Já olhou para o seu cocô hoje? Fezes podem dar pistas sobre a sua saúde
Colaboração para VivaBem, em São Paulo*
22/09/2023 04h00Atualizada em 02/10/2023 16h29
Nem todo cocô que fazemos é igual e você sabe disso. Sim, o assunto pode ser meio indigesto e é improvável que esteja na sua roda de amigos, mas nem adianta dizer que não espia o resultado após alguns minutos no trono. Todo mundo faz isso — ou deveria fazer.
Inclusive, essa observação é muito importante para você tomar algumas precauções caso veja algo de diferente e estranho na sua saúde intestinal. Não é à toa que profissionais de saúde criaram há tempos uma escala chamada Bristol Stool Chart, que descreve o formato para identificar possíveis problemas (saiba mais abaixo).
Além do formato e da consistência, é fundamental prestar atenção na cor. A tonalidade amarelada, por exemplo, pode sinalizar uma dificuldade no processamento de gorduras ou distúrbios no pâncreas. Já as esbranquiçadas apontam para alterações no fígado.
As obstruções na vesícula também deixam o cocô mais claro. A cor preta, por sua vez, acende o alerta para doenças e alterações intestinais — é característico da presença de sangue no tubo digestivo e as fezes tendem a apresentar cheiro acentuado.
Já se há sangue vivo nas fezes — se ele está avermelhado —, os médicos levantam a suspeita de lesões ou pólipos em partes do intestino, doenças autoimunes, colite, hemorroida e até câncer. Também é necessário observar a presença de muco no cocô. O tom esverdeado provocado por esse fluido acusa infecções por vírus.
Qual a frequência ideal?
O cenário ideal é realizar mais de três evacuações na semana. Quando o indivíduo fica com a barriga inchada ou passa mais de dois dias sem ir ao banheiro, é bom ficar atento. Às vezes, hidratação adequada e uma alimentação balanceada e rica em fibras já melhoram o quadro. Em outras situações, uma consulta com profissionais de saúde será necessária.
Já fazer cocô mais de uma vez ao dia não é motivo de preocupação por si só. Basta reparar se há um quadro constante de diarreia — isso pode indicar enfermidades e gerar desidratação.
Os diferentes tipos de cocô, segundo o Bristol Stool Chart:
Tipo 1: são em formato granular, ou de pequenas bolas. Em geral, saem com muita dificuldade. Indica que a pessoa está desidratada e consumindo poucas fibras.
Tipo 2: alongado e granular. Também aponta intestino preso e pouca ingestão de água.
Tipo 3: como se fosse uma salsicha, mas com rachaduras. Ainda não é o formato ideal, mas indica que o indivíduo está saudável.
Tipo 4: o formato é similar ao do tipo 3, mas com uma textura mais suave. Ele mostra que o intestino está funcionando adequadamente.
Tipo 5: é mole, irregular e separado em pedaços. Não indica uma patologia, mas é necessário verificar se não está antecipando uma diarreia. É mais comum em pessoas que vão ao banheiro de duas a três vezes ao dia.
Tipo 6: as fezes ficam pastosas. Apontam o início de uma diarreia.
Tipo 7: a consistência é líquida. A microbiota intestinal não está funcionando de maneira adequada. É recomendado tomar bastante líquido para recuperar o organismo.
Cocô nunca boia; isso é ruim?
Não, pelo contrário. É sinal de que a dieta está saudável, ou seja, com um bom consumo de água, fibras e proteínas, e um valor equilibrado de carboidratos e gorduras. Por outro lado, quando a pessoa ingere muita fritura e alimentos gordurosos, as fezes se tornam mais aeradas, com bastante gordura e gases, o que faz com que o cocô comece a boiar.
Além disso, quando o cocô não está no fundo do vaso, pode indicar algum distúrbio de fígado e pâncreas. Quando isso ocorre com muita frequência é bom procurar um médico, para que ele peça alguns exames e investigue se existe algum problema nesses órgãos.
