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Médico deu 6 meses de vida, mas ela tratou câncer e engravidou aos 43 anos

Gislene com o marido Marcelo e a filha Ariel; ela engravidou de Emanuele aos 43 anos, naturalmente, após tratar câncer de mama Imagem: Arquivo pessoal da família Vieira Rodrigues

De VivaBem, em São Paulo

27/10/2023 04h18

"Você está num estágio terminal. Se você tiver um bom convênio, tem de três a seis meses de vida."

A declaração do médico assustou, mas não paralisou. O diagnóstico de câncer de mama antes dos 40 anos já tinha sido um grande impacto, mas Gislene Vieira Rodrigues tinha uma missão e sonhos a realizar.

A filha Ariel, então com 8 anos, e a intenção de aumentar a família mantiveram a professora e psicopedagoga firme ao longo do tratamento. "Eu peguei como um objetivo de vida mesmo, de não deixar o câncer me derrubar pela cabeça", ela diz.

Para isso, contribuiu também a rede de apoio que ela teve, com marido, filha e irmãos se mobilizando para ajudá-la, seja a se vestir, cuidar da casa ou levá-la ao médico.

Algo errado

Era 2017. Os vários exames que Gislene fez antes de tentar uma nova gestação mostraram uma boa saúde. Mas, no fundo, ela sabia que tinha algo errado. "Eu sentia muitas dores nas pernas e nas costas que achava que não eram normais", lembra.

Talvez fosse o cansaço comum à profissão, que demanda muitas horas em pé e movimentos contínuos. Os médicos garantiram que estava tudo bem; afinal, ela era jovem, 37 anos. Só que o incômodo virou desespero e ela só queria descobrir o que tinha.

Um dia, tomando banho, sentiu um carocinho no seio. A resposta imediata foi cogitar e não querer acreditar, mas a mamografia confirmou o tumor avançado já com metástase no pulmão. "Em nenhum momento eu parei. Eu preferia saber com o que eu estava brigando."

Tudo muda

Gislene foi diagnosticada com câncer de mama aos 37 anos Imagem: Arquivo pessoal

O câncer não é algo que se imagina e se espera. Quando ele chega, tudo muda. E a nova realidade de Gislene veio acompanhada da notícia de que estava grávida também. Ali, mais uma vez, ela soube que a doença não era o fim.

"Hoje a medicina está avançada, então tudo o que tiver de ciência, enquanto eu puder, vou fazer uso", determinou-se.

Assim como antes ela sabia, de alguma forma, que havia algo errado, naquela hora ela também entendia que tudo poderia ficar bem.

Eu tinha um propósito para mim. Eu não briguei com Deus, eu conversei com ele. Eu travei essa luta sempre com o objetivo de estar bem, sempre com essa intenção de aumentar a família. Gislene Vieira Rodrigues

Foi com essa determinação que a professora descartou a sentença dada pelo médico, de até seis meses de vida, e buscou outra avaliação. A nova médica confirmou a gravidade do caso, disse que não seria fácil e que a quimioterapia precisava começar urgentemente.

Mas o que a profissional disse em seguida foi devastador: em algum momento, durante o tratamento, Gislene teria de escolher entre a própria vida e a do bebê. "De tudo, até hoje, foi a parte mais difícil, mais até do que o próprio diagnóstico."

Nova vida

Pela situação, não havia como a professora congelar óvulos ou embriões, uma forma de preservar a fertilidade para tentar uma gravidez no futuro. A opção é sugerida porque a quimioterapia é agressiva ao sistema reprodutivo. Por isso também, a médica não poderia garantir que uma nova gestação fosse possível depois.

Gislene recorreu à fé novamente e, acreditando que tudo coopera para o bem, pediu ajuda divina. Dois dias antes de começar o tratamento, ela teve um aborto espontâneo. E não se deixou abalar.

Foi uma sequência de quimioterapia, cirurgia, radioterapia, imunoterapia e uma nova medicação que estava em teste. Em abril deste ano, ela interrompeu o tratamento porque se descobriu grávida, naturalmente, aos 43 anos. Numa gestação tranquila, ela está a poucos dias de conhecer o rosto de Emanuele.

"Em nenhum momento eu fui aconselhada a engravidar e, para os médicos, era quase impossível, por todo o processo que eu passei", diz a professora. "Mas eu recebi [a notícia da gravidez] de maneira muito tranquila, porque eu sabia que ia acontecer."

Lado a lado

"Quando a pessoa descobre um câncer, a família inteira adoece e se transforma", diz Gislene. E por sentir essa dor, ainda que não física, a família dela se reestruturou para ajudá-la no processo.

