O que acontece no seu corpo quando você come fast-food com frequência

Por fora bela viola, por dentro pão bolorento. Esse ditado popular é mais antigo que o aparecimento do fast-food, mas sintetiza os resultados das mais recentes pesquisas científicas sobre ele. Delicioso para o paladar de boa parte da população mundial, o seu consumo tem sido relacionado ao distanciamento de padrões alimentares tradicionais, hábitos e culturas regionais, além de variadas enfermidades.

O termo fast-food [comida rápida] apareceu nos dicionários na década de 1950 para definir alimentos que podem ser preparados e servidos rapidamente. Hoje, além dessas características, ele representa um estilo de comer padronizado, com baixo valor nutricional —resultado de uma produção em larga escala que atende às demandas de tempo e produtividade.

E não pense que fast-food é apenas aquele produto fornecido em grandes redes de restaurantes. Itens como pizza, hambúrguer, frango frito, sanduíches, salgadinhos e bebidas gaseificadas disponíveis em máquinas expostas em lojas de conveniência ou postos de gasolina, entre outros, são também exemplos.

O número de consumidores desse tipo de produto passou de cerca de 10 milhões (2021) para cerca de 14 milhões (2023) no Brasil.

A alta foi impulsionada por compradores jovens (até 29 anos) das regiões metropolitanas.

Nos EUA, ele está presente em pelo menos 1 das refeições de 37% da população, em 2 dias consecutivos.

70% dos brasileiros jovens (9 a 18 anos) o consomem 4 ou mais vezes por semana.

Por dentro do fast-food

O Guia Alimentar para a População Brasileira considera restaurantes do tipo fast-food inapropriados para as refeições.

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A razão para isso é que eles oferecem pouca ou nenhuma opção de alimentos naturais ou minimente processados, e ainda são barulhentos e desconfortáveis. Esses fatores propiciam o comer além da medida e de forma acelerada.

Soma-se a isso o fato de que os itens oferecidos em seus cardápios são alimentos classificados como ultraprocessados: formulações industriais que exigem a inclusão de aditivos cosméticos: corantes, aromatizantes, realçadores de sabor, emulsificantes, entre outros.

Contendo pouca ou nenhuma proteína, vitaminas e minerais, esses produtos são ricos em sódio, açúcar, gorduras trans e calorias.

Sal, açúcar e gorduras estão na lista de ingredientes com propriedades hiperpalatáveis, ou seja, eles causam prazer, satisfação, mas podem viciar.

O acesso é facilitado: os estabelecimentos que os vendem estão abertos 24 horas por dia e 7 dias da semana, situam-se perto de escolas e do trabalho, além de pontos de ônibus, metrô e praças de alimentação.

Oferecem porções grandes por preço "vantajoso". O refrigerantes têm refil.

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Possuem marketing dirigido a crianças e jovens, e venda casada com brinquedos de personagens infantis.

O que você ganha (ou perde) com isso?

Entre os cientistas, até o final da primeira década de 2000, pouco se falava sobre os efeitos no organismo do consumo de produtos ultraprocessados. Muitos estudos ainda estão em andamento, mas alguns resultados são suficientes para indicar a redução deles na sua mesa. Confira alguns deles:

  • Aumento do risco para doenças do coração e metabólicas
  • Possível ganho de peso
  • Alterações de humor
  • Aumento do risco para vários tipos de tumor

Você abre espaço para doenças crônicas

O perfil nutricional desses alimentos tem sido relacionado ao aumento de doenças cardiovasculares, como o infarto e o AVC, além do diabetes do tipo 2.

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Estudos recentes mostram maior risco para o desenvolvimento do diabetes do tipo 2 (modestamente) e de morte precoce por doenças cardiovasculares em locais onde há maior oferta desses produtos.

Geralmente eles são produzidos à base de carne processada, açúcar adicionado, e são ricos em sódio, além de gorduras trans, ingredientes relacionados ao aumento do colesterol e problemas no coração.

Padrões alimentares com alto consumo desses itens, historicamente, se relacionam ao aparecimento de hipertensão, alterações nas taxas de colesterol, além da síndrome metabólica.

Só para se ter uma ideia, a OMS recomenda um consumo máximo de 2.000 mg (2g) de sódio ao dia. Um cheeseburguer bacon contém a média de 1.500 mg de sódio, ou seja, um excesso que, se for regular, pode ter consequências para o resto da vida.

Você vê o ponteiro da balança subir

O consumo regular de porções exageradas de alimentos e de bebidas açucaradas ultraprocessadas, sozinhos, contribuem para o aumento de peso de crianças, jovens e adultos. No caso do fast-food, os cientistas ainda não chegaram a um consenso sobre os mecanismos envolvidos nesse processo para além do alto consumo calórico.