Existe cocô 'certo'?
A consistência das fezes pode ter algum significado desde que haja uma modificação do habitual que você vinha apresentando. O considerado normal são fezes firmes, íntegras, mas de consistência mais pastosa, moldável, que se adapta ao canal do ânus sem machucá-lo.
De forma bem geral, podemos dizer que a consistência das fezes sugere o quanto tempo elas demoraram para serem evacuadas. Aquelas que demoram às vezes dias nesse processo acabam ressacando mais e ficando bem duras. No caso das infecções intestinais, a passagem é tão rápida que não há a correta absorção de água. E temos a diarreia.
Contudo, tanto fezes muito líquidas como endurecidas podem estar associadas a doenças infecciosas, parasitárias, inflamatórias ou mesmo neoplásicas (tumores). Por isso, se uma alteração no hábito intestinal for contínua, é preciso procurar um gastroenterologista para que o problema seja investigado.
O tamanho, em si, não quer dizer nada. Normalmente, a quantidade de fezes varia de acordo com a quantidade de fibras ingerida. Quanto mais fibras, mais bolo fecal nós formamos e, consequentemente, maior a quantidade de fezes.
O que é isso no meu cocô?
Pedaços de comida podem ser encontrados nas fezes, dependendo do tempo de trânsito intestinal que o paciente apresenta. Geralmente, elas indicam para um trânsito rápido e, eventualmente, para uma doença inflamatória. As fibras aparecem com relativa frequência.
Neste caso, essas fibras se referem a qualquer carboidrato não digerido, ou seja, um açúcar que a gente não consegue quebrar e absorver. As fibras insolúveis são as responsáveis pela formação do bolo fecal e, dependendo da quantidade delas e da rapidez desse trânsito, essas fibras aparecem nas fezes. São fontes de fibra insolúvel: grãos, cereais, vegetais e talos de vegetais, verduras folhosas e bagaços de frutas.
E não são apenas seres inanimados que podem surgir: alguns parasitas, dependendo do tamanho, podem aparecer nas fezes e é até mesmo possível fazer um diagnóstico só olhando para as fezes como, por exemplo, observando a presença de tênia e áscaris lumbricoides.
Quando algo não cheira bem
Se for só o cheiro, não há muito motivo de preocupação. Somente quando um cheiro muito forte está associado a fezes enegrecidas, aí, sim, existe a possibilidade de um sangramento digestivo. O cheiro do seu cocô depende muito do tipo de alimento que você ingere e das bactérias que moram no seu intestino (a chamada microbiota intestinal).
Conforme especialistas, pessoas com uma microbiota que se caracteriza pela produção do gás metano normalmente têm constipação intestinal (prisão de ventre) e fezes com pouco ou nenhum mau cheiro. Já aqueles com um quadro mais tendendo a diarreia e com microbiota produtora de gás sulfídrico normalmente tem fezes e flatulências muito mal cheirosas.
Fontes: Agência Einstein; Lucia Camara, da Sociedade Brasileira de Coloproctologia; Paulo Saldiva, professor de patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Lorena Willers Coutinho, médica cirurgiã e coloproctologista do Hospital Sepaco, em São Paulo; Marta Machado, gastroenterologista e presidente da ABCD (Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn); Vanessa Prado, cirurgiã do aparelho digestivo e médica do centro de especialidades do aparelho digestivo do Hospital Nove de Julho, em São Paulo; Wagner Sobottka, cirurgião do aparelho digestivo e coordenador do serviço de cirurgias de emergência do Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba, no Paraná; Gabriela Cilla, nutricionista da Clínica NutriCilla, em São Paulo e gastróloga; Ricardo Barbutti, gastroenterologista do HC-FMUSP (Hospital da Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo); Bruno Zilberstein, gastroenterologista da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
*Com informações de matérias publicadas em VivaBem em 04/09/2020, 27/10/2020 e 14/08/2021