O que acontece no seu corpo quando você faz um transplante

Lidar com a realidade de que o estágio de uma doença chegou ao ponto de que a solução é um transplante pode ser difícil. Do outro lado dessa solução terapêutica, há a possível melhora da qualidade de vida, da autonomia e da autoestima, além da reintegração social.

A jornada de cada paciente é única e dependente de condições individuais e dos vários processos que envolvem o transplante. No entanto, pesados riscos e benefícios para quem tem um órgão vital que não funciona, poder prolongar a vida vale a tentativa.

Afinal, já se passaram 70 anos desde a primeira remoção de um rim de uma pessoa para recolocá-lo em outra. Hoje, essa prática é considerada eficaz e segura graças ao avanço de técnicas e instrumentos que reduziram complicações e facilitaram o seu gerenciamento.

O Brasil possui o maior sistema público de transplantes no mundo.

O órgão mais transplantado é o rim, seguido por fígado e coração.

A maior parte dos pacientes tem idades entre 18 a 60 anos.

60% deles são homens.

A sobrevida no primeiro ano é de mais de 90% (fígado, coração e rins). Em 10 anos, 65% (fígado); 50% (coração); 75% (rim e pâncreas).

O que você ganha com isso?

Levará algum tempo até que o corpo se adapte ao "novo normal", e isso pode variar a depender das condições gerais de saúde de cada paciente e do órgão transplantado.

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No entanto, após um longo período de convivência com um problema que levou à falência de um órgão vital, uma das primeiras alterações observadas pelo paciente é a ausência dos sintomas e procedimentos relacionados à doença anterior.

Como o transplante é um procedimento de maior complexidade, no pós-operatório a equipe médica estará atenta a eventuais complicações que podem aparecer em todo tipo de cirurgia, como hemorragia ou infecção.

Cada tipo de transplante tem suas particularidades, mas há outros possíveis efeitos comuns à maioria. Confira algumas dessas manifestações:

  • Mudanças no sistema imunológico
  • Maior suscetibilidade a infecções

Você faz o sistema de defesa contra-atacar

A possibilidade de rejeição do órgão ou de tecidos é um pressuposto dos transplantes. Trata-se de uma reação natural do sistema imunológico que busca defender o organismo de "ataques" de elementos estranhos, um mecanismo semelhante àquele que combate um vírus.

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Para controlar o quadro, existem medicamentos capazes de "esconder" o órgão transplantado desse processo: os imunossupressores.

Junto a outras medicações, variados tipos e dosagens deles são usados em diferentes fases do tratamento e integrarão sua rotina indefinidamente.

O grau de intensidade dessa rejeição é individual.

Órgãos com maior potencial para isso são rins, coração, intestino —quando comparados ao fígado, por exemplo.

O risco de rejeição diminui com o passar do tempo. No entanto, um episódio agudo pode aparecer no primeiro ano, ou tempos depois.

Essa rejeição aguda pode se tornar crônica, isto é, pode levar à perda da função do órgão.

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Infecções aparecem com mais frequência

A substituição de órgãos não é considerada um tratamento-fim. Isso significa que após o transplante serão necessárias consultas periódicas, uma série de intervenções e práticas de manutenção, o que inclui o uso de imunossupressores.

Ao reduzirem o risco de rejeição do órgão, essas medicações também alteram a capacidade do sistema de defesa do corpo protegê-lo de outras infecções, que podem aparecer no corte cirúrgico ou mesmo no órgão transplantado.

Outros exemplos de infecções oportunistas são pneumonia, infecções do trato urinário e virais (HPV; herpes-zóster).

Em geral, tais quadros são mais comuns durante os primeiros 3 a 6 meses após o transplante, quando as doses dos imunossupressores são mais altas para conter o risco de rejeição.

Apesar desses eventuais quadros, os especialistas afirmam que os imunossupressores evoluíram muito desde os primeiros tempos de seu uso (década de 1970). Assim, tais efeitos colaterais têm sido cada vez mais menores.

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Como sei que sou um candidato?

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Imagem: iStock

Atualmente, podem ser transplantados rim, coração, pulmão, intestino (multivisceral), pâncreas, fígado, pulmão, córnea, pele, ossos e medula óssea. E cada um desses órgãos e tecidos terá sua indicação específica.

Veja quais são os quadros clínicos que fazem do paciente candidato aos transplantes mais efetuados no Brasil:

Rins: eles já não funcionam apesar dos tratamentos recebidos (em qualquer faixa etária), geralmente em razão do diabetes ou da hipertensão. Por vezes, a pessoa não está sob terapia renal substitutiva (diálise), mas logo precisará de um transplante (receptor preemptivo).

