Estudos encontram relação entre jejum e menor risco de diabetes e Alzheimer
O jejum intermitente, dieta baseada em intercalar janelas de alimentação com horas sem comer nada, já se popularizou como uma alternativa para quem deseja perder peso. Agora, um estudo realizado por pesquisadores australianos mostrou que fazer jejum pode ser mais benéfico para reduzir risco de diabetes tipo 2 do que uma dieta comum de restrição de calorias.
O trabalho contou com 209 voluntários e apontou que as pessoas que fizeram três dias de jejum não consecutivos —com uma janela de alimentação apenas das 8h às 12h— apresentaram maior tolerância à glicose após seis meses de jejum do que aqueles com dieta diária de baixa caloria.
"Os participantes que seguiram a dieta de jejum intermitente foram mais sensíveis à insulina e também experimentaram uma redução maior nos lipídios do sangue do que aqueles na dieta de baixa caloria", disse Leonie Heilbronn, uma das responsáveis pela pesquisa.
O diabetes tipo 2 é uma condição que ocorre quando o corpo não é mais capaz de produzir insulina (hormônio responsável pelo controle da glicose no sangue) suficiente ou usá-la efetivamente.
Os autores do estudo observam que são necessárias mais pesquisas para investigar se os mesmos benefícios são experimentados com uma janela alimentar um pouco mais longa, o que poderia tornar a dieta mais sustentável a longo prazo.
Cynthia Valério, diretora do departamento de dislipidemia e aterosclerose da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), acredita que a grande vantagem dos estudos de jejum intermitente que têm sido publicados recentemente é a possibilidade de flexibilização da dieta para os pacientes que têm diabetes tipos 2, obesidade ou outras condições metabólicas. "Antigamente, tinha-se a ideia de que comer de 3 em 3 horas era a única maneira e a mais adequada para os tratamentos desses casos", diz.
Para a especialista, a grande mensagem que fica é que a dieta tem que ser individualizada, adequada para cada perfil de paciente. "Alguns vão preferir fazer dietas estruturadas, de restrição contínua, ingerindo a mesma quantidade de calorias todos os dias da semana. Um modelo nunca vai servir para todos. É preciso levar em conta o estilo de vida do paciente e suas necessidades", afirma.
Efeito no Alzheimer
Além do diabetes tipo 2, o jejum intermitente também parece ter efeito sobre doenças neurodegenerativas, como Alzheimer. Um estudo feito com ratos mostrou que, quando os animais seguiam uma dieta baseada em restrições durante um determinado período de tempo, demonstraram melhorias notáveis na função da memória.
Notou-se também que as proteínas amiloides, que são ligadas à doença de Alzheimer, tiveram menos facilidade para se acumular nos cérebros dos ratos em jejum. Além disso, os bichos mostraram um padrão de sono regular, ficaram menos hiperativos à noite e tiveram menos problemas para se manter dormindo, em comparação com os ratos que podiam comer a qualquer hora.
"Durante muitos anos, assumimos que as perturbações circadianas observadas em pessoas com Alzheimer são resultado da neurodegeneração, mas agora estamos aprendendo que pode ser o contrário: a perturbação circadiana pode ser uma das principais causas da patologia", afirmou a neurocientista Paula Desplats, da UC San Diego, que fez parte do estudo.
Adotar um regime de jejum intermitente é algo que as pessoas podem fazer com relativa facilidade e rapidez. Se os mesmos resultados forem encontrados em testes em humanos, será uma opção promissora a ser considerada na luta contra a doença.
Horário importa?
Quando você come, e não apenas o que você come, pode ter impacto na saúde, revela pesquisa realizada pela Universidade de Chicago. O estudo mostra que comer durante o dia (de manhã até o final da tarde) contribui para a perda de peso e melhora a sensibilidade à insulina, enquanto iniciar uma janela alimentar à tarde e terminá-la à noite não traz benefícios.
A explicação tem relação com o nosso ciclo circadiano —relógio interno que nos ajuda a saber qual o momento certo para fazer coisas como dormir, comer e estar alerta. Assim, nosso corpo sabe exatamente o que fazer em cada horário do dia.
No período noturno, com a ausência da luz do sol, nosso organismo produz melatonina, hormônio que nos prepara para o repouso. "O gasto energético a noite é menor e manter nesse horário níveis elevados de insulina prejudica sono, metabolismo e secreção hormonal", afirma Claudia Chang, pós-doutora em endocrinologia e metabologia pela FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
Jejum é para todos?
Quem faz esse tipo de dieta pode sentir dores de cabeça, tontura e dificuldade de concentração enquanto está no período de restrição alimentar, ou seja, nem todo mundo consegue se adaptar. Por isso, cabe ao nutricionista e ao endocrinologista montar uma estratégia sobre qual tipo de programa alimentar que vai ser mais eficiente para cada paciente.
O jejum intermitente não é recomendado para algumas pessoas, alerta Levimar Araujo, presidente da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes). "É contraindicado para crianças em fase de crescimento, e para a mulher que está amamentado não é interessante, pois ela já está perdendo calorias. Idosos também merecem atenção. Em relação ao diabetes, algumas situações exigem atenção. Por exemplo, quem tem diabetes tipo 1 não pode ficar várias horas sem se alimentar, pois há risco de ter uma hipoglicemia", diz.
Além disso, vale lembrar, os alimentos ingeridos tanto nos dias normais quanto nos dias de jejum devem ser ricos nutricionalmente. "Comer vegetais, ter fibras e proteínas suficientes nas refeições e reduzir o açúcar refinado são recomendações que têm benefícios na prevenção e tratamento de várias doenças crônicas, como diabetes e dislipidemia. Escolhas saudáveis precisam fazer parte das refeições quando se escolhe o jejum intermitente como um padrão alimentar", diz Patrícia Moreira Gomes, endocrinologista e diretora da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo).
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