O que acontece no seu corpo quando você usa laxante com regularidade

Para o intestino funcionar como um reloginho, não tem jeito, é preciso ficar atento ao que se come e ao que se bebe e incluir mais atividade física no seu dia a dia. Quando dieta equilibrada, boa hidratação e exercícios não dão conta do recado, os laxantes podem facilitar a evacuação. O que muitos não sabem é que esses medicamentos não são todos iguais.

Boa parte desses fármacos pode ser vendida sem receita médica. Assim, a maioria das pessoas faz uso deles por contra própria, ignorando que, a depender de cada quadro de constipação (prisão de ventre ou intestino preso), existe um tipo que melhor atenderá às suas necessidades. E mais: nem pensam nos possíveis efeitos que eles podem causar.

16 pessoas em cada 100 apresentam sintomas de constipação; as mulheres são as mais afetadas

Entre idosos, o risco aumenta: 33 em cada 100 deles terão essa queixa

3% a 59% dos adultos usam laxantes, independente da causa da prisão de ventre

Profissionais da área da saúde geralmente não participam da escolha do medicamento. Dados publicados na revista científica Journal of Clinical Medicine

Cada um com o seu hábito intestinal

Entender o que pode ser considerado normal ou não quando se fala em fazer cocô é meio complicado. Mas o que você precisa saber é que, para 99% da população, esse hábito pode variar entre 3 vezes ao dia a 3 vezes por semana.

A constipação será considerada crônica (e até classificada como doença) quando estiverem presentes pelo menos 2 dos seguintes quadros, em um período de 3 meses, no último semestre:

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  • Menos de 3 evacuações na semana
  • Fezes duras em mais de 25% das idas ao banheiro
  • Sensação de evacuação incompleta em mais de 25% dos movimentos intestinais
  • Esforço excessivo em mais de 25% das vezes
  • Necessidade de manobras manuais para facilitar a evacuação (enema, massagens, jato de água, etc.)

Ao tomar laxante demais...

A maioria dos laxantes é considerada segura quando utilizada adequadamente e por pessoas sem contraindicações.

No entanto, quando o uso se dá por longos períodos, indiscriminadamente e sem a devida orientação de um profissional, alguns efeitos indesejados poderão aparecer.

A depender da gravidade, frequência, duração e tipo de laxante utilizado, a saúde gastrointestinal, assim como outros sistemas do organismo poderão ser prejudicados. Veja algumas das possíveis complicações:

  • Diarreia e desidratação
  • Distúrbio eletrolítico
  • Problemas renais
  • Aumento do risco de uso abusivo
  • Mascaramento de doenças
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Você pode acelerar a perda de água do corpo

A diarreia é considerada a mais comum entre as complicações do uso excessivo de laxantes, e pode vir acompanhada de gases, dor e cólica.

Trata-se de um efeito direto do volume do medicamento consumido e de seu efeito laxante no movimento intestinal

A frequência das idas ao banheiro pode chegar de 15 a 20 vezes ao dia

Vômitos podem ser associados à diarreia e, nesse caso, a perda de água promovida por esses sintomas pode ter como consequência a queda de pressão, taquicardia, além de tontura

Você pode derrubar seus níveis de minerais

Eletrólitos são minerais presentes no sangue (sódio, potássio, etc.) que colaboram com variadas funções do organismo, como manter nervos e músculos em equilíbrio.

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Quando a diarreia persiste, esse sistema se desequilibra com a queda dos níveis desses eletrólitos, em especial o potássio. O resultado é a hipocalemia, ou seja, baixos níveis de potássio no sangue, que se relaciona a quadros como:

  • Fraqueza e paralisia muscular
  • Alterações no funcionamento dos rins
  • Quadros graves de hipocalemia promovem arritmias, situação que aumenta o risco para morte súbita

Você pode bagunçar as funções dos rins

Um efeito preocupante e mais raro do uso prolongado sem a supervisão de um profissional da saúde é a alteração da estrutura e das funções dos rins, conhecida genericamente como doença renal crônica. Veja alguns dos fatores que influenciam esse resultado:

  • Hipocalemia
  • Perda de outros minerais (sódio) e líquidos de forma sustentada
  • Excesso de ácido úrico (hiperuricemia)

Como alguns laxantes são nefrotóxicos, ou seja, possuem toxinas que são enviadas aos rins, eles também têm o potencial de danificar as células renais.

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Você pode ultrapassar o limite de vez

Tal situação se caracteriza pelo uso abusivo desses medicamentos sem necessidade. Alguns grupos são mais suscetíveis a esse comportamento. Confira:

Pessoas com distúrbios alimentares (anorexia ou bulimia)

Adultos maduros e idosos iniciam o uso quando estão constipados, e seguem com a medicação mesmo após melhora dos sintomas ou mesmo para manter o hábito intestinal. No entanto, este não é o único objetivo do tratamento

Atletas o utilizam visando atingir metas de peso em competições

Pessoas com distúrbios psiquiátricos podem passar a utilizá-los para provocar diarreia, o que é definido pelos especialistas como diarreia factícia

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Uma queixa comum desses grupos é a alternância entre constipação, diarreia, náuseas e vômito.

Desidratação, desequilíbrio de eletrólitos (minerais) sanguíneos, assim como alterações na secreção de insulina (nos casos de anorexia) são situações possíveis. Juntos, e em quadros mais graves, resultam em insuficiência renal.

Você pode agravar doenças desconhecidas

Quando a constipação persiste e não há investigação de sua causa, o uso de laxantes pode até ajudar nas idas ao banheiro. No entanto, uma doença maior (diabetes, problemas na tireoide, neurológicos ou reumatológicos e até tumores), não diagnosticada por um médico, pode estar progredindo e piorando.

