Crise de tosse a fez descobrir câncer agressivo aos 21: 'Parecia pesadelo'
Uma crise de tosse fez a estudante Rafaela Koury, de 21 anos, procurar um hospital em junho deste ano em São Paulo. Com um sintoma tão comum, ela não imaginava que o diagnóstico seria um linfoma não-Hodgkin, com um tumor de 17 centímetros na região do mediastino — entre o pulmão e coração.
Por causa da doença, ela precisou adiar temporariamente o plano de fazer um intercâmbio na França. A Viva Bem, Rafaela conta sua história.
'Estava muito cansada'
"Minha família é de Campinas (SP), mas eu moro sozinha na capital para fazer faculdade de publicidade. Estava estagiando, passei na monitoria da minha faculdade... Ao longo do primeiro semestre de 2023, estava muito cansada.
Uns três meses antes do meu diagnóstico eu já tinha um cansaço estranho, mas você nunca vai imaginar que isso vai dar em uma coisa tão séria. Você só acha que está sobrecarregado. Eu achava que talvez fosse um pouco emocional, estava vivendo a minha vida.
Além de trabalhar e estudar, eu dividia o apartamento com mais duas meninas e a gente que cuida da casa. Era uma rotina bem corrida. Passei uma semana tossindo bastante em São Paulo e, como eu iria para Campinas no dia seguinte, deixei para ir ao médico lá.
Mas não deu tempo de marcar com especialista, porque na madrugada eu tive um ataque de tosse repentino e fui ao pronto-socorro com a minha avó. Não era uma tosse normal, eu não conseguia andar de tanto tossir.
Foi o primeiro ataque que tive, de cair pressão, antes ela só vinha e voltava - parecia uma tosse alérgica mesmo. A médica pediu um raio-x do pulmão e me mandou para casa com o diagnóstico de alergia.
Lembro que ela falou: 'seu pulmão está limpinho'. Como era junho, troca de estação, confiei que era alergia e tomei todos os remédios que ela receitou. A tosse melhorou por uns dias com o anti-inflamatório, mas não segurou muito tempo.
'Parecia um pesadelo'
Depois de uns cinco dias, estava na capital com a minha melhor amiga, que mora fora do país e estava passando a semana comigo, até que eu tive um ataque de tosse que conseguiu ser pior do que da primeira vez.
Liguei para o meu pai, disse que não estava conseguindo respirar e fui para o hospital. Isso foi na noite do dia 13 de junho, depois da aula.
Às 4h30 da manhã, saiu o resultado da tomografia, indicando água no pulmão e uma massa consideravelmente grande, do tamanho equivalente a mais da metade do meu pulmão, no mediastino - a região entre o pulmão e o coração.
Dali para frente foi exame atrás de exame para confirmar o diagnóstico de linfoma não-Hodgkin. Me internaram na hora e fiquei umas três horas em uma máquina de ressonância, morrendo de dor. Parecia um pesadelo.
Eu considero o erro da primeira médica que me atendeu muito grave. Primeiro, porque meu tumor era muito grande, tinha 17 centímetros. Segundo, porque ela me deu muita tranquilidade.
Lembro dela falando, com muita segurança, que meu pulmão estava limpo. Não imaginava que fosse uma coisa séria, realmente achava que fosse somente uma tosse alérgica.
@rafakouryE é assim que a minha vida virou de cabeça pra baixo em 1 semana
? som original - Rafa
Na segunda vez que estive no hospital, percebi que os exames estavam demorando muito para sair. Teve uma situação em que a médica me chamou na sala, abriu o exame, e me pediu para sair. Chamou outra médica e depois falou para eu retornar. Nesta hora eu pensei: acho que eles acharam alguma coisa mais séria.
Eu estava controlada, mas quando vi a tomografia comecei a chorar na hora. Percebi que era algo mais grave, na hora pensei: 'é câncer'. Até pela reação da médica do pronto-socorro era claro. Uma semana depois eu comecei a quimioterapia.
'Não é um braço quebrado'
Meu caso foi tratado com urgência, porque eu já estava com muita dificuldade de respirar e meu pulmão estava com bastante água - o que eles chamam de derrame pleural. Dali a pouco, meu coração também poderia ser afetado porque o tumor estava perto.
Na minha quimio, eu fico cinco dias internada recebendo a infusão direto. Depois, são 15 dias em casa. É uma quimio bem intensa, porque quanto mais agressivo é o tumor, mais agressivo tem que ser o tratamento.
Quando eu saio da sessão, fico com a pressão baixa, muita dor no corpo, tonta. Agora, acabei de completar minha sexta e, provavelmente, última quimioterapia.
