De amidalite à morte: como age bactéria que pode ter matado crianças em MG
Maurício Businari
Colaboração para VivaBem
01/11/2023 04h00
Enquanto a Secretaria de Saúde de São João Del-Rei (MG) investiga se a morte de três estudantes da rede de ensino da cidade foram causadas pela bactéria Streptococcus pyogenes, pais de alunos seguem preocupados e cobrando ações do Poder Público.
À medida que mais cidades da região fecham escolas e suspendem aulas para medidas profiláticas, o medo e a insegurança se espalham. Muitos pais e responsáveis estão usando as redes sociais para denunciar o surgimento de novos casos e também protestar contra o que consideram um "despreparo" por parte do Poder Público no enfrentamento da disseminação do contágio.
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Ao mesmo tempo, a falta de esclarecimentos confiáveis faz com que muitos tenham ainda dúvidas sobre as formas de contágio, tratamento e combate à bactéria. Alguns chegam a pedir auxílio nos posts, para entender quais os riscos do "vírus" que estaria se espalhando pela cidade e deixando as crianças doentes.
O UOL ouviu a infectologista Luana Araújo, especialista em doenças infecciosas pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e mestra em Saúde Pública pela universidade Johns Hopkins Bloomberg, nos Estados Unidos.
Segundo a médica, o Streptococcus pyogenes pertence ao grupo de bactérias do tipo "A", que inclui diversos tipos de Streptococcus, e está geralmente associado a quadros leves a moderados.
A sintomatologia depende de onde essa bactéria está localizada. Se está na faringe, o paciente apresentará uma faringite bacteriana, se localizada na amídala, vai ter uma amidalite bacteriana.
Luana Araújo
Quando localizada na faringe, principalmente em grupos de indivíduos entre 5 a 15 anos, por questões imunológicas e predisposição à bactéria, a infecção pode evoluir para um quadro mais grave, a escarlatina. A partir daí surgem erupções cutâneas que tornam a pele áspera. Geralmente, começa no rosto e desce para o tronco e os membros. A língua fica um pouco inchada e as papilas, mais proeminentes.
Quando localizada na pele, a bactéria provoca um quadro leve, chamado impetigo, na maioria das vezes. Mas existe a possibilidade de evolução para quadros mais graves, explica Luana, citando a erisipela e a fascite necrotizante.
A erisipela é uma infecção bacteriana relativamente comum da camada superficial da pele, que se estende aos vasos linfáticos superficiais, promovendo uma erupção cutânea vermelha, sensível e brilhante, geralmente no rosto ou nas pernas. Ela provoca febre alta, calafrios e mal-estar geral.
Já a fascite necrosante é muito grave e promove a morte do tecido mole do corpo. Os sintomas iniciais incluem uma área de pele vermelha, quente e inchada que se espalha rapidamente, dor intensa, febre e vômitos.
Doença invasiva
Um grupo ainda menor de pacientes pode ser acometido por uma doença invasiva provocada pela bactéria, e isso depende tanto da imunidade do paciente quanto da virulência da própria bactéria, diz a infectologista.
"A infecção pode chegar à corrente sanguínea, afetando cérebro, meninges, rins, e leva a um quadro tão grave que pode causar o óbito do paciente. É essa situação que está sendo investigada em São João del-Rei. Mas isso é uma suposição, porque a gente ainda não tem resultados de laboratório que comprovem", explica Luana.
A transmissão da bactéria Streptococcus pyogenes se dá através do contato com a secreção contaminada desses pacientes. Se o paciente apresenta um quadro respiratório, com tosse e espirros, as secreções produzidas, ricas em bactérias, podem infectar uma pessoa saudável.
Essa é uma bactéria altamente contagiosa. Então há uma grande chance da pessoa, ao contato com essas secreções, se contaminar e desenvolver alguma doença. Para evitar o contágio, como no caso das escolas, a primeira medida é retirar a criança de circulação. Ela deve ser atendida por um médico e permanecer em casa, se recuperando, para evitar o contágio para outras crianças.
Luana
Isolar ambientes não resolve
A higienização das mãos é um fator profilático a ser considerado sempre, já que, ao tocar em uma secreção contaminada, a criança pode levar a mão ao nariz ou à boca e a bactéria encontrar uma porta de entrada para o organismo.
Medidas como isolamento e desinfecção de locais onde a criança contaminada circulou, como vêm fazendo diversas escolas em Minas Gerais, não são eficazes.
"Não há razão nenhuma para fechar escolas e lavar com água sanitária, por exemplo. Se a criança doente, que é a fonte de contaminação, não for retirada de circulação e tratada, de nada adianta lavar a escola inteira. Não há indicação para isso", pontuou a médica.
O tratamento das infecções é feito com antibióticos, já que não existe vacina e também não existem tratamentos profiláticos, ou seja, remédios que a pessoa pode tomar para evitar o contágio. Por essa razão, a médica recomenda aos pais que levem seus filhos ao médico sempre que eles apresentarem sintomas.