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'Médicos falam em milagre. Devido à sepse, fiquei 40 dias intubada'

Luciane teve que fazer reabilitação pós-sepse - Arquivo pessoal
Luciane teve que fazer reabilitação pós-sepse Imagem: Arquivo pessoal

Janaína Silva

Colaboração para VivaBem

16/07/2023 04h00

Luciane Souza, 61, jornalista aposentada e servidora pública federal, passou por um procedimento por videolaparoscopia para a retirada do útero, trompas e ovários em novembro de 2022. Após o procedimento, em dois dias recebeu alta. Porém, apresentou episódios de mal-estar e vômito, em casa, e voltou a ser internada com infecção.

Ela permaneceu mais de dois meses na UTI. Foram 40 dias intubada por conta do quadro de sepse e duas cirurgias abdominais até os médicos encontrarem uma pequena fístula no intestino.

Começou sua recuperação na UTI até janeiro e ficou internada até fevereiro de 2023, quando iniciou o processo de reabilitação em uma clínica especializada, da qual teve alta em abril.

Agora, em casa, segue com sessões de fisioterapia para continuar a recuperação de sua autonomia e independência; já caminha, toma banho e se veste sozinha. Abaixo, ela conta sua história:

"Os médicos falam que foi um milagre. Devido à sepse, fiquei 40 dias intubada, dos quais não tenho nenhuma memória. O interessante é que estava feliz ao fazer a cirurgia videolaparoscópica, pois seriam cicatrizes mínimas e com recuperação mais rápida, no entanto passei por mais duas cirurgias abdominais, na sequência.

Em virtude da gravidade do quadro apresentado, tomei muitas medicações, fiz traqueostomia, hemodiálise, transfusão de sangue e plasma.

A saída da sedação do coma induzido sucedeu-se de forma lenta e estava ainda na UTI durante o Natal e Ano-Novo, sem mobilidade. Não me mexia. Os médicos suspeitavam de dano neurológico, que não se confirmou.

Luciane Souza, personagem de VB 3 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Entretanto, por não ter a recuperação esperada na parte motora, apesar das sessões de fisioterapia no hospital, e por ter perdido muita massa muscular, os médicos recomendaram o tratamento de reabilitação em uma clínica especializada.

Fui internada lá, ainda sem caminhar, mas já fazendo alguns movimentos como levantar pernas e braços, no dia 4 de fevereiro e tive alta em 5 de abril. Feitas as análises e exames, na entrada, se tem uma data prévia de saída e me comprometi com ela. Todo o meu empenho, apesar de dias mais difíceis, foi pensando no dia da minha alta.

Falava que só sairia da clínica caminhando. O processo de evolução durante a reabilitação foi bastante significativo.

Em um ambiente que nada remete ao hospitalar, a rotina é pautada em fisioterapias de manhã e tarde, terapias ocupacionais, sessões de psicoterapia que estimulam a preparação para a volta à vida, com exames diários e avaliações semanais. Pensava na minha recuperação dia após dia.

A clínica tem um lindo jardim e lago com muitos peixes, e costumava passear durante o dia, acompanhando também outros pacientes que passavam pela reabilitação e com os quais estabeleci laços de amizade.

O espaço mantinha atividades sociais, com música ao vivo em determinados dias e até comemorações de aniversários. Agradeço todos os profissionais —médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e terapeutas— por me manterem animada e positiva, sem esmorecer.

Em função das complicações, tomo hoje mais remédios para controlar a hipertensão que já tratava, cheguei também a ter o diagnóstico de diabetes, mas que está sob controle. Antes de tudo isso acontecer, sempre tive uma alimentação saudável, não bebia e, até o início da pandemia, fazia academia. Sempre fui muito ativa.

Ainda não posso dirigir e nem sair sozinha, mas retomei parte da minha rotina, como tomar banho sozinha e me vestir. Continuo fazendo fisioterapia todas as tardes. Almejo em breve, fazer pilates e voltar à São Paulo, minha terra do coração."

Nem todos que tiveram sepse necessitam de reabilitação

Luciane Souza, personagem de VB 2 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

A sepse é uma síndrome grave que consiste em resposta inflamatória desregulada à infecção que causa disfunção orgânica ameaçadora à vida, que varia de uma alteração neurológica mínima, uma sonolência, até a de múltiplos órgãos.

De acordo com Arthur Faria, vice-presidente da Sotipe (Sociedade de Terapia Intensiva de Pernambuco) e médico responsável pela linha de cuidado "Reabilitação Pós UTI" na Clínica Florence?Unidade?Recife, a sepse pode provocar:

  • rebaixamento importante do nível de consciência;
  • distúrbios renais;
  • hipotensão;
  • necessidade de ventilação mecânica invasiva e
  • realização de hemotransfusões.

"Quando essas disfunções não são revertidas, ocorre o óbito."

Contudo, a reabilitação está relacionada à gravidade do quadro clínico e à perda funcional, durante a internação, como:

  • longos períodos acamados;
  • perda importante da musculatura;
  • quadro de desnutrição associado ao catabolismo da doença crítica e
  • emprego de suporte avançado à vida, como ventilação mecânica prolongada.

Além disso, nem todos os que são internados em UTIs necessitarão de reabilitação. "A indicação está relacionada ao perfil prévio —comorbidades e funcionalidade— e o agravamento do quadro clínico. Aos que apresentam mais disfunções orgânicas, com suporte invasivo e mobilidade reduzida, ela é recomendada ao receberem a alta hospitalar."

O processo de reabilitação

Luciane Souza, personagem de VB 1 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

A reabilitação funcional é individualizada, interdisciplinar e pode ser realizada em ambiente hospitalar, em hospitais de transição, em clínicas especializadas ou em domicílio, em função do grau de dependência.

Ela envolve diferentes profissionais capacitados, que atuam em conjunto, como médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas e farmacêuticos clínicos.

O objetivo é a retomada das funções cognitivas e motoras e o retorno da independência funcional completa.

"O início deve ser o mais precoce possível e realizado de maneira estruturada, com ações planejadas e evolutivas, engajando e motivando os pacientes e familiares", informa Faria.

Segundo ele, é preciso ter metas funcionais claras e factíveis para não desestimulá-lo e, periodicamente, a evolução é reavaliada com a análise das metas atingidas e das que não foram, elencando os motivos. "Assim, entende-se a reabilitação de forma global, com melhores resultados e devolvendo a independência funcional."