Fígado: única opção de tratamento para pessoas com falência do fígado crônica ou aguda, geralmente causada por cirrose descompensada (mais de 80% dos casos).

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Coração: presença de insuficiência cardíaca grave crônica ou aguda que não mais responde a outras terapias ou intervenções cirúrgicas.

Os tipos de doador

Os doadores podem ser falecidos ou vivos. Entre os principais transplantes realizados no país, a doação por morte encefálica é a mais frequente.

Morte encefálica é aquela fundada na ausência de todas as funções neurológicas, que é permanente e irreversível, mas o coração continua a bater e os outros órgãos funcionam, permitindo a doação.

Ela só ocorre entre pacientes hospitalizados que estejam respirando com ajuda de equipamentos.

Para ser um doador, basta declarar para a família esse desejo. No entanto, cabe à família autorizar a doação quando chegar o momento.

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De janeiro a junho de 2023, dos 2.847 transplantes de rim realizados no país, 2.465 tiveram doadores falecidos, no mesmo período, houve recorde de doadores efetivos, com 1.900 doadores.

Já transplantes de órgãos como rins, pulmão, fígado e medula óssea admitem doadores vivos. Em geral, essas pessoas são parentes (pais, filhos, etc.), mas também podem ser companheiros, amigos e até mesmo estranhos. Todos devem ser pessoas saudáveis, livres de doenças crônicas e serem juridicamente capazes.

Além da avaliação médica que ateste que a doação não colocará em risco a saúde do doador, o consentimento deverá ser formalizado por via judicial.

Saiba como o match acontece

Uma vez que haja indicação do transplante, cabe ao médico inseri-lo em uma lista de espera —a chamada Lista Única Nacional, que vale tanto para pacientes do SUS quanto para os da rede privada.

Quando se entra na lista única, não dá para estimar o tempo de espera por um órgão. Isso dependerá de variadas condições como compatibilidade, gravidade da doença, além do número de doadores e de pacientes na fila.

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Atualmente 40,3 mil pessoas aguardam por um transplante de órgão no Brasil.

Entenda como é feita a busca pelo paciente quando há disponibilidade de um órgão:

1) Uma vez efetivada a doação de paciente falecido, informa-se à OPO (organização de procura de órgãos). A OPO toma providências junto aos familiares e as equipes de transplante. Nenhum órgão é doado sem consentimento da família.

2) Inicia-se a busca por receptores mais compatíveis na lista de espera. A prática obedece a critérios específicos para cada órgão.

3) A CT (Central de Transplantes) —estrutura que organiza as ações entre e nos estados— emite lista de receptores compatíveis com o doador. No caso de rins, há também seleção por compatibilidade imunológica ou histológica.

4) A OPO da região se dirige ao hospital e examina o doador, revendo seu histórico de saúde e exames laboratoriais. A viabilidade do órgão é avaliada, bem como a sorologia para afastar doenças infecciosas e a compatibilidade com prováveis receptores.

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5) A CT informa a equipe de transplante e o paciente receptor nomeado. Caberá à equipe médica decidir sobre a utilização ou não do órgão. Se ele for negado —e isso é uma possibilidade— a procura segue até encontrar um receptor.

Fontes: Carlos Augusto Fernandes Molina, professor associado da Divisão de Urologia do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo) e coordenador da Unidade de Transplante Renal do Hospital das Clínicas da mesma instituição; Fábio Antonio Perecim Volpe, cirurgião geral e cirurgião pediátrico, coordenador cirúrgico do Grupo Integrado de Transplante de Fígado e Pâncreas do HC-FMRP-USP; Luciana Haddad, médica do Serviço de Transplante de Órgãos do Aparelho Digestivo do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), e vice-presidente da ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos). Revisão médica: Fábio Antonio Perecim Volpe.

Referências:

  • Ministério da Saúde
  • ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos)
  • UNOS (United Network for Organ Sharing)
  • Abramyan S, Hanlon M. Kidney Transplantation. [Atualizado em 2023 Jan 2]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan-. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK567755/
  • Dababneh Y, Mousa OY. Liver Transplantation. [Atualizado em 2023 Apr 7]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan- Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK559161/
  • Ahmed T, Jain A. Heart Transplantation. [Atualizado em 2023 May 22]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan - Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK557571/.

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