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Longevidade

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Gêmeas de 85 anos caminham juntas há mais de 1 década 'para dia dar certo'

As gêmeas idênticas Maria Tereza de Oliveira Garzel e Maria do Carmo de Oliveira Silva - Arquivo pessoal
As gêmeas idênticas Maria Tereza de Oliveira Garzel e Maria do Carmo de Oliveira Silva Imagem: Arquivo pessoal

Helena Carnieri

Colaboração para VivaBem

09/07/2023 04h00

Todas as manhãs, as gêmeas idênticas Maria Tereza de Oliveira Garzel e Maria do Carmo de Oliveira Silva, de 85 anos, caminham juntas pelo pátio do condomínio onde moram, em Curitiba.

Elas saem de seus apartamentos antes do sol nascer, porque acordam cedo e preferem cochilar de tarde. Cada uma parte num sentido e vão indo, em seu passo lento e constante, até se encontrarem para continuar a jornada. Nunca falta assunto no trajeto, num hábito que já dura 12 anos e dura, por dia, 1 hora.

Quem começou foi Maria Tereza. Ela passou a fazer caminhadas quando se aposentou como professora, na casa dos 50 anos —nessa época, ainda sem a companhia da irmã Maria do Carmo.

"Quando fui ao ginecologista, todos os exames deram ruins, e a ordem foi caminhar. Obedeci, e ainda aproveitei para seguir o conselho do meu filho, que trouxe um panfleto sobre tai chi chuan de São Paulo. Depois de um ano já estava tudo no lugar", comemora Maria Tereza. Ela nunca mais parou o exercício, e quando foi morar no mesmo condomínio da irmã, ganhou companhia.

Naturais de Joaquim Távora, no norte do Paraná, as gêmeas contam que, na infância, eram muito levadas e não paravam em casa. Nas férias, passavam longas temporadas na fazenda do avô, onde viviam em cima de árvores, andavam a cavalo, entravam em rio e nunca ficavam doentes. "Ninguém lavava fruta, não tinha televisão, era tudo muito mais natural", contam.

Outra boa lembrança das gêmeas foi o período de 12 anos vivido num internato em Ponta Grossa (PR), onde as freiras cuidavam muito da alimentação e, a cada intervalo, traziam bolas e cordas para todas fazerem exercícios físicos.

Hora da fofoca

Para Maria Tereza, quando não caminha, parece que "nada no dia dá certo". E elas aproveitam para socializar, e muito. "A gente coloca o papo em dia nas caminhadas, tanto que a família diz que a orelha de todo mundo fica queimando", brinca Maria do Carmo.

"A gente lembra muita coisa da infância e das artes que fazíamos juntas. Chegamos a trocar de namorado algumas vezes", ri Maria Tereza.

As gêmeas idênticas Maria Tereza de Oliveira Garzel e Maria do Carmo de Oliveira Silva - Glauco Machado de Araújo/Arquivo pessoal - Glauco Machado de Araújo/Arquivo pessoal
Imagem: Glauco Machado de Araújo/Arquivo pessoal
Glauco Machado de Araújo/Arquivo pessoal (450x600)

Devido a uma doença do sistema nervoso —neuropatia periférica— Maria Tereza tem dificuldade para andar, mas isso não a interrompe. "Tenho que caminhar para não atrofiar, e fazer o tai chi todo dia, senão me desequilibro."

O médico do esporte Gabriel Ganme, professor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp, sentiu na pele o risco de lesões entre idosos quando o pai sofreu uma queda e morreu em decorrência dela. "Quando quebra a perna, o velhinho muitas vezes morre, pois gera um processo inflamatório muito forte e o idoso pode não ter reservas para enfrentar esse processo", alerta o profissional.

Ele também lembra que, caso opte pela caminhada em esteira, ela deve sempre ser realizada com o sensor de queda acoplado (pois ele interrompe o funcionamento do aparelho ao ser arrancado e evita lesões ainda piores).

Caminhada é exercício sim!

    A caminhada pode parecer simples demais, mas se é feita com objetivo, velocidade, distância específicos e alguma orientação, pode ser chamada de exercício físico, sim, conforme geriatras.

