9% das mulheres que fizeram papanicolau pelo SUS nunca receberam resultado
Da Agência Brasil
10/08/2023 14h32
Um estudo feito pela Fundação do Câncer com base em dados do Ministério da Saúde revela a desigualdade no acesso ao resultado do papanicolau, exame utilizado no país para rastrear o câncer do colo do útero.
Segundo a pesquisa, apenas 40% das mulheres que realizaram o exame pelo SUS receberam o resultado em até 30 dias. Já na rede privada, esse percentual supera 90%.
Além disso, chama atenção também o número elevado de mulheres que não receberam o resultado do exame na rede pública: 9%, principalmente na região Centro-Oeste (11%) —na rede privada de todo o país, esse número cai para 2%.
A demora compromete toda a linha de cuidado daí para a frente porque, se tiver uma alteração no preventivo, a mulher não buscou o resultado, a unidade de saúde não fez uma busca ativa dessa mulher e não adiantou nada ela ter feito o exame. Porque ela não fez a confirmação do diagnóstico e um eventual tratamento, se fosse o caso. Flávia Corrêa, colaboradora do estudo.
Quais as razões por trás da demora na entrega do resultado
De acordo com a consultora médica da Fundação do Câncer e colaboradora do estudo Flávia Corrêa, como o rastreamento pelo papanicolau não é uma emergência, o resultado não costuma sair em cinco dias ou uma semana.
"O que ocorre é que a organização da rede pública de saúde não funciona muito bem e o pessoal da atenção básica de saúde pede para a mulher retornar em 30 ou 60 dias", diz a pesquisadora.
Segundo a médica, outra causa para a demora é que nem todas as unidades do SUS (Sistema Único de Saúde) são informatizadas. "Isso facilitaria muito o encaminhamento do laudo pela internet".
Mulheres que já têm dificuldade de ir até uma unidade de saúde por questões financeiras não conseguem sair do trabalho ou não têm com quem deixar os filhos, por exemplo, acabam frustradas e insatisfeitas quando vão buscar o resultado e ele não está pronto, diz Côrrea.
O levantamento ressalta que, quanto mais cedo o câncer do colo uterino for identificado, maiores são as chances de cura.
O estudo 'Um Olhar sobre o Diagnóstico do Câncer do Colo do Útero no Brasil' foi feito com base em dados da PNS (Pesquisa Nacional de Saúde), do Ministério da Saúde, divulgada no ano passado.
Veja outros dados da pesquisa:
21,4% das brasileiras que fazem o papanicolau estão fora da faixa etária recomendada pelo Ministério da Saúde e pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que é entre 25 e 64 anos de idade;
O exame deve ser realizado de três em três anos por mulheres que já tenham iniciado a atividade sexual, homens trans e pessoas não binárias designadas mulher ao nascer;
Segundo o estudo, a maioria das mulheres faz o exame antes dos 25 anos, quando há grande possibilidade de se detectar uma infecção por HPV que, nessa faixa de idade, regride espontaneamente na maioria das vezes;
Entre as mulheres que nunca realizaram o rastreamento da doença, 45,7% estão na faixa de 25 a 34 anos;
Esse padrão se repete em todas as regiões do país. No Norte e Centro-Oeste, contudo, os índices alcançaram 51,5% e 52,9%, respectivamente. "Isso está refletido nos números de mortalidade, que são muito maiores lá do que aqui", avalia Côrrea;
As mulheres que estão em dia com o preventivo (menos de 3 anos) encontram-se na faixa de 35 a 49 anos em todo o Brasil, com taxa de 43,7%;
O índice para as mulheres que nunca fizeram o papanicolau na faixa de 35 a 49 anos atingiu 29,8%, ficando em 24,5% para a faixa de 20 a 64 anos.
Qual o perfil das mulheres que nunca fizeram o exame?
O diretor executivo da Fundação do Câncer Luiz Augusto Maltoni chama a atenção para o fato de que a baixa escolaridade (56,9%) é uma das características entre as mulheres que não estão em dia ou que nunca fizeram o exame.
Além disso, elas apresentam baixa renda (70,7%), estão no grupo das que se definem como não casadas (73,9%) e têm cor negra ou parda (62,5%). "Tem toda uma conjuntura aí: quem mais precisa é quem menos recebe", acrescenta Corrêa.
As mulheres que realizaram o preventivo há mais de 3 anos possuem baixa escolaridade em todas as regiões do Brasil. Os destaques são o Norte (62,5%) e o Nordeste (68,8%), cujos percentuais superam a média brasileira (60,8%).
Já entre as mulheres que nunca fizeram preventivo, a baixa escolaridade lidera em todo o país, com média de 56,9%, à exceção do Centro-Oeste, que mostra distribuição próxima entre as mulheres com ensino fundamental completo (48,4%) e ensino médio completo (43,3%).