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De corante ao apetite 'eterno': por que ultraprocessados são tão ruins?

Imagem: iStock

Priscila Carvalho

Colaboração para o VivaBem

16/10/2023 04h00

Você já deve saber que não faz bem exagerar em biscoitos recheados, salgadinhos "de pacote", refrigerantes e macarrão "instantâneo". Chamados alimentos ultraprocessados, esses itens estão associados a diversos problemas de saúde, como obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes, depressão e alguns tipos de câncer. Mas o que faz uma simples guloseima ser tão prejudicial?

Muitos alimentos passam por um processo industrial, como enlatados ou até seu pãozinho fresco. Mas os alimentos ultraprocessados têm seus ingredientes transformados em produtos industriais, usando combinações de aditivos (como corantes e conservantes), sabores e texturas não encontrados na natureza, em sua maioria. É um "Transformer" alimentício. Um simples milho, por exemplo, torna-se um salgadinho triangular laranja com sabor de queijo.

Prejudica processo digestivo

Nesse processo, os alimentos perdem propriedades importantes, como a quantidade de fibras. No caso de arroz, trigo, aveia e milho, a indústria mói ou refina esses grãos, reduzindo ou eliminando por completo esse nutriente importante para o funcionamento do intestino e para a saciedade.

Em entrevista ao The Washington Post, Anthony Fardet, cientista nutricional do Instituto Nacional Francês de Agricultura, Alimentação e Meio Ambiente que estuda os efeitos do processamento de alimentos na saúde, disse que o ultraprocessamento quebra as ligações entre os nutrientes e cria novas ligações que o nosso corpo pode não reconhecer. "Ao fazer isso, perturba o processo digestivo", disse.

Essas formulações industriais também costumam ser ricas amido, o que pode afetar a forma como o corpo absorve a glicose e outros nutrientes, conforme mostrou um estudo publicado no periódico The American Journal of Clinical Nutrition em agosto de 2021. Segundo os pesquisadores, a longo prazo, essas alterações na digestibilidade e nas respostas metabólicas podem estar associadas ao risco de diabetes tipo 2 e obesidade.

Composição nutricional desbalanceada

Segundo o Guia Alimentar para a População Brasileira, as alterações industriais deixam esses alimentos ricos em gorduras e açúcares, e é comum que tenham alto teor de sódio, por conta da adição de grandes quantidades de sal, "necessárias para estender a duração dos produtos e intensificar o sabor, ou mesmo para encobrir sabores indesejáveis oriundos de aditivos ou de substâncias geradas pelas técnicas envolvidas no ultraprocessamento".

Ainda segundo a publicação, a ausência ou presença limitada de alimentos in natura ou minimamente processados nesses produtos faz com que eles sejam pobres em vitaminas, minerais e outras substâncias com atividade biológica.

Confunde a saciedade

Quando comemos alimentos ricos em fibras, eles não são absorvidos tão facilmente, então percorrem todo o trajeto pelo trato digestivo até o intestino grosso, onde vivem as bactérias que compõem o intestino.

Entretanto, quando se trata de ultraprocessados, a história é diferente. Um estudo publicado em maio no periódico Nature Communications mostrou que alimentos altamente processados são absorvidos mais rapidamente no trato gastrointestinal superior, o que significa mais calorias para o corpo e menos para o microbioma intestinal, localizado próximo ao final do trato digestivo. Como resultado, comemos mais e ficamos com fome mais rápido. É como se tivéssemos apetite o tempo todo.

Além disso, os alimentos ultraprocessados interferem na saciedade de outras formas:

São feitos para serem facilmente digeridos e contêm uma gama de sabores palatáveis, tornando os produtos irresistíveis —um prato cheio para desenvolver uma compulsão alimentar.

A maioria dos alimentos ultraprocessados é formulada para ser consumida em qualquer lugar e sem a necessidade de pratos, talheres e mesas.

Como seus ingredientes são mais baratos, é comum que esses alimentos sejam comercializados em recipientes ou embalagens gigantes e a preço apenas ligeiramente superior ao de produtos em tamanho regular.

O organismo humano tem menor capacidade de "registrar" calorias provenientes de bebidas adoçadas (refrigerantes, refrescos e sucos).

Impacta cultura e vida social

Campanhas publicitárias fazem das embalagens desses produtos atrativas e conhecidas mundialmente. Alimentos in natura e locais passam a ser vistos como desinteressantes, especialmente
pelos jovens.

"A consequência é a promoção do desejo de consumir mais e mais para que as pessoas tenham a sensação de pertencer a uma cultura moderna e superior", avalia o Guia Alimentar para a População Brasileira.

A forma como são disponibilizados também não demanda preparo —os produtos já vêm prontos para comer. A mesa de refeições e o compartilhamento da comida se tornam totalmente desnecessários, e a pessoa tende a se alimentar sozinha, vendo TV ou mexendo no celular.

Como diminuir o consumo desses alimentos

Embora os ultraprocessados sejam convenientes, é crucial lembrar que eles são uma escolha alimentar de baixa qualidade que pode ter sérias consequências para a nossa saúde a longo prazo.

Por isso é importante optar por alimentos frescos, minimamente processados, além de seguir uma dieta equilibrada. Para isso, coloque metas realistas para não voltar a comer determinados alimentos de forma exagerada e com compulsão.

Evite também pular as refeições, para não gerar fome excessiva e se "perder" nos alimentos mais fáceis. Tente planejar também a alimentação ao longo do dia para evitar escolhas impulsivas. É importante priorizar frutas, verduras, grãos integrais e outros alimentos que são mais saudáveis.

Por último, cozinhe e priorize comer em casa. Dessa forma, terá um controle maior da ingestão e manuseio dos alimentos, além de optar por escolhas que não são ultraprocessadas como saladas, grãos, frutas e menos comidas embaladas e industrializadas.

Fontes: Lorena Ellen da Silva Lima, nutricionista da unidade de Teresina (Piauí) da AmorSaúde, rede de clínicas associadas ao Cartão de TODOS; Gabrielle Ducci, nutricionista, coordenadora do Serviço de Nutrição do Hospital Pilar, em Curitiba (PR); Marcella Oliveira, nutricionista dos Hospitais São Marcelino Champagnat e Universitário Cajuru.

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