O risco desse comportamento é que ele poderá atrapalhar a solução de um problema de saúde que poderia ter fácil tratamento mas, com o decorrer do tempo, já não serve como estratégia terapêutica.

Por que não faço cocô?

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Imagem: iStock

A constipação é considerada um sintoma, mas o quadro pode se tornar crônico. As origens de sua manifestação não foram totalmente esclarecidas pelos cientistas, mas sabe-se que ela se relaciona a fatores como:

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  • Dieta inadequada
  • Baixa ingestão de água
  • Falta de exercícios
  • Mudanças na dieta ou na rotina
  • Uso de medicamentos
  • Ansiedade e depressão
  • Outras doenças, como o diabetes, por exemplo

Os vários tipos de laxante

O tratamento da constipação começa com mudanças na dieta e estilo de vida. Caso essas medidas não tragam resultado, os laxantes serão úteis, mas deverão ser adequados às necessidades de cada pessoa, já que existem variados tipos. Conheça os principais:

Formadores de massa: aumentam o bolo fecal e o trânsito intestinal. Um exemplo deles é o Psyllium.

Emolientes: amolecem as fezes, facilitando a sua eliminação. Exemplo: óleo mineral.

Osmóticos: atraem a água do intestino, aumentando o volume e o amolecimento das fezes. O polietilenoglicol e a lactulose são exemplos.

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Estimulantes: a sua ação principal é alterar a parede intestinal e estimular a contração do intestino e a eliminação das fezes. Exemplo: bisacodil.

Uso prolongado, só se necessário!

Nas situações em que a pessoa tem alguma doença no intestino ou outras que têm como sintoma a constipação, o uso crônico de laxante pode ser necessário. Nesses casos, ele será utilizado sob a orientação e supervisão de um médico.

A medida é importante porque ela melhora a qualidade de vida. O impacto da constipação intestinal crônica no dia a dia pode ser comparado aos quadros de depressão. Dados publicados pela revista médica Gastroenterology.

Alimentos que valem por um laxante

Antes de usar o próximo laxativo, aposte no maior consumo de alimentos que têm esse efeito:

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  • Abacaxi, ameixa, maçã com casca, mamão, manga, melancia, cajá, umbu, acerola, cacau, aveia, farelo de trigo, milho, laranja com bagaço, feijão, lentilha, soja, grão-de-bico, semente de linhaça, abóbora, abobrinha, verduras cruas, arroz integral, pão integral, vagem, pepino, figo, folhas (alface, agrião, rúcula).

E observe os alimentos que podem ser mais constipantes para você, reduzindo seu consumo no dia a dia. Veja alguns exemplos:

  • Alimentos ultraprocessados em geral, farinhas refinadas presentes no macarrão, pão branco, arroz branco, biscoitos, bolachas, batata, mandioca, tapioca, batata doce, mandioquinha, cuscuz.

Para reduzir os riscos, coloque em prática as seguintes medidas:

Invista em um estilo de vida que previne a constipação antes de se automedicar: aumento da ingestão de fibras e de água, além da prática de exercícios físicos regulares. Caso seja possível, consulte um nutricionista para adequar a dieta às suas necessidades.

Prefira usá-los apenas de vez em quando, ou pelo tempo recomendado e conforme orientação do farmacêutico ou médico.

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Utilize apenas a dose recomendada pelo profissional da área da saúde. Aumentá-la por conta própria poderia atrapalhar a continuidade do tratamento, caso o seu quadro se agrave. Se não houver evacuação em 2 ou 3 dias, os médicos podem indicar outros tipos de laxantes, que eles chamam de medicações de resgate.

Evite o uso prolongado sem supervisão médica.

Fontes: Juliana Pereira de Castro, consultora farmacêutica do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia de São Paulo); Júlio Pinheiro Baima, gastroenterologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu da Unesp e da Clínica Plexus (Bauru), docente da Universidade Nove de Julho, campus Bauru, com doutorado em gastroentorologia pela Unesp e membro da FBG (Federação Brasileira de Gastroenterologia) e da GEDIIB (Organização Brasileira de Doença de Crohn e Colite); Luciana Canetto, farmacêutica e vice-presidente do CRF-SP; Thales Simões Nobre Pires, gastroenterologista, coordenador do Centro Endoscópico e Terapêutico do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes da UFAL (Universidade Federal de Alagoas), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), médico assistente do Ambulatório do Doenças Inflamatórias Intestinais da mesma instituição e membro titular da FBG e da Sobed (Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva). Revisão técnica: Júlio Pinheiro Baima.

Referências:

  • Chang L, Chey WD, Imdad A, Almario CV, Bharucha AE, Diem S, Greer KB, Hanson B, Harris LA, Ko C, Murad MH, Patel A, Shah ED, Lembo AJ, Sultan S. American Gastroenterological Association-American College of Gastroenterology Clinical Practice Guideline: Pharmacological Management of Chronic Idiopathic Constipation. Gastroenterology. 2023 Jun;164(7):1086-1106. doi: 10.1053/j.gastro.2023.03.214. PMID: 37211380. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37211380/
  • Werth BL, Christopher SA. Laxative Use in the Community: A Literature Review. J Clin Med. 2021 Jan 4;10(1):143. doi: 10.3390/jcm10010143. PMID: 33406635; PMCID: PMC7796417. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7796417/
  • Bashir A, Sizar O. Laxatives. [Atualizado em 2022 Oct 13]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK537246/
  • Roerig, J. L., Steffen, K. J., Mitchell, J. E., & Zunker, C. (2010). Laxative Abuse. Drugs, 70(12), 1487-1503. doi:10.2165/11898640-000000000-00000. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/20687617/.

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