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Ela viveu com diagnóstico errado de mioma por 3 anos até descobrir câncer

Juliana Santiago tem câncer raro no útero - Arquivo pessoal
Juliana Santiago tem câncer raro no útero Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para VivaBem

20/04/2023 04h00

Durante três anos a jornalista Juliana Santiago conviveu com o diagnóstico errado de mioma após passar em diversos médicos. Em 2022, ela foi submetida a uma cirurgia que retirou todo o seu útero e um tumor maligno de 12 cm.

Aos 32 anos, Juliana descobriu ter um câncer raro no útero, chamado leiomiossarcoma uterino, que se espalhou para outras partes do corpo, incluindo rim, pulmões e panturrilha. Atualmente, ela segue em tratamento, diz estar confiante, mas deseja alertar outras pessoas com sua história. A seguir, leia o depoimento dela:

"Sempre tive o hábito de uma vez por ano fazer check-up e exames ginecológicos. Em 2019, um ultrassom transvaginal constatou um caroço de 2 cm no útero que foi considerado um mioma. O médico explicou que não era grave, mas me orientou a repetir o exame anualmente para acompanhar o tamanho. Na época, estava desempregada e fazia as consultas e os exames pelo SUS.

Em 2020, um novo ultrassom apontou que o mioma tinha crescido 2 cm. Nesse mesmo ano, percebi que meu fluxo menstrual ficou mais intenso e longo que o normal.

Voltei a tomar anticoncepcional contínuo para conter a menstruação, o que funcionou por um tempo. Em 2021, não consegui fazer os exames por conta da pandemia.

Em março de 2022, já empregada e com plano de saúde, procurei um ginecologista porque apresentei novos sintomas. Passei a sentir cólicas, ter escapes menstruais e um inchaço e volume na barriga como se estivesse no início de uma gestação.

Fiz novos exames, o médico perguntou se havia histórico de câncer na família, mas desconhecia essa informação. Ele confirmou o diagnóstico de mioma intramural —que já estava com 9 cm— e disse que meu caso era cirúrgico.

Juliana Santiago tem câncer raro no útero - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Como manifestei ao ginecologista meu desejo de engravidar a curto prazo, ele me orientou a procurar um profissional que fizesse o procedimento por laparoscopia, porque ele só fazia a cirurgia aberta.

Passei com uma outra ginecologista, ela confirmou o diagnóstico e pediu para eu levar o meu caso para outras duas especialistas em reprodução humana avaliarem, mas o convênio não cobria a consulta com elas.

Fui a mais uma ginecologista, dessa vez indicada pelo meu convênio. A médica viu os exames, me examinou e apalpou meu útero. Ela disse que havia algo de estranho e desconfiou que aquele mioma na verdade poderia ser um tumor.

Ela comentou que esse poderia ter sido o motivo pelo qual os outros médicos que me atenderam não quiseram me operar.

A ginecologista me receitou um remédio, me orientou a buscar a avaliação de um oncologista e pediu para eu retornar com ela depois. Na hora, pensei: 'Não é possível que esteja com câncer há três anos e ninguém descobriu até agora'.

Juliana Santiago tem câncer raro no útero - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Não ignorei o alerta da médica, até ia marcar com o onco, mas foquei em tentar pegar a medicação pelo SUS, não consegui e acabei pagando R$ 2.000.

Nesse período, o sangramento piorou a ponto de eu expelir grandes coágulos. Já tinha tentado de tudo para segurar o vazamento, absorvente noturno, absorvente de pano, calcinha absorvente, coletor menstrual, mas nada segurava. Manchava o lençol, a cadeira, era constrangedor. Passei a não sair de casa, apenas para ir ao médico.

Fui três vezes ao pronto-socorro, na terceira vez dei entrada no hospital suando frio de dor, com muita cólica e hemorragia. Meu útero estava tão grande que eu parecia uma grávida de cinco meses.

Fiquei internada e fiz uma bateria de exames. O médico disse que eu faria a cirurgia de retirada do mioma, mas me alertou que durante o procedimento havia a possibilidade de eu perder o útero.

