Cérebro de goleiro: como atletas são capazes de defesas tão rápidas?

Se você acompanha jogos de futebol com frequência, provavelmente aprecia a emoção das cobranças —e, por vezes, defesas— de pênaltis quando a partida chega a este estágio.

E não é para menos: os goleiros e goleiras se encontram diante da tarefa de proteger um gol que possui sete metros de largura por 2,5 metros de altura, contra um chute que se origina a apenas 12 metros de distância, e chega a uma velocidade maior que 100 quilômetros por hora.

A tomada de decisão —incluindo a leitura do corpo de quem vai chutar e a reação em direção ao lado certo— precisa acontecer de forma quase automática.

A partir do instante em que o pé do jogador entra em contato com a bola, cerca de 400 milissegundos se passam até que ela alcance o gol —um intervalo de tempo aproximado ao de um piscar de olhos.

E ainda assim é possível que o atleta se adiante na defesa, o que é resultado de muito treino e de várias reações combinadas do cérebro.

Como o cérebro reage em uma defesa de pênaltis

No cérebro, tudo começa com a identificação visual dos elementos que o goleiro enxerga.

"A informação visual é processada rapidamente no cérebro do goleiro da seguinte forma: a luz refletida dos objetos no estádio atinge o olho do goleiro, onde é convertida em impulsos elétricos pelos neurônios na retina. Esses impulsos viajam até o lobo occipital, onde as informações visuais, como distância, formato e cores, são interpretadas", explica André Souza, doutor em psicologia cognitiva e neurociências pela Universidade do Texas, nos Estados Unidos.

Segundo ele, esse processo ocorre em milésimos de segundos, levando de 100 a 200 milissegundos para ser concluído no córtex visual.

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O próximo passo, antes da decisão, é a leitura específica do corpo do adversário direto —ou o atleta que vai bater o pênalti.

Estudos de rastreamento ocular demonstram que goleiros experientes se baseiam nos sinais emitidos pelo corpo do cobrador, especialmente observando os movimentos do tronco e das pernas, para fazer suas previsões.

"Muitas características da forma como a jogadora se posiciona e age podem dar pistas sobre como ela pretende cobrar. É importante observar para onde ela está direcionando o olhar, como está posicionando o corpo, os movimentos do quadril e do pé de apoio, bem como a velocidade com que se aproxima da bola", explica Jessica Ferreira, preparadora de goleiras do São José Futebol Feminino.

"É uma análise complexa para ser feita em um curto período, mas se a goleira conseguir interpretar esses sinais juntamente com o ângulo da corrida da jogadora em direção à bola, ela pode antecipar o local da cobrança", diz Ferreira.

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Imagem: São José Futebol Feminino

No que se trata dos processos cognitivos que permitem aos goleiros antecipar a direção de um chute com base nos movimentos do cobrador, é importante entender que o cérebro é um sistema interconectado.

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"Embora existam áreas específicas para funções específicas, nada opera de forma isolada. Para tomar uma decisão, o cérebro passa por um processo complexo de processamento de informações em várias áreas, incluindo memória, linguagem, movimento e emoção", explica Viviane Louro, neurocientista e professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

No contexto dos goleiros, as áreas do cérebro relacionadas à prontidão motora, planejamento motor, reflexos motores e percepção corporal incluem principalmente o córtex motor, o córtex pré-motor, o cerebelo, o tronco encefálico e algumas regiões do córtex parietal.

"Essas áreas trabalham em conjunto para coordenar os movimentos, tomar decisões rápidas e processar informações sensoriais relacionadas ao corpo e aos movimentos físicos", explica Louro, lembrando que tudo isso acontece de forma quase automática.

Há, ainda, emoções que podem desempenhar um papel positivo —no caso de alguém que lida bem com adrenalina, ou que está se sentindo particularmente confiante— ou negativo, quando há ansiedade e nervosismo.

"É um momento muito particular de cada uma, pois cada uma reage de forma diferente nessa ocasião. A atleta deve entender que o pênalti é uma ação do jogo como qualquer outra. O importante é que mantenha o nível de concentração elevado e tenha autonomia e segurança para tomar a decisão que achar melhor naquele momento", afirma a preparadora de goleiras.

Por fim, o tipo de função que Ferreira desempenha, o treino diário com as atletas, também tem um papel importante na resposta cerebral e, consequentemente, na resposta física.

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"Não tem como fazer o processamento ficar mais rápido com o treinamento, mas o caminho que a informação percorre pode sim ser treinado e otimizado. A resposta rápida é altamente baseada na experiência, então, quanto mais exemplos e pistas, mais informações o cérebro vai ter para poder formar padrões", aponta André Souza.

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