Após parto, ela quebrou a perna e descobriu que era um câncer metastático
Leidiane Rodrigues Silva, 35, estava grávida quando começou a sentir uma forte dor na perna. Logo após o parto, a dor aumentou muito e ela quebrou o fêmur.
Após diversos exames, foi descoberto um câncer de mama metastático, que já havia afetado os ossos. Hoje, após sessões de quimioterapia e radioterapia, e com o câncer controlado, ela relembra o medo que tinha de não conseguir ver a filha crescer. Abaixo, ela conta sua história:
"Engravidei em fevereiro de 2021, com 34 anos, e depois de três meses fui fazer o ultrassom morfológico para ver como a minha bebê estava. Durante o procedimento recebi a primeira notícia difícil, de que a minha filha tinha gastrosquise, condiação em que a parede da sua barriga parecia exposta.
Como sou católica e muito ligada à Nossa Senhora, me agarrei a ela a partir daquele momento.
Tirando esse problema da Sara, que a gente não sabia quais eram os efeitos, não sentia nada. Com o acompanhamento médico durante a gravidez, descobrimos que, o que antes foi diagnosticado como gastrosquise, era, na verdade, onfalocele —como se fosse uma hérnia com uma parte pequena do fígado.
Em setembro, com sete meses de gestação, comecei a sentir uma dor na perna direita e minha médica achava que podia ser a posição da bebê, que estava sentada dentro da minha barriga. Porém, a dor aumentou tanto que, no final de outubro, eu já não andava muito, só o necessário.
Tive a minha filha com 38 semanas e cinco dias e meu parto ocorreu dentro do planejado. Assim que minha filha nasceu, perceberam que a abertura na barriguinha dela era muito menor do que esperavam. Para tratar isso, ela ficou dois dias em observação para depois passar por uma operação.
Apesar deste alívio, minha perna voltou a doer ainda mais quando o efeito da anestesia do parto passou. Foi tentando andar para tomar o meu primeiro banho que senti um osso do meu corpo quebrando. Caí gritando e berrando, ali foi o pior momento de dor.
Todos os medicamentos que me davam não diminuíram aquela sensação angustiante. Até que um anestesista me deu morfina e eu pude, finalmente, descansar.
Mesmo com tudo isso acontecendo, o que mais me preocupava era que minha filha estava na UTI neonatal. Isso me machucou muito, ainda é difícil relembrar estes momentos. Queria ir até ela, mas não conseguia nem sair da cama.
Foi meu marido, Filippe Teixeira, que a acompanhou durante os dias de internação, enquanto me recuperava. Ele queria ficar comigo, mas preferi que ficasse com a Sara. Só fui vê-la dois dias depois que ela nasceu, ainda com dor.
Para que pudessem encontrar a origem do meu desconforto, fiz diversos exames, mas ainda ninguém me falava o que eu tinha. Só fui descobrir quando troquei de ala no hospital e percebi que meu tratamento era para fêmur fraturado.
Foi depois de uma ressonância e uma tomografia que entenderam que a fratura da minha perna tinha sido causada por um câncer de mama —um diagnóstico grave para uma mulher da minha idade na época. Também me contaram que a minha perna seria operada.
O tumor, HER2+, era bem pequeno e se alimentava por hormônios. Como engravidei, não sabemos se já o tinha antes da gestação ou se surgiu durante e acabou evoluindo por conta dos hormônios que eu estava produzindo.
Mas foi ainda mais difícil digerir a notícia quando me contaram que o câncer de mama era metastático. O que significava que as células cancerígenas haviam caído na corrente sanguínea e se espalhado pelo início da coluna, bacia, fêmur e fígado.
Como já perdi uma pessoa muito próxima, que era como uma segunda mãe, por metástase, pensava que também não ia sobreviver —mesmo sabendo que o tipo HER2+ respondia muito bem ao tratamento e que os pacientes tinham uma sobrevida de muitos anos.
Depois da minha cirurgia na perna, tive qualidade de vida de novo, voltei a ir ao banheiro sozinha e parei de usar fralda. Mas ainda chorava por causa do diagnóstico e tinha um medo absurdo de não ver minha filha crescer.
No dia 8 de dezembro, depois de 28 dias internadas, eu e Sara saímos do hospital juntas. Embora feliz de estar voltando para casa, foi difícil não conseguir cuidar dela no primeiro mês. Não dei o primeiro banho e não acordava junto com o meu marido de madrugada para acolhê-la e ainda não pude amamentá-la por conta do meu tratamento.
