O quanto a genética pode interferir nos seus níveis de colesterol?

Desde criança, escuto dos médicos que preciso ficar de olho nos meus níveis de colesterol no sangue. Quando tinha uns 10 anos, tive que reduzir o consumo de açúcar e produtos ultraprocessados. Rapidamente meus índices de LDL, o "colesterol ruim", logo reduziram.

Mas desde então, entre altos e baixos, eles sempre ficaram ali no limite do esperado —o que seria algo por volta dos 130 mg/dl. Sempre controlei meu peso e tento seguir uma dieta rica em fibras, frutas, legumes e verduras, mas os níveis sempre ficavam neste limite. O ponto é que o mesmo acontece com minha mãe e também ocorria com minha avó.

Os médicos diziam que o motivo deveria ser a genética e, por isso, eu deveria sempre ficar de olho, além, é claro, de praticar esporte e manter uma boa alimentação.

Mas agora aos 30, uma médica comentou que seria interessante conversar com um especialista para entender se eu precisaria de remédio, uma vez que essa "tal genética" não tem como mudar.

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Imagem: Reprodução/ADVANCE for Laboratory

Remédio depende de diversos fatores

Em conversa com cardiologistas e endocrinologistas, eles me explicaram que a questão do remédio envolve fatores como hábitos de vida, os índices de todas as frações do colesterol (e não só o LDL), histórico familiar de problemas cardíacos e, claro, idade.

No meu caso, meu HDL, o "colesterol bom", sempre foi alto, principalmente quando consigo manter a prática de atividade física mais constante —como tem sido há cerca de 1 ano.

Por isso, no meu caso, talvez o remédio ainda não seja necessário, segundo o endocrinologista Joaquim Custódio da Silva Júnior, presidente do Departamento de Dislipidemia e Aterosclerose da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia).

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Pessoas que fazem atividade física aeróbica, como corrida de rua, tendem a ter o HDL mais alto. Mas quando olha para o colesterol geral, e fica mais alto, ela se assusta —e é óbvio que ela pode ter um componente genético. Mas vendo as frações, ter o HDL alto é muito bom. Não precisa tratar. Joaquim Custódio da Silva Júnior, endocrinologista

Os médicos costumam se preocupar mais com o LDL em índices acima de 130 mg/dl em pessoas com risco cardiovascular baixo, pois ele é responsável pelo aumento de risco de doenças cardiovasculares, como a aterosclerose, ao se acumular de forma perigosa nas artérias.

Veja os índices:

Colesterol total: menor que 190 mg/dl Colesterol

HDL: maior que 40 mg/dl Colesterol

LDL: menor que 130 mg/dl em pessoas com risco cardiovascular baixo; menor que 100 mg/dl em pessoas com risco cardiovascular intermediário; menor que 70 mg/dl em pessoas com risco alto e menor que 50 mg/dl em pessoas com risco cardiovascular muito alto.

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Imagem: iStock

Em casos como esse, avalia-se o risco do paciente, hábitos de vida, peso corporal, entre outros.

Quando a pessoa nunca teve nenhum problema no coração, como infarto e AVC, é possível tentar alterar os índices com alimentação e prática frequente de ativiade física, além de reduzir o consumo de álcool e evitar o cigarro.

Se depois de cerca de 3 ou 4 meses, os números estiverem altos, é preciso entrar com medicação. Quando o LDL, por exemplo, já está em 190 mg/dl, é preciso iniciar imediatamente os medicamentos para controlar a condição.

Há ainda outras situações que merecem cuidado especial, conforme explica José de Ribamar Costa, cardiologista e chefe da cardiologia do Hospital São Domingos, no Maranhão, da rede Dasa.

Se a pessoa já teve algum evento no passado, como infarto, e ainda assim tem índices do colesterol dentro da faixa, a recomendação é a medicação, para reduzir o máximo possível. José de Ribamar Costa, cardiologista

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O médico reforça a importância de fazer os exames de rotina de forma anual, pelo menos. Caso a pessoa já tenha alguma doença crônica, como diabetes, o ideal é fazer esse acompanhamento o mais cedo possível, ainda na infância.

Mas a culpa não pode ser só da genética

De acordo com Edmo Atique Gabriel, cardiologista, professor na Unilago (União das Faculdades dos Grandes Lagos) e colunista de VivaBem, a genética tem pouca influência no colesterol alto —esse número fica entre cerca de 10% a 20%.

O que pesa mais, segundo o médico, são os hábitos de vida, como alimentação e prática de atividade física. Por isso não dá só para "culpar" isso e deixar os outros cuidados de lado.

Além disso, o médico explica que existe um exame que dá para fazer e descobrir se aquela pessoa, de fato, tem uma tendência maior aos altos níveis de colesterol HDL, que é o indicador lipoproteína —Lp(a).

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Esse indicador mostra que, mesmo com níveis de colesterol bons ou estáveis, você pode ter esse elemento indicando uma tendência maior para agregação de gorduras nas artérias. Edmo Atique Gabriel, cardiologista

Esse exame, que é como o de sangue, traz uma visão mais "realista" do paciente, segundo o médico. No entanto, pela rede pública, ele só é solicitado em centros especiais após encaminhamento médico, ou seja, ele não entra nos exames de rotina.

"Com esse exame associado ao do colesterol padrão, podemos ter um resultado mais fidedigno", diz.

"É desejável que esse valor seja menor que 30 ml/dL", explica o cardiologista do Hospital São Domingo. "Mas tem algo interessante neste marcador: ele é estável, mesmo se passar 10 anos ou se a pessoa perder 20 kg, por exemplo. É diferente do colesterol que varia ao longo da vida", diz.

Ainda segundo Costa, existem alguns remédios que podem ajudar a controlar quando os níveis são muito altos, como inibidores da Pcsk9. "Remédios normais para colesterol, como a estatina, não agem neste problema, por exemplo", fala.

No entanto, para outros especialistas, ainda não está tão claro o papel deste indicador para prevenir problemas cardíacos causados como consequência do colesterol alto. Um estudo da USP mostrou que esta técnica de dosagem ainda não é tão precisa.

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De maneira geral, é sempre importante ter como tratamento a diminuição da taxa de colesterol, orientação para que o paciente pare de fumar, comece a fazer exercícios, entre outros.

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Imagem: Getty Images/iStockphoto

Minha situação é diferença para hipercolesterolemia familiar

É importante reforçar que essa tendência em ter o nível de colesterol sempre no limite é completamente diferente da hipercolesterolemia familiar, que é uma condição hereditária que causa o aumento do colesterol no sangue.

Em algumas situações mais raras, o paciente tem os níveis altos ainda quando são crianças. Geralmente, a família apresenta histórico de infarto em idade jovem, antes dos 50 anos, por exemplo.

"O mais comum é que essas pessoas tenham, na família, históricos de colesterol elevado e infarto da avó e avô muito precocemente. Isso precisa ser investigado para que elas possam ser tratadas o quanto antes", explica o professor da UFBA.

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