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Autotransplante de pulmão era única chance de eles sobreviverem - deu certo

Oswaldo Santos tinha câncer de pulmão e sua única chance de sobreviver era fazer um autotransplante Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para VivaBem

08/10/2023 04h16

Fumante há mais de 50 anos, o porteiro Oswaldo de Jesus Santos, 68, teve câncer de pulmão. Já Dionísio foi acometido por metástases pulmonares decorrentes de um sarcoma sinovial —tipo de tumor maligno de partes moles que acomete preferencialmente coxa, braço, pés e articulações.

Dois casos diferentes, mas com algo em comum: Oswaldo e Dionísio* realizaram com 100% de sucesso um autotransplante de pulmão, cirurgia complexa feita apenas três vezes no Brasil —duas delas no SUS.

O autotransplante pulmonar é um procedimento oncológico em que o pulmão afetado é retirado e levado para uma mesa auxiliar. Lá, o tumor (tecido doente) é removido do órgão, a parte sadia (o lobo) é preservada e reimplantada no paciente, que fica livre da doença.

A cirurgia é feita de maneira segura, delicada e controlada, onde reimplantamos os vasos sanguíneos e a via aérea do lobo pulmonar volta a funcionar normalmente. Marcos Samano, cirurgião torácico da Rede D'Or São Luiz e responsável pelas três cirurgias feitas no país

Fumante desde os 13 anos de idade e com quadro de enfisema pulmonar, o porteiro Oswaldo descobriu o câncer de pulmão em 2020 após sentir fortes dores no peito, ser erroneamente diagnosticado com tuberculose, fazer vários exames e passar em quatro médicos.

Com tumor em estágio avançado, ele teria que retirar todo o pulmão direito, mas tinha dois obstáculos: não aguentaria a cirurgia nem teria condições de viver apenas com o pulmão esquerdo.

Quem pode fazer o autotransplante pulmonar

Oswaldo com o médico Marcos Samano Imagem: Arquivo pessoal

Em pacientes com tumores pulmonares volumosos, como era o caso de Oswaldo, existem algumas alternativas, e uma delas é a retirada de todo um pulmão (pneumonectomia). Mas, por ser uma cirurgia de grande porte, muitos não toleram fazê-la devido às sequelas, como falta de ar e necessidade de oxigênio.

Se após a avaliação for considerado que a pessoa não possui reserva pulmonar para retirar o órgão, ela não é operada e é encaminhada para tratamento paliativo, com baixa probabilidade de cura.

É aí que o autotransplante pulmonar surge como uma opção: ele é indicado para indivíduos com tumores pulmonares volumosos considerados inoperáveis ou irressecáveis.

"O objetivo é curativo, ou seja, o paciente ficar livre do tumor. É uma cirurgia complexa que envolve conhecimento e habilidade técnica em transplante pulmonar e oncologia", comenta Samano, que também é professor doutor de cirurgia torácica da Faculdade de Medicina da USP.

Uma outra vantagem da técnica é que o indivíduo não entra em uma lista de espera nem necessita receber a doação de um órgão.

"Por ser um procedimento oncológico e o pulmão/lobo implantado ser do próprio paciente, não há risco de rejeição e não há necessidade de um controle governamental, isto é, uma regulação do sistema de saúde, como ocorre nos transplantes convencionais", afirma o especialista.

É importante dizer que o acesso a esse tipo de transplante ainda é extremamente restrito, já que, no Brasil, apenas Samano realiza a cirurgia.

Por outro lado, o autotransplante pulmonar possui alguns riscos, como hemorragia, infecções, complicações pós-operatórias como embolia pulmonar (quando as artérias do pulmão ficam obstruídas por um coágulo sanguíneo) e risco de morte.

11 anos lidando com o câncer

Em 2012, no interior de São Paulo, Dionísio era diagnosticado com sarcoma sinovial ao sofrer com dores e inchaços na perna esquerda. Passou por quimioterapia, radioterapia e ressecção da lesão para tratar o tumor localmente, mas posteriormente teve metástase nos dois pulmões e foi submetido a três cirurgias torácicas e três ablações pulmonares.

Após 11 anos tratando o câncer, Dionísio decidiu procurar um especialista em tórax com experiência em casos complexos e conheceu Samano.

"Ele me apresentou a possibilidade de retirar o meu pulmão direito, remover o tumor dele e reimplantar a parte sadia. Apesar dos riscos, incluindo o de ter que operar até o coração, já que a lesão no pulmão estava praticamente sentada em cima do átrio esquerdo do coração, me senti confiante para fazer o procedimento", conta.

Chances aproveitadas com sucesso

O porteiro Oswaldo em foto atual, 3 anos depois do autotransplante Imagem: Arquivo pessoal

Dos três pacientes submetidos ao transplante inédito, o porteiro Oswaldo foi o primeiro a ser operado, em setembro de 2020, no Hospital Santa Catarina, em São Paulo, pelo SUS: "O autotransplante pulmonar era a minha única chance de sobreviver. Se não tivesse tirado o 'bicho' [o tumor], talvez não estivesse aqui para contar a minha história".

Durante a recuperação, ele teve uma embolia pulmonar e foi intubado, mas recebeu alta após o quadro se estabilizar.

Em março de 2023, Dionísio realizou o procedimento no Hospital São Luiz Itaim, em São Paulo, pela rede privada. "A cirurgia durou 11 horas e foi um sucesso graças à presença de Jesus e a habilidade do doutor Samano e sua equipe. Fiquei apenas 12 dias internado e tive uma ótima recuperação. Poucos dias depois da alta, já estava praticando exercícios e trabalhando a todo vapor", comemora.

Quase três anos após o transplante, Oswaldo segue livre do câncer, parou de fumar e beber, toma remédio para o pulmão e faz acompanhamento periódico. "Me sinto bem e saudável. Deus me deu uma segunda chance."

Grato pela sua saúde e por cada dia de vida, Dionísio deixa um conselho para pessoas que têm uma doença grave: "Busque especialistas experientes e que abracem o seu caso a ponto de terem certeza que estão seguindo o melhor caminho. Com fé, não há nada perdido, apenas algo a ser enfrentado".

*Nome fictício a pedido do entrevistado.

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