Além de lidar com estas emoções, também me sentia um peso dentro de casa, por estar com dificuldades de me locomover sozinha. O que me ajudou nessa fase foi uma muleta com amortecedor, produzida pelo meu irmão, engenheiro mecânico.
As coisas começaram a melhorar com o início da quimioterapia. Minha primeira sessão foi no final de dezembro e em janeiro eu já pude, aos poucos, voltar a andar e pegar a Sara no colo. Claro que não fazia tudo 100%, mas já era possível colocar ela para dormir, por exemplo.
A queda do meu cabelo começou no final de janeiro, mas só em meados de fevereiro maços e maços começaram a cair. Tive muito medo desse momento, mas eventualmente me acostumei com o uso do lenço.
Depois de três meses de quimioterapia, em março de 2022, ao levar o resultado do exame PET Scan mais recente, meu oncologista me avisou que eu só teria mais um ciclo de tratamento para realizar, pois o exame revelou que o número de células cancerígenas ativas havia diminuído.
Por outro lado, meu fêmur ainda fazia com que mancasse um pouco. Como a primeira operação foi apenas para ajudar o osso a se calcificar e se reconstruir, para reestruturar a região, tive que fazer 5 sessões de radioterapia em abril.
Esta medicação agiu até junho e depois voltei a mancar novamente, pois a placa que haviam colocado no início tinha quebrado, resultando em outra cirurgia para a implantação de uma prótese.
Hoje, já estou me recuperando e ando normal. Continuo com um tratamento chamado hormonioterapia, que não é tão agressivo, e também tomo algumas injeções para paralisar o fluxo hormonal e me deixar na menopausa.
O PET scan que fiz em janeiro deste ano não captou mais nada, ou seja, não tenho mais nenhuma célula cancerígena ativa no corpo. O que tenho são microcélulas que estão paralisadas e que nem os exames pegam de tão pequenas que estão.
Depois de toda essa reviravolta, vejo que a doença veio para me desacelerar. Eu era muito preocupada com metas e planos e achava que o meu tratamento ia ser igual, com uma data de começo e de fim, mas entendi que cada processo tem seu tempo.
O auxílio que recebi, durante os dias no hospital e em casa, de meus pais, irmão e marido é algo que jamais vou esquecer e pelo qual serei eternamente grata.
Além deles, recebi muito apoio de outros familiares, amigos e muitos desconhecidos. Meu irmão chegou a fazer um grupo de oração no WhatsApp com várias pessoas. Tem gente que rezou por mim que não conheço e nunca vi. Espero que através deste texto consiga avisá-las que estou bem e agradecer por todo o apoio."
Como a metástase pode impactar os ossos?
A metástase acontece a partir do câncer, que é uma célula que desenvolve um defeito genético e se multiplica de forma desordenada em uma região.
Eventualmente, uma dessas células se desprende, se separando das outras, e entra no vaso sanguíneo ou vaso linfático. Ela, então, percorre o corpo e se instala em outro local, onde volta a se multiplicar e formar um novo nódulo. Entretanto, nem todo câncer irá apresentar essa capacidade da célula se desprender do nódulo primário.
A metástase apresenta a capacidade de enfraquecer órgãos e estruturas do corpo. Quando ocorre em ossos importantes para a sustentação do peso do corpo, pode ainda causar uma quebra.
"No caso da Leidiane, como aconteceu no fêmur, uma área de sustentação, ela acabou sofrendo uma fratura e isso acendeu o alerta para o diagnóstico. Mas nem sempre isso acontece, é até raro", explica Victor Machado, oncologista clínico da Dasa Oncologia e médico do Complexo Hospitalar de Niterói (RJ), que acompanhou o diagnóstico e tratamento de Leidiane.
"É muito possível um paciente com metástase se recuperar. No caso do câncer de mama, a gente avançou no tratamento nos últimos anos. Estão muito eficientes, com uma recuperação que costuma ser muito boa e, dependendo do subtipo, muito rápida", completa o médico.
Uma pesquisa realizada pelo A.C.Camargo Center (SP) analisou 5.000 mulheres, entre os anos 2000 e 2012, e concluiu que, em pacientes com metástase, a taxa de sobrevida em cinco anos saltou de 20,7% para 40,8% no período estudado. Para tumores detectados em estágio inicial, a taxa chega a 98,7%.
Outras fontes consultadas: Tânia Mara de Queiroz, tocoginecologista que acompanhou a gravidez e o parto de Leidiane; Rosana Simões, mastologista do Hospital Santa Izabel (BA); e Gabriela Arruda, mastologista do Hospital Santa Izabel (BA).
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