O marido permaneceu ao lado dela, e se não pudesse acompanhá-la ao médico, uma irmã ia. Outra cuidava da casa e da filha do casal. A mãe sempre ali. Os colegas de trabalho apoiando.

"Mas nunca com a ideia de 'coitadinha'. Porque você não tem de ter um olhar de pena para o outro. Tem de ter empatia, mas focar no que o outro precisa de você."

Segundo Karina Belickas, mastologista do Hospital e Maternidade Santa Joana, esse suporte incentiva a pessoa com câncer a se cuidar melhor, seguir as orientações de forma adequada, ter alimentação saudável e fazer atividade física.

"Ter rede de apoio ajuda a melhorar a qualidade de vida em qualquer tipo de doença. Você se cuida mais se sente que é importante para alguém. E quando você tem filho, você não quer morrer, porque tem que cuidar daquele filho", diz.

Câncer de mama antes dos 40

Um estudo realizado com 2.888 mulheres brasileiras diagnosticadas com câncer de mama mostrou que 486 (17%) tinham 40 anos ou menos. Em mais jovens, os subtipos do tumor são mais agressivos, a descoberta se dá em estágio mais avançado e a resposta ao tratamento tende a ser pior.

O cenário chama atenção porque, nessa faixa etária, as mulheres são economicamente ativas, estão construindo família, estabelecendo a carreira e ainda não têm filhos, de modo geral. Mas o porquê desse cenário ainda não está totalmente esclarecido.

Rastreio antes dos 40

No Brasil, o Inca (Instituto Nacional do Câncer) recomenda rastreamento com mamografia a cada dois anos para mulheres entre 50 e 69 anos.

Já a SBM (Sociedade Brasileira de Mastologia), o CBR (Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem) e a Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) indicam o exame anual a partir dos 40 anos.

Para Gustavo Badan, responsável pela equipe de radiologia mamária do Hospital Santa Catarina - Paulista, a diferença de orientação está na relação custo-efetividade. "As sociedades têm o ponto de vista baseado na paciente. O Inca, ligado ao governo, pesa os custos da implantação dos exames", diz.

Outro argumento é que, antes dos 40 anos, as mamas são naturalmente mais densas, o que dificulta identificar um tumor. Caso ele exista, é possível que não seja identificado e a mulher sinta uma falsa tranquilidade.

Por outro lado, há risco de falsos positivos, ou seja, identificar algo que não será prejudicial à mulher. "Antes dos 40, o benefício comprovado de conseguir diagnosticar é com exame auxiliar e em mulheres de alto risco", afirma Karina Belickas, ginecologista e obstetra do Santa Joana.

O exame complementar pode ser ultrassom ou, se for viável, ressonância. "Ainda assim, a mamografia continua sendo muito importante, porque consegue detectar a fase mais inicial da doença", diz Badan.

Quem tem alto risco?

Segundo a SBM, a possibilidade de uma mulher ter câncer de mama durante a vida é de 12,5%, ou uma em cada oito. De modo geral, entre os fatores de risco estão:

  • Idade;
  • Histórico reprodutivo;
  • Histórico de câncer na família;
  • Fatores ambientais;
  • Hábitos de vida (dieta, prática de exercícios etc.);
  • Genética.

Calculadoras de risco avaliam esses e outros fatores e apontam se o risco é habitual ou aumentado (acima de 20%). O alto risco depende do contexto, do peso dos fatores analisados.

É importante lembrar que, isoladamente, esses aspectos não confirmam a possibilidade elevada. Por isso é importante consultar especialistas que analisem todo o conjunto com a ferramenta adequada.

Se o risco for habitual: o rastreamento começa a partir dos 40 anos. Antes disso, é importante obter informações e ter conhecimento do próprio corpo para identificar possíveis alterações. As consultas médicas podem ser feitas a cada um ou três anos.

Se o risco for aumentado: deve-se fazer um rastreamento personalizado, com exames de mamografia e ultrassom ou ressonância a cada ano.

Gravidez após tratamento de câncer

Belickas ressalta que não é o câncer, mas o tipo de tratamento que interfere ou não na fertilidade. "Se for só cirurgia, a fertilidade permanece igual." Já a quimioterapia afeta as células reprodutivas, o que pode dificultar a concepção.

Em um comparativo geral, uma mulher de 25 anos têm mais chances de engravidar espontaneamente após a quimio do que uma de 40 que fez o mesmo tratamento. Em todos os casos, há possibilidade de congelar óvulos ou embriões caso elas desejem.

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