    E olhe que a caminhada é altamente complexa para o corpo, pois exige a coordenação do sistema muscular esquelético, estímulo do cérebro para os músculos (pernas e braços), sistema respiratório e cardiovascular, sistema endócrino e hepático (nossa lixeira e produtora de proteínas importantes para a massa muscular e os ossos).

    Além de estimular a quebra de gordura corporal, na caminhada é produzida a citocina anti-inflamatória, ou seja, além de ajudar a "emagrecer", combate o "inflammaging", que são inflamações ligadas ao envelhecimento que ainda tornam o sistema imunológico vulnerável.

    Homem idoso, velho se exercitando, atividade física, exercício físico - iStock - iStock
    Imagem: iStock
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    A caminhada é a maneira mais simples e democrática de ativar tudo isso, desde que a pessoa tenha coordenação e equilíbrio, e pratique num lugar seguro.

    Mas é importante o idoso estar atento a qualquer mudança em seu corpo durante o esporte. Outro benefício da caminhada foi servir de alerta para Maria do Carmo.

    "Um dia senti um cansaço forte no percurso e tive que voltar para casa. Me sentia mal, então procurei o médico. Foi descoberta uma anemia, mas era um sangramento interno. Demorou para descobrirem um tumor", ela conta.

    A mãe das irmãs gêmeas viveu até os 93 anos, e o pai teve um câncer aos 81 anos, do qual faleceu. Infelizmente, a doença se manifestou nas filhas também, e Maria do Carmo teve há 11 anos um câncer de mama e atualmente trata outro tumor.

    Sinais de alerta para o idoso na caminhada:

    • Cansaço incomum
    • Cãibras incomuns
    • Palpitação
    • Dores no peito
    • Falta de ar
    • Tontura

    Para os geriatras e médicos do esporte, o ideal é associar a caminhada ao fortalecimento do corpo e exercícios aeróbicos.

    O acompanhamento por um profissional de educação física pode potencializar os benefícios do exercício feito pelo idoso. Veja no que ele pode ajudar:

    Mais segurança, pois trata-se de um momento em que o corpo passa por várias mudanças fisiológicas, e o programa de exercícios deve ser adaptado às capacidades e limitações do indivíduo, minimizando o risco de lesões durante os treinos.

    Execução técnica adequada, para maximizar os benefícios e prevenir lesões.

    Programa individualizado, com base nas necessidades, metas e condições de saúde específicas de uma pessoa idosa, como artrite ou osteoporose.

    Motivação e responsabilidade, para estabelecer metas realistas, acompanhar o progresso e fornecer suporte e orientação contínuos.

    Adaptação e progressão, para modificar os exercícios conforme necessário e aumentar gradualmente a intensidade.

    Interação social: ajuda a combater sentimentos de isolamento e solidão, promovendo bem-estar mental e emocional geral.

    Também é possível buscar suporte para caminhar, como uma bengala ou andador, mas, nesse caso, o acompanhamento profissional é indispensável.

    Dicas para o idoso caminhar em segurança

    • Consulte um profissional de saúde antes
    • Inicie devagar e aumente gradualmente a intensidade
    • Faça antes o aquecimento e o relaxamento depois
    • Escolha um local adequado, de piso regular, como parques e ciclovias compartilhadas. Calçadas irregulares trazem grande perigo
    • Cuidado com o equilíbrio: ele precisa ser trabalhado primeiro, para diminuir o risco de quedas, que podem até ser fatais
    • Se optar pela esteira, é obrigatório acoplar o sensor de queda, que interrompe o funcionamento ao ser desconectado
    • Segurar no apoio da esteira é uma opção para o equilíbrio, mas diminui o gasto energético
    • O ideal é ter um treinador para acompanhar
    • Alimentação e fortalecimento devem andar juntos
    • Use calçados que proporcionem estabilidade, amortecimento e reduzam o risco de quedas ou lesões nos pés
    • Mantenha-se hidratado
    • Faça check-up regularmente

    Fontes: Carlos André Freitas dos Santos, geriatra e professor da Escola Paulista de Medicina, com mestrado em nutrição e medicina do esporte; Gabriel Ganme, médico do esporte e professor da Escola Paulista de Medicina; Dahan Cunha Nascimento, profissional de educação física, doutor em gerontologia pela Universidade Católica de Brasília; e Eduardo Netto, profissional de educação física e diretor do CREF (Conselho Federal de Educação Física).