Eu acho que, para todo mundo que fica doente, adiar planos e parar a vida é um choque muito grande. Tem doenças que realmente não te permitem trabalhar, estudar, até comer sozinho. O linfoma que eu tive não me permitiu ter autonomia.
Além disso, o tratamento do linfoma destrói a imunidade, então não posso ver muita gente. Tive que parar de trabalhar, de estudar, dirigir. É muito limitante, mas acho que lidei com isso encarando como uma parte do processo.
Fico pensando muito na vida que ainda tenho para viver, nos anos que tenho pela frente. Isso que me segura nessas horas. Eu só tenho 21 anos e essa foi a primeira vez que me vi em uma situação séria. Não é um braço quebrado.
'Tumor teria dobrado de tamanho'
Estava com intercâmbio marcado, ia fazer um 'Dual Degree Bachelor' na Rennes School of Business, na França. Passaria um ano estudando e sairia com diploma duplo: formada por lá, em Business, e pela minha faculdade daqui, em Publicidade e Propaganda. Iria no final de julho.
Os médicos falaram que meu tumor teria dobrado de tamanho em três semanas. Se eu tivesse descoberto duas semanas depois, talvez não estivesse aqui agora. Ainda bem que a tosse apareceu.
Pensei muito nisso quando vi a imagem do equivalente à metade do meu pulmão tomado. Eu sou uma pessoa que praticava esportes regularmente, adoro a natureza, tenho um estilo de vida saudável. A gente nunca espera.
Eu sempre fui uma pessoa feliz e animada, mas acho que comecei a dar outro valor para a vida. Talvez, se eu tivesse um pouco menos acelerada, não que eu mudaria muita coisa, mas eu teria reparado antes que eu não estava bem.
Vídeos nas redes sociais
Eu faço faculdade de comunicação, e sempre fui fascinada em como as pessoas podem se conectar por meio das conversas. O primeiro vídeo que gravei foi despretensioso, mas eu precisava conversar sobre o assunto.
O câncer é uma doença muito solitária. Por mais que seus amigos e a sua família estejam lá para você, é você que muda e tem seu estilo de vida alterado. É um conjunto de desconfortos que você acaba se sentindo muito sozinho.
Eu estava me sentindo forte para encarar a doença. Por mais que sempre tenha sido difícil, eu nunca questionei se ia dar certo ou não. Decidi gravar para ter essa troca: poderia tanto me ajudar, quando ajudar outras pessoas passando por momentos difíceis.
'Perder cabelo é detalhe'
Na internet, é muito fácil falar de conquistas, mas a gente também tem que conversar sobre coisas que não são tão legais. O psicológico acaba pegando muito, junto com o físico.
Antes, eu olhava o câncer e falava: 'nossa, a perda de cabelo deve ser difícil'. É difícil mesmo, mas acho que é a parte 'menos difícil'. Achei que seria um choque, mas depender tanto das outras pessoas é mais difícil, assim como as transformações no corpo.
O cabelo é só um detalhe. A maioria dos tratamentos exige que você tome muita cortisona, o que faz a gente inchar, perder músculos, a pele fica estranha. Parece que você está passando por uma metamorfose.
Faz quatro meses que eu não faço nada que eu gosto. Uma coisa que foi bem difícil para mim é que, desde pequena, eu canto e toco piano. Amo cantar tocando. Desde o início das tosses, minha voz nunca mais voltou a ser o que era.
Fico muito feliz com o apoio que eu recebi por meio dos vídeos, foi algo que mudou a minha trajetória com o câncer. Trouxe uma força a mais e eu me senti menos sozinha."
O que é o linfoma não-Hodgkin
Câncer que surge nos linfonodos, e tem origem nas células do sistema linfático, espalhando de maneira não ordenada. Os linfonodos são estruturas encontradas no pescoço, nas axilas e nas virilhas, formadas basicamente por glóbulos brancos (células de defesa), que combatem as infecções.
Não se sabe exatamente o que causa um linfoma. Estudos indicam que pessoas com imunidade comprometida por causa de doenças genéticas, expostas a agentes químicos e/ou altas doses de radiação têm mais risco à doença.
Aumento dos gânglios, coceira e fadiga recorrente estão entre os principais sintomas, assim como: febre e calafrio, suores intensos durante a noite e perda de peso e apetite de forma repentina.
Detecção do câncer acontece a partir de exames clínicos, laboratoriais e radiológicos, como: biópsia, punção lombar, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Quanto antes diagnosticado, maiores as chances de tratamento.
Tratamento depende do tipo específico do linfoma. A maioria é tratada com quimioterapia, associação de imunoterapia e quimioterapia, ou radioterapia.
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