Criança que bate nos pais: como lidar com a agressividade dos filhos?
Quando garoto, por entre seus 4 e 6 anos de idade, Marcelo Ferreira, 34, de São Paulo, comportava-se de maneira agressiva quando contrariado por adultos, especialmente o pai. "Esperava ele dormir e batia em sua cabeça com uma panela, igual ao Baby do programa Família Dinossauros, ou então sujava suas roupas com batom ou pomada. Quando tirávamos fotos juntos, se não fosse espontâneo, também fazia careta de tédio", diz Marcelo.
O comportamento agressivo de algumas crianças não mudou muito dos anos 1990 para os dias de hoje. Simone Morais, 36, de Londrina (PR), diz que há uns dois anos, seu filho Pedro, 6, que até então era, em suas palavras, um "doce", mudou completamente. "Durante minha segunda gravidez, da irmã dele, ele virou outro. Me respondia com grosseria, dava chutes, sem eu perceber destruiu itens do enxoval e ao visitarmos uma priminha dele bebê, chacoalhou ela dentro do carrinho", conta Simone.
Condutas do tipo, típicas de "pestinhas", podem soar engraçadas apenas para quem escuta, pois para pais e cuidadores são desconcertantes. Para além dos eventuais ferimentos físicos e dores, causam estresse, constrangimentos, desentendimentos entre casais, inimizades, prejuízos financeiros e consequentemente agravamento de sentimentos e emoções negativos, inclusive para as crianças, que podem se sentir incompreendidas e injustiçadas.
São vários os motivos que levam crianças a agirem com violência e que não necessariamente têm a ver com distúrbios, como psicopatia, sociopatia, personalidade antissocial, ou ainda TOD (transtorno opositor desafiador). Os três primeiros são caracterizados por um padrão invasivo de desrespeito, violação dos direitos alheios, frieza, indiferença e que continua na idade adulta; o último é marcado por um modo de ser simultaneamente desafiador, questionador e vingativo.
A agressividade pode vir por fatores mais simples, como ciúmes, mudanças ou até bullying na escola.
Às vezes, o que leva uma criança a agir de forma problemática pode ser a chegada de um irmãozinho, a presença de outra criança, então a divisão da atenção pode ser difícil para ela. Ou então o ingresso em uma escola nova, mudanças repentinas, separação dos pais, morte de familiares, bullying. Gabriela Luxo, psicóloga, psicopedagoga e doutora em distúrbios do desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP)
A psicóloga continua que a violência nesses casos é um recurso para se chamar a atenção e expressar incômodos. Ela também pode ser fruto da falta de habilidades de comunicação e como mensagem pode ser difícil de ser decodificada por alguns adultos, que ao reagirem mal podem potencializá-la, como bem sabe Marcelo: "Eu recebia bronca, puxão de orelha e isso não só me deixava ainda mais irritado como com raiva e ciúmes das crianças que eram comportadas. Uma vez até mordi uma na barriga".
Revidar não funciona
A agressividade na criança também pode ser uma reação sua a uma autoridade mal exercida por pais ou cuidadores que não a escutam, não a percebem ou trabalham com ela com respostas prontas, automáticas, fazendo com que não se sinta individualizada. Para piorar, alguns adultos ainda reagem ao comportamento dos filhos com violência e autoritarismo, gerando um ciclo de agressões que pode moldar sua personalidade e afetar relações futuras.
De acordo com Wimer Bottura, psiquiatra pelo IPq-FMUSP (Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP), existem crianças que logo com 1 ou 2 anos de idade já dão seus tapinhas nos pais e agem com agressividade, outras um pouco mais crescidas. "No início, reagem com choro, que é a única forma de comunicação que têm, e se não forem percebidas ou compreendidas, desenvolvem outros comportamentos. Muitas vezes, testam os adultos para ver o que acontece, como reagem. Se tiverem êxito, podem usar isso como uma ferramenta de punição ou poder defensivo, e ao crescerem também tiranizam os pais", diz o médico.
Simone explica ter demorado para notar que brigava com o marido por causa de Pedro, que derrubava propositalmente copos e pratos no chão como uma estratégia para receber a atenção da mãe e sair ileso, pois a culpa sempre recaia sobre o pai, taxado por ela como desatento. "Aos poucos, fomos 'sacando' a jogada dele e como deixou de ser algo esporádico e de pouca intensidade, ficamos preocupados e buscamos o auxílio de um terapeuta infantil", diz.
Fórmula para lidar com birra
Ser firme é diferente de ser bravo, informa Joeuder Lima, psicólogo da Clínica Saúde Vida Plena e doutorando pelo IESLA (Instituto de Educação Superior Latino-Americano), em Palmas. "É possível se fazer ser ouvido com carinho, acolhimento, respeito, diálogo. Do contrário, o filho acaba anulado e adoece mental e emocionalmente. E o sentimento de culpa atinge tanto a criança como o adulto, que por sua causa pode se deixar ser manipulado", diz.
Suas recomendações, em conformidade com os demais especialistas em saúde mental, é que os pais, primeiro, observem como têm tratado seus filhos, que também devem ser analisados e contidos quando reagirem com agressividade. Essa contenção, segundo a psicóloga Gabriela Luxo, deve ser feita segurando os braços da criança, sem apertar, e dizendo a ela que se houver alguma questão que a incomoda, os pais irão ajudá-la, mas mantendo a calma e conversando.
"De repente, eles podem pegar um lápis e pedir para o filho desenhar o que está sentindo, ou então retratar seu dia a dia com brinquedos, bonecos e, com dificuldade, complementarmente buscar mais informação em outros locais, como na escola. Educar é trabalhoso e exige muita paciência, enquanto o não fazer nada só reforça o comportamento negativo da criança e ela aprende que batendo, brigando, gritando, consegue tudo aquilo que deseja", adverte Luxo.
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