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Algumas hipóteses revelam que podem estar presentes mudanças no microbioma e hormonais, processos inflamatórios, alterações nos sinalizadores cerebrais da saciedade que potencializam a fome.

Mais rico em carboidratos do que em nutrientes, o fast-food rouba espaço de um cardápio rico em frutas, verduras e proteínas de qualidade, que garantem melhor padrão alimentar.

Maior consumo de carnes processadas e grãos refinados são igualmente associados ao risco de obesidade e sobrepeso.

Os jovens são os que menos comem frutas, verduras e legumes.

Em 2022, 9% dos deles, com idades entre 18 a 24 anos tinham IMC (índice de massa corporal) igual ou maior que 30 (o valor considerado normal está entre 18,6 a 24, 9). Em 2023 esse percentual aumentou para 17,1%.

Você sente a energia despencar

As mais recentes pesquisas que investigam a relação entre o humor e a nutrição têm concluído que o estado nutricional, a qualidade da dieta, e o consumo adequado de vitaminas e nutrientes parecem estar conectados à sensação de vitalidade e à saúde mental.

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Dietas ricas em açúcar e carboidratos refinados elevam a taxa de glicemia no sangue, além da maior produção de insulina. A sensação de cansaço e alterações de humor podem aparecer.

Um padrão alimentar com baixo teor de sódio e rico em vegetais, legumes e frutas melhora os estados de humor, enquanto padrões com maior consumo de alimentos processados e ultraprocessados estão associados a sintomas psicológicos e depressão.

Um recente estudo feito com estudantes mostrou que dietas equilibradas, baseadas em frutas, verduras, cereais integrais, etc., colaboram para a melhora de quadros como depressão, ansiedade, estresse e percepção de bem-estar geral, quando comparadas a dietas de baixa qualidade. Dados publicados pela revista científica Health Education Research.

Você abre uma brecha para o câncer

Já faz tempo que os cientistas suspeitam da relação entre o alto consumo de produtos fast-food e o desenvolvimento de tumores. As evidências mais recentes mostram que focar no consumo de alimentos e bebidas in natura, deixando de lado os ultraprocessados, pode funcionar como um escudo contra alguns tipos de câncer.

A substituição de 10% de alimentos processados por igual quantidade dos minimamente processados foi associada à redução de risco para todos os tipos de câncer, em especial os de cabeça e pescoço, esôfago, colorretal, fígado e mama.

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As mesmas proporções de substituição de ultraprocessados por minimamente processados foi associada à redução do risco de câncer de cabeça e pescoço, colorretal e fígado.

Isso significa que estratégias que buscam prevenir o câncer devem estimular esse tipo de transição alimentar. Todos os dados foram publicados pela revista Lancet Planet Health.

Motivações para o consumo

Os pesquisadores seguem observando o porquê do avanço do consumo de fast-food no globo. Fatores econômicos e falta de habilidades culinárias se destacam, mas outras questões estariam envolvidas:

  • Falta de tempo para organização e preparo dos alimentos
  • Preferência familiar e individual
  • Facilidade do preparo de alguns itens, que poderiam até ser feitos por crianças, como aquecer nuggets ou hamburguer no micro-ondas
  • Não saber o que oferecer no lugar desses itens
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Nem de vez em quando?

Os especialistas consultados concordam que não há que se discutir se existe ou não um consumo seguro desse tipo de produto. Afinal, o Brasil é um país rico em diversidade de alimentos, e estes não podem ser comparados ao fast-food e seus produtos ultraprocessados.

A discussão deve ser sobre como estimular o consumo de alimentos in natura e torná-los tão acessíveis quanto o fast-food.

Considere que outros fatores, como genética e estilo de vida, podem influenciar a resposta do corpo a esse tipo de produto.

O padrão alimentar baseado no consumo de ultraprocessados está associado ao maior risco para o desenvolvimento de doenças crônicas. Quanto mais se consome, maior é o risco.

Fontes: Camila Borges, nutricionista, doutora em nutrição e saúde pública pela FSP (Faculdade de Saúde Pública) da USP, pesquisadora do Nupens-USP (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde); Juliana Maria Faccioli Sicchieri, nutricionista do HCFMRP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP e professora colaboradora do curso de nutrição e metabolismo e do Programa de Pós-Graduação em Nutrição e Metabolismo da FMRP-USP; Rodrigo Pimentel, nutrólogo e chefe da Divisão da Gestão do Cuidado do Hupes-UFBA (Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares). Revisão técnica: Camila Borges.

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Referências:

  • Ministério da Saúde
  • Covitel 2023 (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia)
  • Kantar
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