão alta), fibrilação atrial, insuficiência cardíaca, AVC (acidente vascular cerebral), além de alterações na pressão sistólica e diastólica (contração e relaxamento) do coração.

Todos esses quadros estão relacionados à ingestão excessiva de bebidas alcoólicas.

Os grandes vilões nessas situações são o etanol e o acetildeído, a primeira reação metabólica ao álcool promovida pelo organismo.

Deficiências de nutrientes e níveis aumentados de toxinas no corpo aceleram esses resultados.

Ao longo do tempo, o músculo do coração enfraquece (cardiomiopatia alcoólica).

O aumento de risco de morte por hipertensão é de 7%.

A pressão aumentada ainda pode levar a danos nos rins.

A doença cardíaca hipertensiva foi a principal causa de morte decorrente do uso do álcool entre as brasileiras em 2020. Os dados são da Cisa.

Você passa longe dos tumores

Há décadas o álcool foi classificado como cancerígeno pela Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer. E ele está no mais alto grupo de risco, que inclui o tabaco e a radiação.

Uma série de fatores influenciam nesse sentido, desde alterações indiretas no DNA até sinergia com outros agentes causadores da doença. Além disso, o álcool reduz os níveis de oxidantes (vitaminas A, E, zinco e ferro, do complexo B, ácido fólico e tiamina), e ainda enfraquece as defesas do corpo.

Garganta, pulmão, esôfago, estômago, reto, fígado e mamas são os órgãos mais afetados.

Entre as mulheres, mesmo o consumo de pequenas quantidades parecem potencializar o risco para o câncer de mama.

De modo geral, a relação entre tumores e álcool é dose dependente. Quanto mais se consome, maior é o risco.

Você garante o bom desenvolvimento do seu bebê

Uma das proibições absolutas entre mulheres grávidas é o consumo de álcool. É que a substância pode resultar em transtornos do espectro alcoólico fetal, um conjunto de deficiências físicas, mentais e comportamentais. A síndrome alcoólica fetal e o transtorno de neurodesenvolvimento são exemplos.

Crianças que vivem em instituições, unidades para menores infratores ou que recebem educação ou atenção clínica especializadas têm de 10 a 40 vezes mais risco de apresentar o problema comparado à população em geral.

Basta beber 60 g de álcool por semana, ou mais de 30 g em apenas duas ocasiões na gravidez.

Possíveis sintomas no bebê: alterações faciais, no crescimento, no SNC (sistema nervoso central) —como perímetro cefálico reduzido e convulsões não relacionadas a febre.

Dificuldades de percepção, aprendizagem, memória, atenção, regulação do humor e controle do comportamento também podem estar presentes.

Você joga a favor do seu cérebro

Quando o assunto é a saúde cerebral, não existe consumo seguro em todas as faixas etárias. Deixar de beber tem como efeito imediato a redução dos seguintes quadros:

  • Dor de cabeça (incluindo enxaqueca)
  • Mudanças no sono
  • Deficiências cognitivas (redução da atenção, controle, julgamento, concentração, etc.)
  • Perda da memória e apagões
  • Intoxicação (deficiências psicomotoras)
  • Perda das funções básicas --uma overdose pode desacelerar a respiração, o coração, etc.

A longo prazo, podem ser observadas a melhora de sintomas e condições:

  • Sono, humor e de doenças psiquiátricas (ansiedade e depressão)
  • Pensamentos suicidas e suicídio
  • Demência (que pode ser precoce)
  • Dependências
  • Perda de funções executivas como raciocínio, planejamento, controle inibitório, etc.

Mesmo bebendo menos, o risco permanece

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Imagem: iStock / Getty Images

É verdade que muitas pesquisas concluem que o consumo de pequenas quantidades de álcool ajuda a prevenir o diabetes, a doença isquêmica do coração, a demência e até o declínio cognitivo. O fato é que, até agora, não ficou esclarecido o quanto seria essa quantidade capaz de promover a saúde.

De olho nos malefícios que o álcool tem causado em todo o mundo, as mais importantes autoridades sanitárias, incluindo a OMS, reconhecem que não dá para se falar em volume seguro de álcool porque não se pode saber como cada organismo reagirá à substância.

Tenha em mente que o álcool é considerado uma substância psicoativa com potencial de causar dependência, e tem impacto negativo sobre o organismo.

A regra de ouro para quem deseja preservar a saúde é abster-se do álcool.

Um consumo moderado, que é considerado de baixo risco, corresponderia a 1 dose para mulheres, e até 2 para homens ao dia.

Cada dose padrão de bebida contém o equivalente a 10 g/14 g de álcool puro, o que corresponde a: 1 copo de cerveja (255 ml); 1 taça de vinho (100 ml); 1 dose de destilado (30 ml).

Nas Américas, 25% da população geral reconhece que consome mais de 60 g de álcool puro (cerca de 6 doses padrão para homens) e mais de 40 g de álcool puro (mais de 4 doses para mulheres), pelo menos uma vez por mês, o que caracteriza o chamado beber excessivo episódico.

Coloque uma meta, só não vale dobrá-la!

Se você se animou com as vantagens de cortar ou reduzir o álcool, adote as seguintes medidas:

Conte quantas doses consome a cada semana e vá reduzindo gradualmente, até conseguir não exceder os limites que representam menor risco para a saúde.

  • Quando estiver bebendo, beba mais devagar.
  • Ingira mais água enquanto bebe.
  • Para cada bebida alcoólica, tome outra sem álcool.
  • Coma antes e durante o consumo ou prefira beber somente durante o jantar.
  • Observe o rótulo das bebidas e prefira as que possuam menor teor alcoólico.
  • Varie as opções de lazer. Sair para beber com os amigos não precisa ser sua única opção.

Fontes: Aguinaldo Nardi, urologista e professor do curso de medicina da FOB-USP (Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo); Alan Luiz Eckeli, professor de neurologia e medicina do sono na FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo); Patrícia Brunfentrinker Hochgraf, psiquiatra especialista em dependência química, coordenadora do Programa da Mulher Dependente Química do Instituto de Psiquiatria do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo); José Milton de Castro Lima, hepatologista preceptor dos programas de residência em clínica médica e gastroenterologia do HUWC-UFC (Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares). É também professor titular da mesma universidade. Revisão médica: José Milton de Castro Lima.

Referências:

  • Ministério da Saúde
  • Cisa (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool)
  • Opas (Organização Panamericana da Saúde)
  • OMS (Organização Mundial da Saúde)
  • CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
  • Paradis, C., Butt, P., Shield, K., Poole, N., Wells, S., Naimi, T., Sherk, A., & the Low-Risk Alcohol Drinking Guidelines Scientific Expert Panels. (2023). Canada's Guidance on Alcohol and Health: Final Report. Ottawa, Ont.: Canadian Centre on Substance Use and Addiction
  • Karunakaran A, Michael JP. The Impact of Abstinence From Alcohol on Erectile Dysfunction: A Prospective Follow up in Patients With Alcohol Use Disorder. J Sex Med. 2022 Apr;19(4):581-589. doi: 10.1016/j.jsxm.2022.01.517. Epub 2022 Feb 27. PMID: 35236641
  • Iranpour A, Nakhaee N. A Review of Alcohol-Related Harms: A Recent Update. Addict Health. 2019;11(2):129-137. doi:10.22122/ahj.v11i2.225
  • Simou E, Britton J, Leonardi-Bee J. Alcohol and the risk of pneumonia: a systematic review and meta-analysis. BMJ Open. 2018;8(8):e022344. Published 2018 Aug 22. doi:10.1136/bmjopen-2018-022344