Morria ali o sonho de um dia gerar um bebê, fiquei triste, mas tive que aceitar.

Três dias depois, no dia 18 de agosto de 2022, fui submetida a uma histerectomia [retirada do útero] de emergência. Junto com o meu útero foi retirado não um mioma, mas um tumor de 12 cm. Uma semana depois, o resultado da biópsia apontou que eu tenho um tipo de câncer agressivo e raro, chamado leiomiossarcoma uterino (neoplasia maligna do corpo do útero).

Juliana Santiago tem câncer raro no útero - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Além disso, foram encontrados pequenos nódulos nos pulmões e um no rim direito, ou seja, o câncer já se espalhou para outras regiões do corpo. Receber essa notícia aos 32 anos de idade foi como uma bomba, fiquei em choque. Em dezembro de 2022 foi constatada uma nova metástase na panturrilha esquerda.

Em cinco meses de tratamento, já fiz 5 ciclos de quimioterapia, 5 sessões de radioterapia e vou retomar a químio.

Provavelmente terei que fazer mais duas cirurgias para retirada dos nódulos do rim e da panturrilha, mas tudo é um processo e estou sempre acreditando que tudo vai dar certo para não desanimar.

Após três anos lidando com o diagnóstico errado de mioma, meu sentimento é de ter sido negligenciada, passei em pelo menos 6 médicos e todos disseram a mesma coisa.

Acredito no poder da informação e na importância de se descobrir qualquer tipo de câncer antes que ele piore e não aconteça com outras pessoas o que aconteceu comigo.

Pensamentos do tipo: 'vou morrer' não me abalam mais, o diagnóstico de câncer é mais comum do que imaginamos e é preciso encarar de cabeça erguida. A jornada é difícil, mas tenho fé. Minha vontade é a de lutar e de fazer tudo que preciso para vencer."

O que é o leiomiossarcoma?

Juliana Santiago tem câncer raro no útero - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

O leiomiossarcoma é um tumor maligno de musculatura lisa e pode ter origem em qualquer lugar do corpo, sendo mais comum em membros, no retroperitônio [região atrás do intestino] e no útero, inclusive pode atingir homens e mulheres.

Não há dados sobre a incidência da doença no Brasil, mas nos EUA a estimativa é de menos de 2.000 casos por ano.

No caso do corpo do útero, os sarcomas representam menos de 5% dos cânceres; leiomiossarcoma é o mais frequente entre os sarcomas de útero (60% dos sarcomas uterinos).

Os sarcomas são tumores malignos raros originados nos tecidos de sustentação como músculo, ossos e cartilagens.

A causa pode estar relacionada ao histórico de radioterapia na pelve e a síndrome hereditária de câncer, chamada síndrome de Li-Fraumeni, em que há risco aumentado do desenvolvimento de diversos tipos de câncer durante a vida, incluindo os sarcomas.

Os sintomas do leiomiossarcoma uterino estão relacionados ao seu crescimento e incluem dor, alteração de hábito urinário ou intestinal e sangramento vaginal.

Confusão com miomas. O leiomiossarcoma pode ser confundido com miomas e não há nenhum método de imagem realmente bom que possa diferenciar os dois antes da cirurgia.

Miomas são nódulos benignos muito comuns, também originados na camada muscular do útero (miométrio), mas é importante ressaltar que não se transformam em sarcomas.

Quando as mulheres são operadas por aumento do volume uterino devido aos miomas, o risco de ser sarcoma é menor que 0,5%.

Tratamento inicial: retirada do útero e, em alguns casos selecionados de pacientes jovens, é possível manter os ovários. Quando há sinais da doença fora do útero, o tratamento segue com quimioterapia e radioterapia na pelve.

O leiomiossarcoma tem cura, desde que diagnosticado como doença inicial e restrita ao útero. Infelizmente, é comum um comportamento mais agressivo, com metástase principalmente no pulmão e no fígado, mesmo nos estágios iniciais.

Fonte: Glauco Baiocchi Neto, diretor do Departamento de Ginecologia Oncológica do A.C.Camargo Cancer Center (SP) e presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos.