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Falta de Ozempic nas farmácias: 'Fico brava de não encontrar o remédio'

Natália trata o diabetes tipo 2 com o Ozempic desde janeiro e relata dificuldades para encontrá-lo - Acervo pessoal
Natália trata o diabetes tipo 2 com o Ozempic desde janeiro e relata dificuldades para encontrá-lo Imagem: Acervo pessoal

Do VivaBem, em São Paulo

02/05/2023 04h00

O Ozempic, remédio para tratar o diabetes tipo 2, virou alternativa ao emagrecimento estético. A medicação, uma caneta para aplicar na pele, pode ser comprada sem receita médica e isso aumentou a demanda pelo fármaco com o objetivo de perder peso.

Enquanto isso, pacientes com diabetes tipo 2 convivem com a escassez do medicamento nas farmácias. A moradora da zona leste de São Paulo Natália Galvão, 32, que usa o Ozempic como tratamento para diabetes desde janeiro, diz fazer uma "peregrinação" com o marido para encontrá-lo.

Antes, ela usava o Saxenda, mas as picadas diárias lhe causavam irritações na pele —o Ozempic tem aplicação semanal. O tratamento foi revolucionário, afirma. Ela, que ganhou o apelido de Brisa dos amigos por ser muito avoada, teve outro ânimo para viver. "[Antes] eu não estava funcionando. Estava muito mal e nem sabia", diz.

Ela foi avisada sobre a alta procura do Ozempic desde que começou a usá-lo e, por isso, sai em busca da medicação sempre uma semana antes de a caneta acabar.

Eu percebo que existe um padrão das balconistas. Elas perguntam se quero a caneta de 1 mg ou a menor. Quando digo que tomo a de 0,25 mg, elas falam: 'Que alívio, porque a maior es em falta, que é a que usam para emagrecer'. Natália Galvão, que usa Ozempic para tratar o diabetes tipo 2

Natália também conta ter sido aconselhada a expor o Ozempic com cautela, pois relatos de roubo não são raros.

Para que o Ozempic serve

O Ozempic é um remédio à base de semaglutida, substância que simula a ação do hormônio GLP-1, produzido no intestino e que regula a glicemia e nossas respostas de saciedade.

É uma injeção em formato de caneta para aplicação semanal, disponível em três dosagens: 0,25 mg, 0,50 mg e 1 mg —as duas primeiras, que Natália toma, são vendidas juntas.

O GLP-1 aumenta o volume de insulina no pâncreas, e isso ajuda a controlar os níveis de glicose do sangue. O remédio faz o pâncreas secretar o hormônio de acordo com o nível glicêmico, o que impede que a pessoa tenha hipoglicemia.

Já emagrecer é um efeito natural, porque o remédio age em receptores do sistema nervoso central para controlar o apetite e retarda o esvaziamento gástrico (como se a pessoa ficasse mais tempo com a comida no estômago).

Medicações com semaglutida são consideradas revolucionárias para o controle do diabetes tipo 2 e da obesidade. Isso é impulsionado pelos seus bons resultados nos estudos e pelo nível de segurança, com perfil de efeitos colaterais moderados. Para a obesidade, entretanto, o uso ainda não está aprovado no Brasil.

O Ozempic custa entre R$ 994,03 e R$ 1.308,32. Os valores, da tabela da CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos), são deste mês e variam conforme a alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de cada estado.

O grande problema é que são remédios caros, então toda a discussão é para uma parcela pequena da população. Bruno Halpern, endocrinologista e presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica)

"Eu me sinto mal, mole"

Natália chegou a ficar sem a medicação por duas semanas e cinco dias. Estava em uma cidade no interior de São Paulo, para onde ela e o marido se mudam neste mês. Na viagem, esqueceu de levar o remédio e ficou em pânico.

"É péssimo [ficar sem o Ozempic]. Fica tudo muito estranho, eu me sinto mal, mole. Parece que eu não existo quando fico sem, me sinto uma 'batata'. Mexo com água, e a unha começa a partir, sangrar. Só fico tranquila quando compro de novo", afirma.

Com a mudança marcada, fez um trato com a farmácia local para já encomendar a próxima caixa sempre que receber uma nova. É o jeito para evitar ficar sem o remédio.

Mesmo com a dificuldade em encontrar a medicação, Natália diz ponderar esses sentimentos. Entende que a busca pelo Ozempic para emagrecer muitas vezes está ligada à ânsia para atingir padrões de beleza ditados pela sociedade, sobretudo às mulheres.

Fico brava de não encontrar o remédio, ao mesmo tempo que fico muito triste. Porque sei que a maioria das pessoas em busca dele são mulheres, muitas vezes desesperadas e humilhadas, que sofrem pressão do trabalho ou da família para entrar nesse padrão que nunca está perfeito. As pessoas falam sobre a romantização da obesidade. Se fosse isso, estariam atrás de caneta para engordar, e não para emagrecer. Natália Galvão

Risco de desabastecimento do Ozempic no Brasil

Em fevereiro, a Novo Nordisk emitiu um comunicado falando sobre o risco de desabastecimento do remédio neste semestre no Brasil.

Ao VivaBem, a endocrinologista Marcela Caselato, gerente médica da farmacêutica, disse existir uma falha "intermitente" no Brasil para a caneta de 1 mg. Esse cenário é global, explicou.

Por aqui, a expectativa é normalizar o abastecimento até o final de junho.

O laboratório também afirmou não conseguir monitorar os perfis de compra dos pacientes —aqueles com diabetes, obesidade ou que buscam o remédio por estética.

O que fazer se não achar a medicação? Pessoas com diabetes tipo 2 que não encontram o Ozempic precisam ajustar com o seu médico outras opções medicamentosas. A transição de tratamento deve ser feita sempre por um profissional.